Art. 12 - Modelo de ação revisional de taxa de juros de cartão de crédito rotativo de Banco /Financeira com base na taxa média do mercado.
Excelentíssimo Senhor Doutor
Juízo de Direito da ____ Vara Cível da Comarca (nome da cidade da Comarca)
Urgente.
Autor e qualificação completa, por intermédio
de seu procurador nome do advogado e qualificação completa, vem ajuizar a
presente
AÇÃO
DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DA TAXA DE ABERTURA DE CRÉDITO (TAC) E OUTRAS
TAXAS/TARIFAS CONTRATUAIS CUMULADA COM PEDIDO REVISIONAL DE JUROS DA DÍVIDA DE
FINANCIAMENTO CUMULADA COM PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO CUMULADA COM PEDIDO
DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO OU DEPÓSITO JUDICIAL CUMULADA COM PEDIDO DE
MANUTENÇÃO DE POSSE DO VEÍCULO, EM FORMA DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA,
EM CARÁTER LIMINAR
Em face do ré
(banco ou financeira).,
pessoa jurídica de direito privado, com CNPJ (), com sede em domicílio na (),
com base nos seguintes fundamentos fáticos e jurídicos a serem expostos a
seguir:
1) Dos Fatos:
O autor entrou em débito com o cartão de
crédito da ré (Banco).
Conforme documentação em anexo as faturas de
cartão de crédito chegam ao absurdo de um custo efetivo total de 613,34% ao ano
esses juros é do cartão de crédito rotativo.
Conforme o site do Banco central do Brasil, há
dois modelos de financiamento através do cartão de crédito: através de cartão
de crédito rotativo e o cartão de crédito financiado. Segue em anexo o site do
Banco Central do Brasil.https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores
O
intuito do autor é que Vossa Excelência aplique a esse caso concreto o valor de
percentual de juros de forma parcelada dos débitos oriundos do cartão de crédito
e não se aplique a forma de crédito no rotativo, ou subsidiariamente se aplique
a média do mercado em ambos os casos: No caso de juros parcelados de que
161,92% ao ano e subsidiariamente de 497,6% no caso de juros rotativos do
cartão de crédito.
2) Do Direito:
Do
Mérito:
2.2.) Do Pedido Revisional de Juros do Cartão de Crédito.
Conforme documentação em anexo as faturas de
cartão de crédito chegam ao absurdo de um custo efetivo total de 613,34% ao ano
esse juros é do cartão de crédito rotativo.
Conforme o site do Banco central do Brasil, há
dois modelos de financiamento através do cartão de crédito: através de cartão
de crédito rotativo e o cartão de crédito financiado. Segue em anexo o site do
Banco Central do Brasil.https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores
O
intuito do autor é que Vossa Excelência aplique a esse caso concreto o valor de
percentual de juros de forma parcelada dos débitos oriundos do cartão de
crédito e não se aplique a forma de crédito no rotativo, ou subsidiariamente se
aplique a média do mercado em ambos os casos: No caso de juros parcelados de
que 161,92% ao ano e subsidiariamente de 497,6% no caso de juros rotativos do
cartão de crédito.
A abusividade do contrato de financiamento é
que a taxa de juros mensal de anual é 637,31, ao ano, é muito alta se comparada
com a taxa de juros da média do mercado que segundo o site do Banco Central do
Brasil https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores
estão na média de
No caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e subsidiariamente de 497,6%
no caso de juros rotativos do cartão de crédito.
Segue abaixo duas jurisprudências que respaldam
o direito do autor como consumidor do STJ.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS
(2008/0119992-4)
RELATORA |
: MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE |
:
UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A |
ADVOGADOS |
:
MARIANE CARDOSO MACAREVICH E OUTRO(S) LUCIANO CORRÊA GOMES |
RECORRIDO
|
:
ROSEMARI DOS SANTOS SANCHES |
ADVOGADO |
: MAURO
TRÁPAGA TEIXEIRA |
EMENTA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE
DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS.
CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS.
INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE
INADIMPLENTES.
DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO.
DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO
Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica
questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente
aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos
termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial,
bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito;
contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito
consignado.
Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito
idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de
processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido
e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de
admissibilidade. Neste julgamento, os
requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes
questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros
moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v)
disposições de ofício.
PRELIMINAR
O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento
definitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de
constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17/00, reeditada sob o n.º 2.170-36/01.
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS
QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula
596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios
superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c)
São
inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as
disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d)
É
admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais,
desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de
colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique
cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA
a)
O
reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade
contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora;
b)
Não
descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo
quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao
período de inadimplência contratual.
ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS
Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros
moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO
EM CADASTRO DE
INADIMPLENTES
a)
A
abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em
antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em
questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a
cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência
consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for
prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz;
b)
A
inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida
na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção.
ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO
É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar,
com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de
cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a esta matéria a Min.
Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão.
II-
JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp
1.061.530/RS)
A menção a artigo de lei, sem a
demonstração das razões de inconformidade, impõe o não-conhecimento do recurso
especial, em razão da sua deficiente fundamentação. Incidência da Súmula
284/STF.
O recurso especial não constitui via adequada para o exame de temas
constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF.
Devem ser decotadas as disposições de ofício realizadas pelo acórdão
recorrido.
Os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite que esta
Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do Consumidor, não
merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a onerosidade excessiva na
hipótese. Verificada a cobrança de
encargo abusivo no período da normalidade contratual, resta descaracterizada a
mora do devedor.
Afastada a mora: i) é ilegal o envio de dados do consumidor para
quaisquer cadastros de inadimplência; ii) deve o consumidor permanecer na posse
do bem alienado fiduciariamente e iii) não se admite o protesto do título
representativo da dívida.
Não há qualquer vedação legal à efetivação de depósitos parciais,
segundo o que a parte entende devido.
Não se conhece do recurso quanto à comissão de permanência, pois
deficiente o fundamento no tocante à alínea "a" do permissivo
constitucional e também pelo fato de o dissídio jurisprudencial não ter sido
comprovado, mediante a realização do cotejo entre os julgados tidos como
divergentes. Vencidos quanto ao conhecimento do recurso a Min. Relatora e o
Min. Carlos Fernando Mathias.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para
declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como pactuados, e
ainda decotar do julgamento as disposições de ofício.
Ônus sucumbenciais redistribuídos.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da SEGUNDA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por
unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe
provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora, acompanhada pelos
Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão,
Carlos Fernando Mathias, Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior; salvo em
relação às disposições de ofício, vencidos a Ministra Relatora e o Ministro
Luis Felipe Salomão, e quanto à comissão de permanência, vencidos no
conhecimento a Ministra Relatora e o
Ministro Carlos Fernando Mathias. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Massami
Uyeda.
Brasília (DF), 22 de outubro de
2008.(data do julgamento).
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
QUESTÃO DE ORDEM
VOTO
EXMO.
SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR:
Entendo que
a sustentação oral deve se
restringir à dos ilustres advogados das partes.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
QUESTÃO DE ORDEM
VOTO
O
SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:
Sr. Presidente, se há
manifestação
escrita e por se tratar de um processo em que se vai apenas consolidar teses
que já estão, ao longo do tempo, sendo acatadas por todos os Membros da Seção,
não vejo razão para que haja sustentação oral, além das duas partes envolvidas.
Com a vênia devida da Sra. Ministra
Relatora, indefiro, no sentido
de admitir somente a sustentação
oral das partes.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS
(2008/0119992-4)
RECORRENTE : UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A
ADVOGADOS : MARIANE CARDOSO MACAREVICH E OUTRO(S)
LUCIANO CORRÊA GOMES
RECORRIDO : ROSEMARI DOS SANTOS
SANCHES ADVOGADO : MAURO TRÁPAGA TEIXEIRA
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RELATÓRIO
Trata-se de recurso especial
interposto por Unibanco – União Brasileira de Bancos S.A., com fundamento nas alíneas
“a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ/RS.
Ação:
Rosemari dos Santos Sanches ajuizou
ação de revisão
contratual em
face do Unibanco – União Brasileira de Bancos S.A., alegando, em síntese, que
adquiriu uma motocicleta mediante financiamento concedido pela instituição
financeira recorrente. Obteve o empréstimo de R$ 4.980,00 (quatro mil,
novecentos e oitenta reais) para pagamento em 36 parcelas de R$ 249,48
(duzentos e quarenta e nove reais e quarenta e oito centavos).
Com base em precedente desta Corte
(REsp 213.825/RS, Quarta Turma, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha), a recorrida
sustentou na inicial que “todas as vezes que
a contratação
dos juros
remuneratórios se apresente
excessivamente onerosa, em percentual caracterizadamente abusivo,
por extrapolar os padrões da conjuntura econômica pátria (...), pode ser
aplicada a norma protetora do consumidor, com o fito de coibirem-se
intoleráveis abusos por parte das instituições financeiras” .
Além de insurgir-se contra os juros
remuneratórios, que considerou
excessivamente onerosos, pleiteou o
afastamento da capitalização de juros, da cobrança da comissão de permanência e
da inclusão de seu nome em cadastro de inadimplentes. Aventou a possibilidade
de realizar o depósito da quantia que entende devida, qual seja R$ 2.509,15
(dois mil quinhentos e nove reais e quinze centavos), em 23 prestações de R$
122,66 (cento e vinte e dois reais e sessenta e seis centavos).
Ao final, requereu que fosse: (i)
mantida na posse da motocicleta; (ii) impedida a inscrição de seu nome em
cadastro de inadimplentes, como Serasa, SPC, Cartório de Protestos e Central de
Risco do Banco Central; (iii) autorizada a realizar o depósito da quantia
incontroversa; (iv) apresentada pelo banco cópia do contrato celebrado entre as
partes; (v) declarada a nulidade das cláusulas que contrariam a lei; (vi)
estipulada a aplicação de juros remuneratórios de 12% ao ano e (vii) excluída a
capitalização mensal.
Sentença: Considerou que a taxa mensal de
juros remuneratórios de 2,5654% ao mês era abusiva, razão pela qual a reduziu
para 1% ao mês, afastando, ainda, “a
cobrança da comissão de permanência, que deverá ser substituída pelo IGPM, e
determinando a capitalização anual dos juros” (fls. 63).
Acórdão: O Tribunal de origem negou
provimento à apelação
interposta pela instituição
financeira, afastando, de ofício, a cobrança de certos encargos, tal como
resumido na seguinte ementa:
“AÇÃO
REVISIONAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS
BANCÁRIOS.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. APLICAÇÃO DO CDC. JUROS REMUNERATÓRIOS.
CAPITALIZAÇÃO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.
ENCARGOS
MORATÓRIOS. COMPENSAÇÃO E / OU REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CLÁUSULA DE EMISSÃO DE
TÍTULO DE CRÉDITO. TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO. EMISSÃO DE BOLETO BANCÁRIO.
CADASTRO DE RESTRIÇÃO
AO
CRÉDITO. PROTESTO DE TÍTULO. MANUTENÇÃO NA POSSE DO BEM. AUTORIZAÇÃO PARA
DEPÓSITO.
HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
1.
APLICAÇÃO DO CDC. O Código de Defesa
do
Consumidor
implementou uma nova ordem jurídica, viabilizando a revisão contratual e a
declaração de nulidade absoluta das cláusulas abusivas, o que pode ser feito
inclusive de ofício pelo Poder Judiciário.
2.
JUROS REMUNERATÓRIOS. É nula a taxa
de juros remuneratórios em percentual superior a 12% ao ano porque acarreta
excessiva onerosidade ao devedor em desproporção à vantagem obtida pela
instituição credora, por aplicação do art. 51, IV, do CDC.
3.
CAPITALIZAÇÃO. A capitalização dos juros é vedada em contratos
da espécie, por ausência de permissão legal, ainda que expressamente
convencionado.
4.
ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. CABIMENTO. Adoção do IGP-M para
atualização do valor da moeda. Disposição de ofício.
5.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. É vedada a comissão de permanência por
cumulada com juros remuneratórios e correção monetária.
6.
ENCARGOS MORATÓRIOS 6.1. Juros
moratórios. Contemplados no contrato em 1% ao mês e mantidos, vedada a
cumulação com juros remuneratórios e
multa.
6.2. Multa Contratual. Contemplada no contrato à taxa de 2% e mantida.
Deve incidir sobre a parcela efetivamente em atraso e não sobre a totalidade do
débito.
6.3. Mora do Devedor. Por ter sido
elidida a mora debendi, não há exigir os encargos moratórios. Esses são
exigíveis tão-só quando constituído em mora o devedor.
Disposição de ofício.
7.
COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
Após a compensação, e na eventualidade de sobejar saldo em seu favor do
devedor, é admitida a repetição simples, afastada a previsão contida no
parágrafo único do art. 42 do CDC.
Disposição de ofício.
8.
CLÁUSULA DE EMISSÃO DE TÍTULO
DE CRÉDITO. A cláusula que prevê
emissão de título de crédito configura nulidade pela abusividade que ostenta ou
pela excessiva outorga de poderes conferida ao credor ou pelo excesso de
garantia. Disposição de ofício.
9.
TARIFA DE EMISSÃO DE BOLETO
BANCÁRIO. A
emissão
de qualquer carnê ou boleto para pagamento é obrigação do credor não devendo
ensejar ônus algum ao devedor, já que os arts. 319 do Código Civil/2002 e art.
939 do Código Civil/1916, não trazem no seu bojo a condição de pagamento em
dinheiro para ele receber o que lhe é de direito. Disposição de ofício.
10.
TAXA DE ABERTURA DE CRÉDITO. Além de
atender
interesse exclusivo do mutuante, essa cláusula contratual contraria o disposto
no art. 46, parte final, do Código de Defesa do Consumidor, pois não fornece ao
mutuário todas as informações sobre sua finalidade e alcance. Disposição de
ofício.
11.CADASTRO DE CRÉDITO. INSCRIÇÃO
NEGATIVA.
Discussão da dívida que revela probabilidade, ainda que mínima, de sucesso do
devedor. Inveracidade de dados e constrangimento desnecessário vedados no CDC.
12.PROTESTO
DO TÍTULO. Na medida em que o
devedor
possui argumentos que fragilizam o negócio subjacente, podendo ser excluídos
juros e taxas consideradas abusivas, o protesto revela-se ato temerário e que
somente virá em prejuízo do devedor, sem qualquer repercussão jurídica de monta
para o credor.
13. MANUTENÇÃO
DE POSSE. É de ser mantido o
devedor
na posse do bem alienado fiduciariamente enquanto pendente pleito revisional.
14. AUTORIZAÇÃO
DE DEPÓSITOS. É possível a autorização para depósito de valores que o autor
entende devidos, enquanto pende de julgamento ação revisional de cláusulas
contratuais. 1
15.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Redimensionados.
Disposição
de ofício.
APELO
DESPROVIDO, COM DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO”.
Recurso Especial: Sustentou haver violação aos arts.
5º da MP 2.170/36; 4º do Decreto 22.626/33; 6º, V, e 52, §1o, do
CDC; 3o, 4º, VI e IX, da Lei 4.595/64; 2º, 20, 128, 333, I, 460,
515, 890 e 925 do CPC; 188, 397, 406, 422, 478, 876 e 877 do CC/02; 4º, §2o,
da Lei 9.507/97; 14 da Lei 9.492/97; 161 do CTN e ainda Resolução 1.129 do CMN.
Apontou, também, a existência de dissídio pretoriano. Afirma, ainda, haver
violação aos arts. 5º, XXXV, e 192, CF.
Recurso
Extraordinário:
Interposto pela recorrente com base em
suposta violação do art. 62 da
CF/88.
Juízo
Prévio de Admissibilidade:
Transcorrido o prazo legal sem
que fossem apresentadas
contra-razões, foi o recurso especial admitido na origem e considerado inepto o
recurso extraordinário, ante a falta de demonstração da repercussão geral.
Aplicação
do art. 543-C do CPC: O
Min. Ari Pargendler,
considerando a
multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito,
afetou o julgamento do recurso especial à Segunda Seção desta Corte, conforme o
rito do art. 543-C do CPC.
Assim, foram suspensos os recursos
relacionados a direito bancário e
que digam
respeito a: a) juros remuneratórios; b) capitalização de juros; c) mora; d)
comissão de permanência; e) inscrição do nome do devedor em cadastros de
proteção ao crédito; f) disposições de ofício no âmbito do julgamento da
apelação acerca de questões não devolvidas ao Tribunal.
Em
cumprimento ao despacho de fls. 226, no qual o Min. Ari Pargendler determinou a
redistribuição deste processo, por prevenção, a um dos Ministros que compõem a
Terceira Turma do STJ, recaiu sobre mim a incumbência de relatar o presente
recurso.
Responderam aos
ofícios expedidos com base no art. 3º, I, da Resolução 08/08 do STJ, as
seguintes entidades: (i) a Ordem dos Advogados do Brasil (fls. 286); (ii) o
Banco Central do Brasil (fls. 288); (iii) a Febraban – Federação Brasileira de
Bancos e (iv) o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC, que trouxe
pareceres de Cláudia Lima Marques e Cristiano Heineck Schmitt.
Manifestaram-se espontaneamente: (i)
a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro; (ii) a Fundação de Proteção e
Defesa do Consumidor – Procon/SP; (ii) o Fórum Nacional das Entidades Civis de
Defesa do Consumidor – FNECDC; (iii) a Associação Brasileira das Entidades de
Crédito Imobiliário e Poupança – ABECIP; (iv) a Serasa S/A, trazendo parecer de
Luiz Rodrigues Wambier e José Miguel Garcia Medina; (v) a Defensoria Pública da
União, cujas manifestações foram juntadas, por linha, ao processo e (vi) os
professores Romualdo Wilson Cançado e Orlei Claro de Lima.
Parecer do Ministério Público
Federal: Por fim, o
Ministério Público Federal opinou às fls. 957/1.024, em parecer da lavra do i.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Aurélio Rios, sustentando questão de
ordem para que se delimitasse a matéria a ser julgada. No mérito, propugnou
pela parcial procedência do especial, tão-somente em relação à taxa de
indexação dos juros remuneratórios, ressalvada a aplicação das taxas médias de
mercado.
É o relatório.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
RELATORA |
: MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE |
:
UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A |
ADVOGADOS |
:
MARIANE CARDOSO MACAREVICH E OUTRO(S) |
|
LUCIANO CORRÊA GOMES |
RECORRIDO
|
:
ROSEMARI DOS SANTOS SANCHES |
ADVOGADO |
: MAURO
TRÁPAGA TEIXEIRA |
RELATORA:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
VOTO
DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO
A natureza do
procedimento do art. 543-C do CPC visa unificar o
entendimento e orientar a solução de
recursos repetitivos.
No despacho que
instaurou o incidente do processo repetitivo, o
relator
originário, Min. Ari Pargendler, determinou que fossem suspensos os
processamentos dos recursos especiais que versassem sobre “as seguintes matérias, quando ativadas
em ações que digam respeito a contratos bancários:
a) juros
remuneratórios; b) capitalização de juros; c) mora; d) comissão de permanência;
e) inscrição do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito; f)
disposições de ofício no âmbito do julgamento da apelação acerca de questões
não devolvidas ao tribunal”
(fls. 224).
Apesar da aparente abrangência do
termo “contratos bancários” do
despacho
supratranscrito, constata-se que a característica da multiplicidade de recursos
especiais, exigida pelo art. 543-C do CPC, evidencia-se nos contratos bancários
que se submetem à legislação consumerista. Portanto, este julgamento abordará,
em quaisquer de suas modalidades, apenas os contratos de mútuo bancário em que
a relação de consumo esteja caracterizada, nos termos do alcance da ADI
2.591-1, relator para acórdão o Min. Eros Grau.
Conforme estabelecido na referida
ADI, aos bancos aplica-se o CDC,
norma “de ordem pública e interesse social” (art. 1º do CDC). Eis a
ementa do julgado em comento:
“ART.
3º, §2º, DO CDC. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5º, XXXII, DA CB/88. ART.
170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA
DO CONSUMIDOR. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE.
1.
As instituições financeiras estão,
todas elas,
alcançadas
pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor.
2.
“Consumidor”, para os efeitos do
Código de Defesa
do
Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário
final, atividade bancária, financeira e de crédito”.
Ressalte-se, ainda, que esta 2ª
Seção, sem discrepar deste entendimento, tem reiteradamente aplicado este
diploma às relações bancárias, conforme a Súmula 297/STJ, inclusive à taxa de
juros (conf. REsp 327.727/SP, 2ª Seção, Rel. Min. César Asfor Rocha DJ
08.03.2004; REsp 402.261/RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ
06.12.2004; REsp 291.575/RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ
06.12.2004; REsp 420.111/RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ
06.10.2003; REsp 407.097/RS, 2ª Seção, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ
29.09.2003).
Registre-se que
não se encontram abrangidas por esta decisão as Cédulas de Crédito Rural,
Industrial, Bancária e Comercial; os contratos celebrados por cooperativas de
crédito, os que se incluem sob a égide do Sistema Financeiro da Habitação, bem
como os que digam respeito a crédito consignado.
Por fim, em decisão colegiada, os
Ministros da 2ª Seção consideraram que os efeitos externos trazidos pelo art.
543-C, § 7º, do CPC somente atingiriam os temas que, cumulativamente: i)
estivessem previstos no despacho que instaurou o presente incidente de processo
repetitivo; ii) tivessem sido discutidos nas razões do recurso especial e iii)
conseguissem preencher todos os requisitos de admissibilidade e fossem alvo de
expressa manifestação desta 2ª Seção quanto ao mérito recursal.
As demais questões trazidas no
especial serão igualmente apreciadas
no exame do recurso representativo,
mas as razões de decidir aqui declinadas quanto a tais pontos não terão a
aptidão de produzir os referidos efeitos externos do art. 543-C, § 7º, do CPC.
PRELIMINAR
-
Do pedido de suspensão do julgamento formulado pelo MPF.
Em seu parecer, o i.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Aurélio Virgílio Veiga Rios, afirma que “o Superior Tribunal de Justiça não deve,
enquanto não julgada definitivamente a ADIn nº 2316/DF, manifestar-se sobre o
tema capitalização mensal de juros” (fls. 989).
Entretanto, até que seja encerrado o
julgamento do referido
processo, deve
prevalecer a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP nº 1.963-17/00,
reeditada sob o nº 2.170-36/01, que admite a capitalização mensal de juros nas
operações realizadas por instituições financeiras.
O princípio da imperatividade
assegura a auto-executoriedade das
normas jurídicas,
dispensando prévia declaração de constitucionalidade pelo Poder Judiciário. Ainda
que esta presunção seja iuris tantum,
a norma só é extirpada do ordenamento com o reconhecimento de sua
inconstitucionalidade. E essa questão, na hipótese específica do art. 5º da MP
nº 1.963-17/00, ainda não foi resolvida pelo STF, nem mesmo em sede liminar.
Logo, entende-se que não deve ser
acolhido este pedido de
suspensão do julgamento.
JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS
QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE - ART. 543-C, § 7º, DO CPC
I - PERÍODO DA ADIMPLÊNCIA
1. JUROS
REMUNERATÓRIOS
Juros remuneratórios são aqueles que
representam o preço da disponibilidade monetária, pago pelo mutuário ao
mutuante, em decorrência do negócio jurídico celebrado entre eles.
1.1.
Juros Remuneratórios Pactuados
O entendimento
hoje vigente nesta 2ª Seção indica que a regra, no Sistema Financeiro Nacional,
é a
liberdade na pactuação dos juros
remuneratórios. Isso implica, mais
especificamente, reconhecer que:
(i)
As instituições financeiras não se
sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada na Lei de
Usura (Decreto 22.626/33), como já dispõe a Súmula 596/STF.
Inaplicabilidade da Lei de
Usura. |
|
|
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
AgRg no
Resp 1.041.086/RS, j. em 19.08.2008 |
4ª
Turma |
Aldir
Passarinho Junior |
REsp
680.237/RS, j. em 14.12.2005 |
2ª
Seção |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
Ag 921.983/RJ, j. em 01.04.2008 |
3ª
Turma |
João
Otávio de Noronha |
AgRg no
Ag 888.492/SP, j. em 18.12.2007 |
4ª
Turma |
Massami
Uyeda |
REsp
1.036.474/RS, j. em 27.05.2008 |
3ª
Turma |
Sidnei
Beneti |
Ag
1.026.104/MG, DJe de 01.08.2008 |
Unipessoal |
Luis
Felipe Salomão |
REsp
1.007.071/RS , DJe de 27.08.2008 |
Unipessoal |
Carlos
Mathias |
REsp
1.038.020/RS, Dje de 26.09.2008 |
Unipessoal |
Ari
Pargendler |
REsp
402.261/RS, j. em 26.03.2003 |
2ª
Seção |
(ii)
A simples estipulação de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano não indica abusividade.
Não abusividade pela simples
estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano. |
|||
Ministro Relator |
Julgado |
|
Órgão |
Fernando Gonçalves |
AgRg no REsp 913.609/RS, j. em
20.11.2007 |
|
4ª Turma |
Aldir Passarinho Junior |
AgRg no REsp 688.627/RS, j. em
17.03.2005 |
|
4ª Turma |
Nancy Andrighi |
REsp 715.894/PR, j. em
26.04.2006 |
|
2ª Seção |
João Otávio de Noronha |
REsp 1.038.242/RS, DJe de
12.09.2008 |
|
Unipessoal |
Massami Uyeda |
REsp 1.042.903/RS, j. em
03.06.2008 |
|
3ª Turma |
Sidnei Beneti |
AgRg no REsp 879.902/RS, j. em
19.06.2008 |
|
3ª Turma |
Luis Felipe Salomão |
REsp 1.007.071/RS, DJe de
27.08.2008 |
|
Unipessoal |
Carlos Mathias |
REsp 1.038.020/RS, Dje de
26.09.2008 |
|
Unipessoal |
Ari Pargendler |
AgRg nos EDcl no REsp
681.411/RS, 27.09.2005 |
j. em |
3ª Turma |
(iii)
São inaplicáveis aos juros
remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o
art. 406 do CC/02
(Único voto encontrado: REsp 680.237/RS, 2ª Seção, Rel. Min. Aldir Passarinho
Junior, DJ de 15.03.2006).
(iv)
É inviável a utilização da Selic -
taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - como parâmetro de limitação
de juros remuneratórios.
Vedação da utilização da Taxa
Selic para limitação dos juros remuneratórios. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando Gonçalves |
REsp 1.056.274/RS, DJe de
12.09.2008 |
Unipessoal |
Aldir Passarinho Junior |
REsp 915.572/RS, j. em
07.02.2008 |
4ª Turma |
Nancy Andrighi |
AgRg nos EDcl no REsp
808.324/RS, j. em 09.05.2006 |
3ª Turma |
João Otávio de Noronha |
REsp 1.044.457/RS, DJe de
02.09.2008 |
Unipessoal |
Massami Uyeda |
AgRg no REsp 1.023.399/RS, j.
em 13.05.2008 |
3ª Turma |
Sidnei Beneti |
REsp 1.055.002/RS, DJe de
01.08.2008 |
Unipessoal |
Luis Felipe Salomão |
REsp 986.943/RS, DJe de
05.08.2008 |
Unipessoal |
Carlos Mathias |
REsp 919.838/RS, DJe de
26.09.2008 |
Unipessoal |
Ari Pargendler |
REsp 901.518/RS, DJe de
13.08.2008 |
Unipessoal |
1.2. A Revisão dos Juros
Remuneratórios Pactuados
Fixada a premissa de que, salvo
situações excepcionais, os juros
remuneratórios
podem ser livremente pactuados em contratos de empréstimo no âmbito do Sistema
Financeiro Nacional, questiona-se a possibilidade de o Poder Judiciário exercer
o controle da liberdade de convenção de taxa de juros naquelas situações que
são evidentemente abusivas.
A dificuldade do tema, que envolve o
controle do preço do dinheiro é
enorme. Isso não é, entretanto,
suficiente para revogar o art. 39, V, CDC, que veda ao fornecedor, dentre
outras práticas abusivas, “exigir do
consumidor vantagem manifestamente excessiva” , e o art. 51, IV, do mesmo
diploma, que torna nulas as cláusulas que “estabeleçam
obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade” .
As premissas
básicas de solução foram lançadas no julgamento do REsp 407.097/RS, DJ de
29.09.2003, quando a 2ª Seção estava diante da cobrança de taxa de juros de
10,90% ao mês em contrato de abertura de crédito em conta corrente. Naquela
oportunidade, a maioria dos Ministros manifestou o entendimento de que os juros
não deveriam ser limitados, salvo em hipóteses
excepcionais.
A
excepcionalidade pressupunha: (i) aplicação do CDC ao contrato e (ii) taxa que
comprovadamente discrepasse, de modo substancial, da média do mercado na praça
do empréstimo, salvo se justificada pelo risco da operação (no mesmo sentido,
vide REsp 420.111/RS, Segunda Seção, Rel. Min. Pádua Ribeiro, Rel. p. Acórdão Min.
Ari Pargendler, DJ de 06.10.2003).
Acompanhando tais precedentes, os
Ministros que atualmente
compõem esta 2ª
Seção têm admitido a possibilidade de controle dos juros manifestamente
abusivos naqueles contratos que se inserem em uma relação de consumo.
O Min. Aldir Passarinho Junior vem considerando “que a pactuação [dos juros] é livre entre
as partes, somente se podendo falar em taxa abusiva se constatado oportunamente por prova robusta que
outras instituições financeiras, nas mesmas condições,
praticariam percentuais muito inferiores” (REsp 915.572/RS, Quarta Turma,
DJe 10.03.2008).
Por isso, o Ministro Aldir defende
que essa abusividade seja demonstrada em “perícia
que propicie a comparação com as taxas praticadas por outras instituições
financeiras, desde que coincidentes o produto, a praça e a época da firmatura
do pacto” (AgRg no REsp 935.231/RJ, Quarta Turma, DJ de 29.10.2007).
No mesmo sentido, o Min. João Otávio
de Noronha tem asseverado
que “a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal de
sua abusividade em relação à taxa média do mercado” (AgRg no REsp
939.242/RS, Quarta Turma, DJe de 14.04.2008).
O Min. Luis Felipe
Salomão, por sua vez, afirma que “a
abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente
demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de
lucros excessivos, sendo insuficiente o só fato de a estipulação ultrapassar
12% ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período, o que não ocorreu
no caso dos autos” (AgRg no REsp 881.383, DJ de 27.08.2008).
O Min. Fernando Gonçalves sustenta
que “a alteração da taxa de
juros
pactuada depende da demonstração cabal da sua abusividade em relação à taxa
média de mercado”
(AgRg no REsp 1.041.086/RS, Quarta Turma, DJe
de 01.09.2008).
O Min. Massami Uyeda entende ser “firme o entendimento desta augusta Corte no
sentido de que, não obstante a inequívoca incidência da lei consumerista nos
contratos bancários, a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve
ser cabalmente demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio
contratual ou de lucros excessivos (...)” e, com base nesse argumento e na
Súmula 7/STJ, já manteve acórdão que reduziu uma taxa de juros de 45,65% ao
ano, em contrato de alienação fiduciária, para o patamar da taxa média de 37,42% ao ano (REsp 1.036.857/RS, Terceira
Turma, DJe de 05.08.2008).
O Min. Sidnei Beneti reconheceu que “para o período da
inadimplência,
permite-se o controle judicial dos juros remuneratórios, com base nas regras do
Código de Defesa do Consumidor, quando ficar comprovado que o percentual
cobrado destoa da taxa média do mercado para a mesma operação financeira” .
Assim, conclui o Min. Beneti que,
como “o Acórdão recorrido
apurou
que a taxa de juros remuneratórios cobrada pela instituição financeira
recorrida encontra-se acima do dobro da taxa média do mercado para a
modalidade
do negócio jurídico efetivado ”,
na inadimplência, os juros deveriam variar
“segundo a taxa média do mercado, para a operação de mútuo, apurada pelo Banco
Central do Brasil, na forma da Circular da Diretoria n° 2.957, de 28 de
dezembro de 1999 (...)” (REsp 977.789/RS, Terceira Turma, DJe de
20.06.2008). Ressalte-se, para fins ilustrativos, que nessa hipótese havia dois
contratos de mútuo, um com taxa de 9,9% ao mês e outro de 8,8% ao mês.
Aponta-se, ainda, precedente de
minha lavra, com o qual
manifestaram
concordância os Min. Ari Pargendler, Massami Uyeda e Sidnei Beneti, no qual,
diante de empréstimo pessoal a juros de 249,85% ao ano, superiores ao dobro da
taxa média apurada pelo Banco Central, ficou estabelecido que “cabalmente demonstrada pelas instâncias
ordinárias a abusividade da taxa de juros remuneratórios cobrada, deve ser
feita sua redução ao patamar médio praticado pelo mercado para a respectiva
modalidade contratual” (Resp 1.036.818, Terceira Turma, DJe de 20.06.2008).
Por sua
importância, ainda vale mencionar a posição de alguns Ministros que não mais
integram esta 2ª Seção:
O Ministro César Asfor Rocha, diante
de juros remuneratórios
pactuados à taxa de 34,87% ao mês
contra uma taxa média, apurada por perícia, de 14,19% ao mês, entendeu que,
estando “cabalmente comprovada por
perícia, nas instâncias ordinárias, que a estipulação da taxa de juros
remuneratórios foi aproximadamente 150% maior que a taxa média praticada no
mercado, nula é a cláusula do contrato” (REsp 327.727/SP, Segunda Seção, DJ
de 08.03.2004).
O Min. Pádua Ribeiro, por seu turno,
constatando cobrança de taxa
superior ao
triplo da média (380,78% ao ano contra 67,81% ao ano), reduziu-a para o “patamar médio praticado pelo mercado para a
respectiva modalidade contratual” (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, DJ de
24.09.2007).
O Ministro Ari Pargendler consignou
que “evidentemente, pode-se,
em
casos concretos reconhecer a existência de juros abusivos. Por exemplo, no
Agravo de Instrumento nº 388.622, MG, tive ocasião de decidir que, 'se o
acórdão, confortado por laudo pericial, dá conta de que os juros praticados na
espécie excediam em quase 50% à taxa média de mercado, não há como fugir da
conclusão de que são, mesmo, abusivos' (DJ, 10.08.2001). O tema, com certeza, é
complexo, porque o risco de cada operação influi na respectiva taxa de juros.
Mas o peso desse componente, e de outros, no custo do empréstimo deve, então,
caso a caso, ser justificado pela instituição financeira, o juiz saberá decidir
as controvérsias a propósito, se respeitar a racionalidade econômica, representada
pelo mercado" (voto
proferido no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de
04.08.2003; no mesmo sentido, vide REsp 420.111/RS, Segunda Seção, Rel. Min.
Pádua Ribeiro, Rel. p. Acórdão Min. Ari Pargendler, DJ de 06.10.2003; REsp
1.061.512, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 07.08.2008).
Logo,
diante desse panorama sobre o posicionamento atual da 2ª Seção, conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em
situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz
de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) esteja
cabalmente demonstrada.
Necessário tecer, ainda, algumas
considerações sobre parâmetros que
podem ser
utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência
ou não de flagrante abusividade.
Inicialmente, destaque-se que, para
este exame, a meta estipulada
pelo Conselho
Monetário Nacional para a Selic – taxa do Sistema Especial de Liquidação e
Custódia – é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores
custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema
Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o
'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do
empréstimo. Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes
tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros.
Descartados índices ou
taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam
buscados no próprio mercado financeiro.
Assim, a análise
da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro
de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito
concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas
operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de
30.12.1999).
As informações divulgadas por aquela
autarquia, acessíveis a
qualquer pessoa
através da rede mundial de computadores (conforme
http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou
http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de
acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices
de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a
modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto
de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento
imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal,
entre outros).
A taxa média apresenta vantagens
porque é calculada segundo as
informações
prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as
forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições
financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que
o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as
modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro
de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a
taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre
abusividade.
Como média, não se pode exigir que
todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa
média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se
admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.
A jurisprudência,
conforme registrado anteriormente,
tem
considerado
abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari
Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de
04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de
20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ
de 24.09.2007) da média.
Todavia, esta perquirição acerca da
abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos
e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui
um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades
do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos.
1.3.
Taxa aplicável quando reconhecida a abusividade na
contratação
dos juros remuneratórios.
A questão final atinente a este
tópico procura responder ao seguinte problema: constatada a abusividade, qual
taxa deve ser considerada adequada pelo Poder Judiciário?
Muitos precedentes indicam que,
demonstrado o excesso, deve-se aplicar a taxa média para as operações
equivalentes, segundo apurado pelo Banco Central do Brasil (vide, ainda, EDcl
no AgRg no REsp 480.221/RS, Quarta Turma, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ
de 27.3.2007; e REsp 971853/RS, Terceira Turma, Rel. Min. Pádua Ribeiro, DJ de
24.09.2007).
Esta solução deve ser mantida, pois
coloca o contrato dentro do que, em média, vem sendo considerado razoável
segundo as próprias práticas do mercado.
Não se deve afastar, todavia, a possibilidade de que o juiz, de acordo
com seu livre convencimento racional, indicar outro patamar mais adequado para
os juros, segundo as circunstâncias particulares de risco envolvidas no
empréstimo.
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Portanto, no que
diz respeito aos juros remuneratórios, a 2ª Seção do STJ consolida o entendimento
de que:
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos
juros remuneratórios que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33),
como dispõe a Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano
por si só não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros
remuneratórios dos contratos de mútuo
bancário as disposições do art. 591
c/c o art. 406 do CC/02;
d)
É
admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais,
desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de
colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique
cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto.
II - PERÍODO DA INADIMPLÊNCIA
2.
CONFIGURAÇÃO DA MORA
Quanto à mora em contratos
bancários, são vários os entendimentos cristalizados pela jurisprudência do STJ
ao longo dos anos. De forma sucinta, a seguir serão expostos tais
entendimentos, no sentido do mais geral ao mais particular.
É preciso alertar, apenas, que nem
sempre foram encontradas decisões que exemplificassem a utilização de cada uma
de tais posições. E esse fato não deve ser interpretado como representativo de
uma eventual superação ou desprestígio de certo entendimento em face de outro.
Trata-se, apenas, de um sinal demonstrativo das relações de continência e de
especialidade existentes entre os tópicos, pois, à medida que existe certo
diálogo entre eles, é natural que nem todos sejam citados cumulativamente.
A partir de tais ressalvas, o
entendimento mais genérico é aquele consubstanciado no precedente REsp
607.961/RJ, 2ª Seção, de minha Relatoria, julgado em 09.03.2005, segundo o qual
“não basta o ajuizamento de ação
revisional para descaracterização da mora”.
Esse primeiro posicionamento é
encontrado, isoladamente, em
decisões de alguns Ministros,
conforme segue:
Insuficiência do mero
ajuizamento de ação revisional para descaracterizar a mora. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
|
|
Aldir Passarinho
Junior |
|
|
Nancy
Andrighi |
REsp
607.961/RJ, j. em 09.03.2005 |
2a
Seção |
João
Otávio de Noronha |
|
|
Massami
Uyeda |
Resp nº
1.071.004/RS, DJ de 15.08.2008 |
Unipessoal |
Sidnei
Beneti |
|
|
Luis
Felipe Salomão |
|
|
Carlos
Mathias |
|
|
Ari
Pargendler |
AgRg no
Ag 678.120/SP, j. em 29.11.2005 |
3a
Turma |
O
entendimento mais utilizado, todavia, é aquele derivado do julgamento do EREsp
163.884/RS, 2ª Seção, Rel. Min. Barros Monteiro, Rel. p/ Acórdão Min. Ruy
Rosado de Aguiar, julgado em 23.05.2001, segundo o qual apenas a constatação de que foram exigidos encargos abusivos na
contratação permite o afastamento da configuração da mora.
Tal
posicionamento é reiteradamente aceito:
A exigência de encargos
abusivos permite o afastamento da mora. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
AgRg no
Resp 1.060.855/RS, j. em 19.08.2008 |
4a
Turma |
Aldir
Passarinho Junior |
AgRg no
Resp 990.830/RS, j. em 24.06.2008 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
Ag 710.601/MS, j. em 16.02.2006 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
Resp
1.029.420/RS, DJ de 04.08.2008 |
Unipessoal |
Massami
Uyeda |
Resp
1.068.353/RS, DJ de 15.08.2008 |
Unipessoal |
Sidnei
Beneti |
AgRg no
Resp 973.646/RS, j. em 25.03.2008 |
3a
Turma |
Luis
Felipe Salomão |
|
|
Carlos
Mathias |
|
|
Ari
Pargendler |
Ed no
AgRg no Resp 593.205/RS, j. em 23.11.2005 |
3a
Turma |
De forma correlata, é possível citar
diversos precedentes utilizando o
mesmo argumento, mas com a inversão
da premissa e da conclusão – ou seja, se
não existe abusividade, a mora do devedor está configurada:
Configuração da mora na ausência de abusividade. |
|
|
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
Resp
750.022/RS, j. em 15.09.2005 |
4a
Turma |
Aldir
Passarinho Junior |
AgRg no
Resp 917.459/RS, j. em 13.05.2008 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
Resp 958.662/RS, j. em 25.09.2007 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
Resp
1.067.303/RS, DJ de 15.08.2008 |
Unipessoal |
Massami
Uyeda |
Resp
894.916/RS, DJ de 19.12.2006 |
Unipessoal |
Sidnei
Beneti |
Resp
1.063.818/RS, DJ de 22.08.2008 |
Unipessoal |
Luis
Felipe Salomão |
Resp
1.015.148/RS, DJ de 04.08.2008 |
Unipessoal |
Carlos
Mathias |
|
|
Ari
Pargendler |
Resp nº
708.633/RS, j. em 26.02.2008 |
3a
Turma |
Porém, deve-se deixar claro que é o
eventual abuso na exigência dos
chamados “encargos da normalidade” –
notadamente nos juros remuneratórios e na capitalização de juros – que deve ser
levado em conta para tal análise, conforme definido no precedente EDcl no AgRg
no REsp 842.973/RS, 3ª Turma, Rel. originário Min. Humberto Gomes de Barros,
Rel. p/ Acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 21.08.2008.
De outro modo, o eventual abuso em algum dos encargos moratórios não descaracteriza a
mora. Esse abuso deve ser extirpado ou decotado sem que haja interferência
ou reflexo na caracterização da mora em que o consumidor tenha eventualmente
incidido, pois a configuração dessa é condição para incidência dos encargos
relativos ao período da inadimplência, e não o contrário.
Os encargos abusivos que possuem
potencial para descaracterizar a mora são, portanto, aqueles relativos ao
chamado “período da normalidade”, ou seja, aqueles encargos que naturalmente
incidem antes mesmo de configurada a mora.
Somente o abuso na cobrança de
encargo 'da normalidade' descaracteriza a mora. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
Resp
905.278/RS, DJ de 27.06.2008 |
Unipessoal |
Aldir
Passarinho Junior |
Ed no
AgRg no Resp 533.704/RS, j. em 08.03.2005 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
Ed no
AgRg no Resp 842.973/RS, j. em 21.08.2008 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
Voto-vista
no Ed no AgRg no Resp 842.973/RS, j. em
21.08.2008 |
3a
Turma |
Massami
Uyeda |
Resp
1.036.474/RS, j. em 27.05.2008 |
3a
Turma |
Sidnei
Beneti |
AgRg no
Resp 1.017.958/RS, j. em 15.04.2008 |
3a
Turma |
Luis
Felipe Salomão |
Resp
996.217/RS, DJ de 04.08.2008 |
Unipesssoal |
Carlos
Mathias |
|
|
Ari
Pargendler |
Voto-vista
no Ed no AgRg no Resp 842.973/RS, j. em
21.08.2008 |
3a
Turma |
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Logo, os seguintes enunciados
representam a jurisprudência
consolidada na 2ª Seção quanto ao
tema:
I . Afasta
a caracterização da mora:
(i) a constatação de que foram
exigidos encargos abusivos na
contratação, durante o período da
normalidade contratual.
I I . Não afasta a caracterização da mora:
(i) o simples ajuizamento de ação
revisional;
(ii) a mera constatação de que foram
exigidos encargos moratórios
abusivos na contratação.
JUROS MORATÓRIOS
Juros moratórios são aqueles pagos
pelo mutuário ao mutuante em
decorrência da mora no cumprimento
da prestação estabelecida no contrato.
3.1.
Posicionamento Atual da 2ª Seção
A jurisprudência do STJ encontra-se
pacificada no sentido de que,
nos contratos bancários não
alcançados por lei específica, os juros moratórios
podem
ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
Dentre outros, neste sentido,
confiram-se os seguintes julgados:
Juros moratórios – Limitação de 1% ao mês. |
|
|
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
AgRg no
REsp 672.168/RS, j. em 05.04.2005 |
4ª Turma |
Aldir
Passarinho Junior |
AgRg no
Ag 558.753/RS, j. em 08.06.2004 |
4ª
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
REsp 469.538/RS, j. em 20.02.2003 |
3ª
Turma |
João
Otávio de Noronha |
Ag
965.353/RS, DJe de 12.02.2008 |
Unipessoal |
Massami
Uyeda |
REsp
1.038.417/RS, DJe de 25.06.2008 |
Unipessoal |
Sidnei
Beneti |
AgRg no
REsp 879.902/RS, j. em 19.06.2008 |
3ª
Turma |
Luis
Felipe Salomão |
REsp
1.007.561/RS, DJe de 05.08.2008 |
Unipessoal |
Carlos
Mathias |
- |
- |
Antônio
de Pádua Ribeiro |
AgRg no
REsp 406.841/RS, j. em 10.06.2003 |
3ª
Turma |
Ari
Pargendler |
REsp
188.674/MG, j. em 17.06.2003 |
3ª
Turma |
Barros
Monteiro |
REsp
400.255/RS, j. em 02.09.2003 |
4ª
Turma |
Carlos
A. Menezes Direito |
AgRg no
REsp 765.674/RS, j. em 26.10.2006 |
3ª
Turma |
Castro
Filho |
REsp
402.483/RS, j. em 26.03.2003 |
2ª
Seção |
Cesar
Asfor Rocha |
REsp
623.691/RS, j. em 27.09.2005 |
4ª
Turma |
Hélio
Quaglia Barbosa |
AgRg no
REsp 791.172 / RS, j. em 22.08.2006 |
4ª
Turma |
Humberto
Gomes de Barros |
AgRg no
Ag 830.575/RS, j. em 19.12.2007 |
3ª
Turma |
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
A 2ª Seção mantém o entendimento de
que, nos contratos bancários
não alcançados por legislação
específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1%
ao mês.
4.
CADASTROS DE INADIMPLÊNCIA
Entende-se por cadastros de
inadimplência todos os bancos de dados
mantidos por
quaisquer instituições, financeiras ou não, para controle acerca da reputação
do correntista, quanto à solvabilidade das obrigações por ele contraídas. São
exemplos os cadastros mantidos por instituições financeiras (SERASA) ou
empresas particulares (SPC), sem prejuízo de outros, existentes ou que venham a
ser criados.
A controvérsia acerca da inscrição
do nome do devedor em cadastros de inadimplência apresenta-se sob duas óticas,
a saber: (i) a possibilidade de inscrição no curso do processo em que se
discute o saldo devedor – e a consequente ponderação acerca dos requisitos para
o deferimento de tutela antecipada ou medida liminar que a impeça; e (ii) a
possibilidade de inscrição depois de discutido o mérito da ação, e os
requisitos a serem observados pela sentença para autorizar ou negar tal
inscrição.
Cada uma dessas questões deve ser
analisada à luz da jurisprudência
desta Corte, para uniformização dos
precedentes sobre a questão.
4.1.
Pedido de antecipação de tutela.
A
jurisprudência da 2ª Seção, consolidada no REsp 527.618/RS, Rel. Min. César
Asfor Rocha, julgado em 22/11/2003, firmou o entendimento de que, para que se
defira medida liminar ou antecipação de
tutela que impeça a inscrição do nome do devedor em cadastros de
inadimplência, no curso do processo, devem ser exigidos cumulativamente os seguintes requisitos: a) que haja ação proposta pelo devedor contestando a existência
integral ou parcial do débito; b) que nessa ação esteja efetivamente
demonstrado que a contestação da cobrança indevida se funda na aparência do bom
direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; c) contestada apenas
parte do débito, ofereça-se o depósito da parcela incontroversa ou a prestação
de caução, fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.
Cadastros de inadimplência -
Pedido de antecipação de tutela. |
|
|
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
REsp
871.832/PR, j. em 25.09.2007 |
4a
Turma |
Aldir
Passarinho Junior |
REsp
712.126/RS, j. em 22.03.2005 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
REsp 991.037/RS, j. em 18.03.2008 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
REsp
1.070.998/MS, DJ de 27.08.2008 |
Unipessoal |
Massami
Uyeda |
Ag
851.538/RS, DJ de 03.08.2007 |
Unipessoal |
Sidnei
Beneti |
Ag 821.076/RJ,
DJ de 30.06.2008 |
Unipessoal |
Luis
Felipe Salomão |
AgRg no
Ag 970.099/DF, j. em 26.08.2008 |
4a
Turma |
Carlos
Mathias |
Ag
920.214/DF, DJ de 05.09.2008 |
Unipessoal |
Ari
Pargendler |
AgRg no
Ag 651.764/RS, j. em 27.08.2008 |
3a
Turma |
4.2.
Sentença com resolução do mérito.
A
remessa do nome do devedor para os referidos cadastros de inadimplentes deve se
limitar a acompanhar o que ficar decidido quanto à mora, ou seja, tal inscrição
somente será lícita se a mora restar configurada.
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Logo, os seguintes enunciados
representam a jurisprudência consolidada na 2ª Seção quanto ao tema:
a) A proibição da inscrição/manutenção
em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida
cautelar, somente será deferida se, cumulativamente:
i) houver ação fundada na existência integral ou parcial do débito; ii) ficar
demonstrado que a alegação da cobrança indevida se funda na aparência do bom
direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) for depositada a
parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio
do juiz;
b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes, por ocasião da sentença ou do acórdão, seguirá a sorte do que
houver sido decidido no mérito do processo quanto à mora. Autoriza-se a
inscrição/manutenção apenas se configurada a mora.
5. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. REVISÃO DE
OFÍCIO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS.
Considerando a renovação da
composição da 2ª Seção, dado que sou a única remanescente do julgamento do
EREsp 702.524/RS, propus a rediscussão do entendimento consolidado e registrei
que o meu posicionamento, sempre ressalvado, foi no sentido de admitir a revisão
de ofício, pelos julgadores das instâncias ordinárias, pois estes julgamentos,
muitas vezes, limitam-se a reconhecer proteções ao consumidor que já estão
pacificadas pela jurisprudência do STJ.
No Eresp nº 702.524/RS, consignei
que a visão restritiva da análise das disposições de ofício, mediante
perspectiva puramente processual, estava empurrando a jurisprudência do STJ
para um paradoxo, porque em questão similar – decretação de ofício da nulidade
da cláusula de eleição de foro –, a solução adotada foi pelo conhecimento de
ofício da questão.
Diante da antinomia dos julgamentos,
por que assumir postura diversa em relação a todas as demais cláusulas abusivas
que possam vir a serem declaradas nulas?
Ademais, essa proposição, hoje,
reafirma-se pela tomada de posição do legislador, que inseriu um parágrafo
único no art. 112 do CPC (pela Lei nº 11.280/06), segundo o qual “a nulidade da clausula de eleição de foro,
em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de
competência para o juízo de domicilio do réu”.
Atenta ao micro-sistema introduzido
pelo CDC, vinculado aos demais princípios e normas que orientam o direito
pátrio, notadamente do CC/02, que é sua fonte de complementação normativa,
entendo que não é coerente adotar perante hipóteses idênticas soluções
diversas.
O CDC é categorizado como norma de
ordem pública (art. 1º); portanto, todas as suas disposições possuem interesse
público que impelem o juiz a atuar de ofício. Além do mais, o CDC adotou a
mesma teoria de nulidades que regula os contratos regidos pelo Código Civil, especificando
os vícios que são causa de nulidade e que o juiz deve declarar de ofício. A
abusividade, por exemplo, é disciplinada como vício de nulidade da cláusula do
contrato – art. 51, IV, do CDC.
Outro motivo relevante que me levou
a fazer esta proposição é o
resultado dos
julgamentos em favor dos consumidores, na perspectiva da política judiciária.
Como explicar ao consumidor, leigo
juridicamente, que determinada
cláusula, apesar
de abusiva, é válida para ele, mas não o é para o seu vizinho, em situação
idêntica?
O que ocorre é que na ação
revisional proposta pelo vizinho houve
pedido expresso
de declaração de nulidade, ao passo que no seu processo não foi formulado tal
pedido, o que impede o juiz de pronunciá-la.
Consequências graves são geradas por
esse tipo de julgamento: a
primeira é a equivocada priorização da norma
processual (que exige a formulação de pedido expresso) de molde a inviabilizar
o conhecimento e a aplicação do direito material (nulificação da cláusula
abusiva), exigindo para tanto uma nova movimentação da máquina judiciária com a
propositura de outra ação; a segunda
é o manifesto descumprimento de regra que disciplina a sanção decorrente da
abusividade/nulidade, prevista expressamente no CDC e no ordenamento jurídico
complementar (CDC, art. 51, todos os seus incisos, cumulado com o CC/02,
parágrafo único, do art. 168, que determina ao juiz pronunciar as nulidades
provadas, quando conhecer do negócio jurídico ou de seus efeitos); a terceira é o descrédito no Poder
Judiciário, que tem a obrigação constitucional de tratar igualmente os
consumidores que se encontram em situações idênticas; a quarta é a frustração de toda a operacionalidade do novo
instrumento dos processos repetitivos, pois o não reconhecimento de ofício
impõe reiteração de ações e recursos, que o art. 543-C visa impedir,
prejudicando a almejada celeridade na entrega da prestação jurisdicional.
O entendimento da Relatora foi
acompanhado, com fundamentos
diversos, pelo i. Min. Luis Felipe
Salomão.
Os demais Ministros que compõem a 2ª
Seção do STJ mantiveram a
tese de que o juiz não está autorizado a proceder à revisão de ofício de
cláusulas
contratuais.
Os precedentes que cristalizaram
essa posição são o REsp
541.153/RS, Rel.
Min. César Asfor Rocha, julgado em 08.06.2005, e o EREsp 702.524/RS, do qual
fui relatora originária, vencida, e Relator para acórdão o Min. Humberto Gomes
de Barros, julgado em 08.03.2006.
Registro, por oportuno, que todos os Ministros
que compõem a 2ª Seção possuem decisões neste sentido, ainda que com ressalvas.
Confira-se:
Impossibilidade de revisão de
ofício de cláusulas contratuais nas instâncias ordinárias. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
EREsp
645.902/RS, j. em 10.10.2007 |
2a
Seção |
Aldir Passarinho
Junior |
AgRg no
Resp 1.028.361/RS, j. em 15.05.2008 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
Resp 824.847/RS, j. em 16.05.2006 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
Resp
1.064.594/RS, DJ de 04.08.2008 |
Unipessoal |
Massami
Uyeda |
Resp
1.042.903/RS, j. em 3.06.2008 |
3a
Turma |
Sidnei
Beneti |
AgRg no
Resp 782.895/SC, j. em 19.06.2008 |
3a
Turma |
Luis
Felipe Salomão |
Resp
1.007.561/RS, DJ de 05.08.2008 |
Unipessoal |
Carlos
Mathias |
- |
- |
Ari
Pargendler |
AgRg no
EREsp 801.421/RS, j. em 14.03.2007 |
2a
Seção |
CONSOLIDAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA
Assim, resta mantido o
posicionamento desta 2ª Seção no sentido de
que é vedado aos juízes de primeiro
e segundo grau, com fundamento no art. 51 do CDC, julgar, sem pedido expresso,
a abusividade de cláusulas contratuais.
RESUMO DAS ORIENTAÇÕES - ART. 543-C,
§ 7º, DO CPC
1-
JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se
sujeitam à limitação dos juros
remuneratórios
que foi estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), como dispõe a Súmula
596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios
superiores a 12% ao ano
por si só não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros
remuneratórios dos contratos de mútuo
bancário as disposições do art. 591
c/c o art. 406 do CC/02;
d)
É
admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais,
desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de
colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique
cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do caso concreto.
2-
CONFIGURAÇÃO DA MORA
a) Afasta a caracterização da mora a
constatação de que foram
exigidos encargos
abusivos na contratação, isto é, durante o período da normalidade contratual;
b) O mero ajuizamento de ação
revisional ou a constatação de que
foram exigidos encargos moratórios
abusivos não afastam a caracterização da mora.
3-
JUROS MORATÓRIOS
Nos contratos bancários não
alcançados por legislação específica, os
juros moratórios poderão ser
convencionados até o limite de 1% ao mês.
4-
INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO
DE
INADIMPLENTES
a) A proibição da inscrição/manutenção
em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida
cautelar, somente será deferida se, cumulativamente:
i) houver ação fundada na existência integral ou parcial do débito; ii) ficar
demonstrado que a alegação da cobrança indevida se funda na aparência do bom
direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) for depositada a
parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio
do juiz;
b)
A inscrição/manutenção
do nome do devedor em cadastro de
inadimplentes, por ocasião da
sentença ou do acórdão, seguirá a sorte do que houver sido decidido no mérito
do processo quanto à mora. Autoriza-se a inscrição/manutenção apenas se
configurada a mora.
5-
JULGAMENTO COM DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO
É vedado aos juízes de primeiro e
segundo grau, com fundamento no
art. 51 do CDC, julgar, sem pedido
expresso, a abusividade de cláusulas contratuais. Vencidos quanto a esta
matéria a Min. Relatora e o Min. Luis
Felipe Salomão.
JULGAMENTO
DO RECURSO REPRESENTATIVO
REsp n.º 1.061.530/RS
1.
Deficiência na fundamentação.
Embora mencione
uma suposta violação aos arts. 6o, V, do CDC; 4o, VI, da
Lei 4.595/64; 422 e 478 do CC/02; 2º, 20 e 331, I, do CPC; 14 da Lei 9.492/97 e
161 do CTN, o recorrente não demonstrou, em relação a tais
dispositivos legais, no que
consistiria a ofensa à legislação federal.
A simples menção a artigo de lei, sem
a demonstração das razões de
inconformidade,
não abrem o caminho do Especial (Conf. AgRg no Ag 663.548/MS, Terceira Turma,
DJ de 10.04.2006).
Incide, por isso, a Súmula 284/STF.
2. Violação
a dispositivos constitucionais.
Aponta o recorrente violação aos
arts. 5º, XXXV, e 192 da CF/88. Todavia, a análise de pretensa ofensa a
dispositivo constitucional refoge à competência desta Corte, a que a Carta
Magna confia a missão de unificação do direito federal, nos exatos termos do
art. 105, III, da CF/88. Em se tratando, portanto, de violação de normas
constitucionais, o tema não há de ser analisado nesta sede recursal.
3. Capitalização
de Juros
O Tribunal de origem afastou a
capitalização mensal de juros com base na inconstitucionalidade da MP nº
1.963-17/00. Quanto a esta questão, usualmente debatida nos recursos especiais
que versam sobre a capitalização de juros, encontra-se assente nesta Corte o
entendimento de que o recurso especial não constitui via adequada para o exame
de temas constitucionais, sob pena de caracterizar usurpação da competência do
STF.
Neste sentido,
confiram-se os seguintes julgados:
Impossibilidade da apreciação da constitucionalidade da MP nº
1.963-17/00 em recurso especial. |
||
Ministro Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando Gonçalves |
AgRg nos EDcl no REsp
734.838/RS, j. em 18.10.2005 |
4ª Turma |
Aldir Passarinho Junior |
AgRg no REsp 900.411/DF, j. em
06.03.2007 |
4ª Turma |
Nancy Andrighi |
AgRg no REsp 999.829/RS, j. em
21.02.2008 |
3ª Turma |
João Otávio de Noronha |
AgRg no Ag 897.830/RS, j. em
20.11.2007 |
4ª Turma |
Massami Uyeda |
AgRg no Ag 668.746/RS, j. em
04.03.2007 |
4ª Turma |
Sidnei Beneti |
Ag 1.049.956/RJ, DJe de
28.08.2008 |
Unipessoal |
Luis Felipe Salomão |
- |
- |
Carlos Mathias |
- |
- |
Portanto, não se conhece do recurso especial
quanto ao ponto.
4. Disposições
de ofício.
Nos termos do entendimento ora
firmado, é inviável o exame de ofício de cláusulas consideradas abusivas em
contratos que regulem relação de consumo.
Portanto, devem ser decotadas as
disposições de ofício julgadas pelo acórdão recorrido.
5. Juros
remuneratórios.
O recurso especial deve ser provido
no que diz respeito à limitação dos juros remuneratórios, pois, conforme
reiteradamente afirmado por este Tribunal, a taxa de juros não é abusiva apenas
porque supera o patamar de 12% ao ano ou o valor da taxa Selic.
Vê-se, ademais, que as partes, em
28.12.2004, celebraram um contrato de empréstimo para financiamento da
aquisição de veículo a pessoa física, com taxa de juros pré-fixada em 2,5654%
ao mês, ou 35,5222% ao ano. As informações divulgadas pelo Banco Central do
Brasil revelam que, à época, a taxa média praticada no mercado, para operações
similares, era de 35,63% ao ano.
Assim, não se vislumbra discrepância
exagerada entre a taxa contratada e aquilo que representava a média de mercado
para o período, porquanto aquele é, inclusive, inferior a esta.
Logo, os juros remuneratórios
contratados encontram-se no limite que esta Corte tem considerado razoável e,
sob a ótica do Direito do Consumidor, não merecem ser revistos, porquanto não
demonstrada a onerosidade excessiva na hipótese.
6. Configuração
da Mora
Não tendo sido alterada a conclusão
do acórdão recorrido quanto à capitalização dos juros, verifica-se a cobrança
de encargo abusivo no período da normalidade contratual. Por esse motivo, resta
descaracterizada a mora do devedor, não havendo que se falar em violação aos
arts. 397 e 406 do CC/02 e 52, §1o, CDC.
7. Inscrição
em cadastro de inadimplentes.
Afastada, na espécie, a mora do
consumidor, é ilegal o envio de seus
dados para quaisquer cadastros de
inadimplência.
8. Manutenção
na posse.
A questão relativa à manutenção na
posse relaciona-se diretamente
com aquilo que
restou decidido quanto à configuração da mora. Como consolidado na Súmula
72/STJ, “a comprovação da mora é
imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente” .
Confira-se, ainda, nesse sentido: AgRg no REsp 400.227/RS, Rel. Min. Aldir
Passarinho Junior, DJ de 28.02.2005; AgRg no REsp 1.005.202/RS, 3ª Turma, Rel.
Min. Sidnei Beneti, DJe 07.05.2008.
Logo, afastada a mora da recorrida,
não há como ser acolhido o
pleito da instituição financeira de
afastar a recorrida da posse do bem alienado fiduciariamente.
Assim, não merece provimento o
recurso especial também nesse
ponto.
9. Protesto
de Título.
Embora a jurisprudência desta 2a
Seção venha reconhecendo que “o
protesto
do título representativo da dívida é procedimento legítimo e inerente à
cobrança executiva, não podendo ser obstado em face de simples ajuizamento,
pelo devedor, de ação revisional do contrato de empréstimo, salvo situação
excepcional, sequer objeto de discussão no recurso especial” (REsp 337.794 / SC, 4ª Turma, Rel.
Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 15.04.2002), a hipótese vertente revela que
foram cobrados encargos abusivos, durante o período de 'normalidade'
(capitalização mensal), e que, com isso, afastou-se a mora.
Dessa forma, sendo o protesto um
procedimento que pressupõe a
inadimplência, o acórdão recorrido
deve, nesse ponto, ser mantido.
10. Depósitos.
Embora a recorrida tenha pleiteado e
o Tribunal de origem tenha aceitado a realização de depósitos parciais, o
recorrente vem sustentando que, nos termos do art. 890 do CPC, só é possível o
depósito integral.
Nesse aspecto, cumpre ressaltar que
não há qualquer vedação legal à efetivação de depósitos parciais, segundo
aquilo que a parte entende devido. Isso, por si só, afasta a pretensão do
recorrente.
É bem verdade que a existência de
depósito integral, ou não, pode ser relevante para a análise de uma série de
questões legais. Como demonstrado, a vedação à inscrição do nome do devedor em
cadastro de inadimplentes, em pedido de antecipação dos efeitos da tutela,
exige, entre outros requisitos, o depósito apenas parcial.
Veja-se, à guisa de exemplo, as
seguintes situações em que esta Corte aceitou o depósito parcial: AgRg no REsp
827035/RS, 4a Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho, DJ 19/06/2006; REsp
448.602/SC, 4a Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar DJ 17/02/2003.
Incide, portanto, a Súmula 83/STJ.
11. Comissão
de Permanência
11.1.
Juízo de Admissibilidade.
A Segunda Seção, por maioria, deixou
de conhecer do recurso especial quanto à comissão de permanência, por
considerar o recurso deficientemente fundamentado quanto à alínea "a"
do permissivo constitucional e pelo fato de o dissídio jurisprudencial não ter sido
comprovado, mediante a realização do cotejo analítico entre os julgados tidos
como divergentes.
Quanto
a este aspecto, fiquei vencida juntamente com i. Desembargador Convocado Carlos
Fernando Mathias, pois consideramos que o especial neste ponto poderia ser
apreciado em razão da notoriedade do dissídio jurisprudencial, notadamente por
se tratar de matéria repetitiva, objeto de questionamento em milhares de
recursos que ingressam neste STJ.
Apesar de o presente recurso não ter
logrado êxito em preencher os requisitos de admissibilidade, deixo aqui
consignados os fundamentos que teci quanto à legalidade da cláusula que prevê a
cobrança da comissão de permanência:
" 1. Definição
Definir
a comissão de permanência talvez seja uma das
tarefas
mais árduas do Direito Bancário. Este encargo foi instituído pela Resolução
15/66 do Conselho Monetário Nacional (CMN) e regulado pelas Circulares 77/67 e
82/67, ambas do Banco Central.
Com
efeito, há insegurança até quanto à sua definição,
natureza
jurídica e, principalmente, quanto aos componentes incorporados em seu cálculo.
Trata-se
de uma faculdade concedida às instituições financeiras para cobrar uma
importância calculada sobre os dias de atraso, nas mesmas bases proporcionais
de juros, encargos e comissões cobradas na operação primitiva. Em resumo, é um
mecanismo utilizado para o banco compensar-se dos prejuízos decorrentes do
inadimplemento.
Com
o surgimento da Lei 6.899/81, que possibilitou o direito à correção monetária a
partir do vencimento do débito e, algum tempo depois, com a edição da Resolução
1.129/86 do CMN, as instituições financeiras ficaram expressamente autorizadas
a cobrar a comissão de permanência de seus devedores por dia de atraso, além
dos juros de mora.
O
Banco Central do Brasil, ao responder o convite para se manifestar neste
incidente de processo repetitivo, afirmou, expressamente, desconhecer os
encargos que compõem a comissão de permanência:
“Não é possível saber com
antecedência os
encargos
que a instituição financeira deverá arcar para reequilibrar sua situação
líquida após o atraso no pagamento, ante a existência de inúmeras variáveis
(como a disponibilidade de crédito no mercado, os custos operacionais de cada
instituição financeira, sua situação patrimonial, etc.), razão pela qual a permanência no inadimplemento gera diferentes
encargos em cada contrato, a depender de suas especificidade e do momento em
que o atraso no pagamento ocorre.” (grifo no original)
A
Federação Brasileira de Bancos –
Febraban,
também
em resposta ao ofício de fls. 224, afirmou que os encargos moratórios (juros de
mora e multa contratual) devem ser cumulados com a comissão de permanência,
pleiteando a modificação da jurisprudência neste ponto.
Em
seguida, foi novamente oficiado à Febraban a respeito da definição deste
encargo, seu modo de cálculo e componentes, bem como sobre as taxas cobradas
por alguns dos maiores bancos brasileiros. Contudo, diante das respostas, como
se verificará em tópico posterior, constatou-se que cada instituição financeira
calcula a comissão de permanência de maneira particular e diferenciada das
demais, o que dificulta sobremaneira qualquer categorização definitiva.
2.
A evolução jurisprudencial da 2ª
Seção.
Quatro
são as principais controvérsias jurídicas a respeito da cobrança da comissão de
permanência, a saber: (i) cumulação da comissão com a correção monetária; (ii)
cumulação com os juros remuneratórios; (iii) cálculo da comissão pelas taxas
contratuais ou pela taxa média de mercado; (iv) cumulação com os encargos
moratórios (multa e juros de mora).
As
quatro controvérsias foram resolvidas da seguinte
forma:
(i)
Impossibilidade de cumulação com a
correção monetária, porque incorporada na própria comissão de
permanência
(Súmula 30/STJ);
(ii)
Impossibilidade de cumulação com os juros
remuneratórios,
porque a já citada Resolução 1.129/86 proibia a cobrança de “quaisquer outras
quantias compensatórias”. Foi reconhecido o caráter múltiplo da comissão de
permanência, que se prestava para atualizar, bem como para remunerar a moeda. O
leading case é o REsp 271.214/RS, julgado pela 2a Seção, Relator o
Min. Carlos Alberto Menezes Direito;
(iii)
O cálculo da taxa, a título de
comissão de permanência, pela média de
mercado divulgada pelo Banco Central, não caracteriza potestatividade, pois a
taxa média não é calculada pela instituição financeira, mas pelo mercado, sendo
que a taxa pactuada pelas partes limita o teto da cobrança (Súmulas
294
e 296/STJ);
(iv)
A incidência da comissão de permanência leva
necessariamente
à exclusão de todos os outros encargos, tenham eles natureza remuneratória ou
moratória (AgRg no REsp 706.368/RS, também pela 2a Seção, de minha
Relatoria, ainda no mesmo sentido o AgRg no REsp 712.801/RS, 2a
Seção, Relator o Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
Esclareceu-se,
portanto, que a natureza da cláusula de comissão de permanência é tríplice:
índice de remuneração do capital (juros remuneratórios), atualização da moeda
(correção monetária) e compensação pelo inadimplemento (encargos
moratórios). Assim, esse entendimento, que impede a cobrança cumulativa da
comissão com os demais encargos, protege, como valor primordial, a proibição do
bis in idem.
Mais
recentemente, o Ministro Ari Pargendler passou a adotar – em nome da
transparência – posicionamento que explicita quais encargos podem ser cobrados
sob a denominação 'comissão de permanência'.
Confira-se:
“A
Segunda Seção, no julgamento do REsp nº 863.887, RS, consolidou o entendimento
de que a comissão de permanência abrange três parcelas, a saber, os juros
remuneratórios, à taxa média de mercado, nunca superiores àquela contratada
para o empréstimo, os juros moratórios e a multa contratual; daí ser impossível
a sua cobrança cumulada com juros de mora e multa contratual, sob pena de
incorrer em bis in idem.” (AgRg no REsp 986.508/RS, Terceira Turma, j. em
20.05.2008)
Em
outro precedente, julgado na mesma data pela Terceira Turma, o Min. Ari
Pargendler chegou, inclusive, a classificar de abusiva a comissão calculada em
percentual muito acima do cobrado nos juros remuneratórios, não sem antes
reforçar a natureza tríplice daquela:
“Quer dizer, após o vencimento, a
comissão de
permanência
visa manter, por meio dos juros remuneratórios, a base econômica do negócio,
desestimular, mediante os juros de mora, a demora no cumprimento da obrigação e
reprimir o inadimplemento pela aplicação da multa contratual.” (AgRg no REsp
1.016.657/RS, Terceira Turma, j. em 20.05.2008)
Neste
julgado, a cláusula que estipulava a comissão de permanência em 14,90% ao mês
foi considerada manifestamente abusiva, uma vez que, no período da normalidade,
os juros remuneratórios eram de 2,451% ao mês.
No
âmbito da Quarta Turma, também o Min. João Otávio de Noronha já seguiu tal orientação.
Confira-se:
“PROCESSO CIVIL. CONTRATO BANCÁRIO.
REVISIONAL.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LICITUDE
DA
COBRANÇA. 1. A partir do vencimento do mútuo bancário, o devedor responderá
exclusivamente pela comissão de permanência (assim entendida como os juros
remuneratórios, à taxa média de mercado, acrescidos de juros moratórios e multa
contratual) sem cumulação com a correção monetária (Súmula nº 30, STJ). 2.
Agravo regimental provido.” (AgRg no REsp 930.807/RS, Quarta Turma, Rel. Min.
João Otávio de Noronha, j. em 23.09.2008)
Da
jurisprudência consolidada, duas orientações
surgiram:
(i)
É possível a cobrança da comissão de
permanência, desde que não cumulada com nenhum outro encargo moratório ou
remuneratório. Prevista a cobrança da comissão de permanência cumulada com
outro encargo, este deve ser afastado, mantendo-se somente aquela.
Orientação
1 – Manutenção isolada da comissão de permanência e afastamento de outros
encargos. |
||
Ministro
Relator |
Julgado |
Órgão |
Fernando
Gonçalves |
AgRg no
REsp 1.020.737/RS, j. em 24.06.2008 |
4a
Turma |
Nancy
Andrighi |
AgRg no
REsp 1.057.319/MS, j. em 19.08.2008 |
3a
Turma |
João
Otávio de Noronha |
AgRg no
Ag 961.275/SP, j. em 06.03.2008 |
4a
Turma |
Massami
Uyeda |
AgRg no
REsp 1.056.827/RS, j. em 07.08.2008 |
3a
Turma |
Sidnei
Beneti |
EDcl no
AgRg no REsp 1.014.434/MS, j. em 19.08.2008 |
3a
Turma |
Carlos
Mathias |
|
|
Ari
Pargendler |
AgRg no
REsp 1.016.657/RS, j. em 20.052008 |
3a
Turma |
Carlos
A. Menezes Direito |
REsp
821.357/RS, j. em 23.08.2007 |
3a
Turma |
Hélio
Quaglia Barbosa |
AgRg no
REsp 986.179/RS, j. em 27.11.2007 |
4a
Turma |
Humberto
Gomes de Barros |
AgRg no
REsp 896.269/RS, j. em 06.12.2007 |
3a
Turma |
(ii)
Se o acórdão recorrido permitiu a
cobrança de qualquer outro encargo, afasta-se a cobrança da comissão de
permanência, mantendo os demais encargos.
Este
entendimento é defendido pelos Ministros Aldir Passarinho Junior e Luis Felipe
Salomão:
Orientação
2 – Afastamento da comissão de permanência e manutenção dos outros encargos. |
||
Ministro
Relator |
Julgado |
Órgão |
Aldir
Passarinho Junior |
AgRg no
REsp 990.830/RS, j. em 24.06.2008 |
4a
Turma |
Luis
Felipe Salomão |
AgRg no
Resp 920.180/RS, j. em 26.08.2008 |
4a
Turma |
4.
Da Ilegalidade da Comissão de
Permanência.
A
jurisprudência atual da 2ª Seção está pacificada no
sentido
de admitir a cobrança da comissão de permanência, desde que não cumulada com
nenhum outro encargo – moratório ou compensatório – e calculada à taxa média do
mercado, limitada às taxas contratuais.
A
resposta aos ofícios encaminhados à Febraban revelou dados novos que não podem
passar despercebidos e que merecem ser considerados na elaboração deste voto.
Os
bancos, ao responderem às indagações da Febraban acerca da composição da
comissão de permanência, solicitaram, por questões comerciais e concorrenciais,
que esta julgadora mantivesse sigilo de suas informações, o que será
respeitado.
Isto
não impede, porém, que alguns desses dados sejam
utilizados,
de forma impessoal e genérica, na elaboração deste voto.
As
enormes variações constatadas das respostas ao
ofício,
demonstram que cada banco trata da cláusula de comissão de permanência de
maneira particular e diferenciada, o que impossibilita o conhecimento pelo
consumidor daquilo que está pagando, além de inviabilizar a comparação dos
custos da inadimplência face aos outros bancos.
Vejam-se
os seguintes dados:
(i)
Um dos bancos cobrou, para abertura
de crédito, em setembro de 2007, acima de 16% ao mês nos dois primeiros meses,
e em torno de 5,50% após, em ambos os casos acrescido de 1% ao mês a título de
juros de mora;
(ii)
Em outro banco, a tendência é que a
comissão se aproxime muito das taxas de juros, encontrando-se ao redor de 0,5%
ao dia;
(iii)
Outro banco comunicou serem vários
os componentes formadores do encargo, como os custos com a captação de
recursos, os impostos, o risco de inadimplência e o chamado custo de
administração, que envolve gastos com pessoal, operacional, de instalações e
equipamentos. Para este banco, a comissão foi de 12% ao mês para as diversas
modalidades de operação de crédito;
(iv)
Outro banco informou que, nos
últimos doze
meses,
a comissão de permanência variou entre, aproximadamente, 4,70% e 6,30% ao mês;
(v)
Na resposta mais esclarecedora, um
banco afirmou que compõem a sua comissão de permanência, entre outros, os
seguintes itens: “custas com despesas jurídicas pela ação de cobrança” e “custo
operacional pela ativação da cobrança (...) Escritórios de Cobrança e
Escritórios de Advocacia”. Aqui, a comissão variou entre 6,5% até quase 20% ao
mês.
Acrescente-se,
por fim, a palavra da Febraban,
entidade
representativa dos bancos, que, textualmente, assevera:
“Em
outras palavras, é impossível apontar
critérios uniformes de cálculo da
comissão de permanência para
todas as instituições, dado que esse
cálculo
se baseia em diferentes peculiaridades.”
(grifei)
Como se depreende de tais
informações, a incidência
da cláusula de comissão de
permanência, tal como ocorre nos dias atuais, viola uma série de princípios e
direitos previstos no CDC.
Numa
listagem meramente exemplificativa, são
afrontados o princípio da
transparência (art. 4º, caput); o
princípio da boa-fé e equilíbrio entre os contratantes (art. 4º, III); o
direito à informação adequada e clara sobre os produtos e serviços (art. 6º,
III); além das regras específicas para a outorga de crédito ou concessão de
financiamento ao consumidor, previstas nos incisos do art. 52 do CDC
(informação prévia e adequada sobre o preço do produto, o montante dos juros e
os acréscimos legais).
Tais
princípios são essenciais na sistemática do CDC,
como
anota a doutrina em diversas oportunidades:
(i) Sobre a boa-fé e a
transparência:
“Poderíamos
afirmar genericamente que a
boa-fé
é o princípio máximo orientador do CDC; neste trabalho, porém, estamos
destacando igualmente o princípio da transparência (art. 4º, caput), o qual não
deixa de ser um reflexo da boa-fé exigida aos agentes contratuais.” (Cláudia
Lima Marques, Antônio Herman Benjamin e Bruno Miragem, in Comentários ao Código de Defesa do Consumidor , RT, São Paulo, 2003,
pág. 124)
(ii)
Sobre o direito à informação:
“Trata-se,
repita-se, do dever de informar bem o público
consumidor sobre todas
as características importantes de
produtos e serviços, para que aquele possa adquirir produtos, ou contratar
serviços, sabendo exatamente o que poderá esperar deles.” (Ada Pellegrini
Grinover e outros, in Código Brasileiro de
Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores
do Anteprojeto , Forense Universitária, Rio de Janeiro, 2004, pág. 138). Assim,
se está diante de uma situação de total indefinição sobre os encargos que
integram a comissão de permanência e de suas taxas, situação que se agrava,
inclusive, pelo inusitado pedido de sigilo formulado pelos bancos.
Exsurge
gritante a ausência de informação
transparente
e precisa ao consumidor, bem como a potestatividade da sua cobrança.
Logo,
deve ser definitivamente excluída a cláusula de comissão de permanência, mesmo
quando expressamente pactuada, permitindo-se aos bancos-credores, para o
período de inadimplência, a cobrança especificada dos seguintes encargos,
numericamente individualizados: (i) juros remuneratórios, limitados pela taxa
pactuada ou calculados à taxa média de mercado; (ii) juros moratórios, de acordo
com a lei aplicável; (iii) multa moratória de 2%, nos termos do art. 52, § 1º,
do CDC; e (iv) correção monetária, se for a hipótese. "
12.
Dispositivo
Forte em tais
razões, CONHEÇO PARCIALMENTE do Recurso Especial e, nesta parte, DOU-LHE
PROVIMENTO para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, na
forma como pactuados na espécie, e afastar as disposições de ofício realizadas
pelo Tribunal de origem.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao
pagamento das custas processuais e
dos honorários advocatícios, mantendo quanto a estes o valor fixado no acórdão
recorrido, que serão reciprocamente distribuídos e suportados na proporção de
80% pelo recorrente e de 20% pela recorrida, e devidamente compensados,
conforme a Súmula 306/STJ. Suspensa a exigibilidade, em relação à recorrida,
enquanto perdurarem os efeitos da concessão do benefício da assistência
judiciária gratuita.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO (proferido oralmente na sessão)
O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA:
a) Sustentação oral pela Febraban e
pelo Idec
Senhor Presidente, se não estou enganado, a votação em
questão de ordem começa
pelo mais antigo, mas já posso
proferir meu voto.
Indefiro. Com relação a este
processo, a lei é taxativa: aqueles que não são partes podem se manifestar;
todavia, hão de manifestar-se por escrito.
Trata o caso de mais um recurso
especial, apenas julgado pela técnica ou metodologia do instituto denominado
“recurso repetitivo”. A lei permite ao relator ouvir terceiros interessados,
vale dizer, pessoas que, embora não se submetam à eficácia da coisa julgada que
derivará do acórdão no caso concreto, têm legítimo interesse na defesa da tese
apreciada, tendo em vista a repercussão que dela se extrairá para futuros
julgamentos de outros recursos. No caso, os terceiros interessados foram
ouvidos e se manifestaram por escrito. Portanto, penso que, para manter a boa
ordem, deve-se cumprir o que ficou estabelecido nesta Seção em julgamento anterior:
a sustentação oral deverá ficar reservada apenas para as partes.
b) Mérito
I
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs.
advogados, inicialmente, parabenizo os advogados
que ocuparam a tribuna: Dr. Luciano,
pela parte recorrente; Dra. Cláudia Lima, grande especialista em Direito do
Consumidor; Dr. Marcos Cavalcante, grande especialista na matéria de Direito
Bancário; e Dr. Valter Moura, do Idec. Todos prestaram, da tribuna, proveitosos
esclarecimentos.
Entendo ser importante elucidar que
esta Corte, no presente julgamento, não tem por propósito questionar a
incidência do Código de Defesa do Consumidor nas relações de Direito Bancário.
Ao contrário, temos tal questão como resolvida em caráter definitivo, razão por
que este Sodalício editou a Súmula n. 297.
Tenho que reconhecer, outrossim,
que, no caso em espécie, não fomos felizes na
escolha do processo tipo, ou seja,
aquele afetado a julgamento da Seção nos termos do art. 543-C do Código de
Processo Civil. Com efeito, dois temas importantes não poderão ser analisados –
quais sejam, capitalização de juros e comissão de permanência –, pois, diante
das peculiaridades do caso em concreto, afigura-se impossível transpor a fase
do conhecimento para analisar tais questões, que integram o núcleo do mérito recursal.
O que restou então para ser
analisado? As teses relativas: a) às “disposições de ofício”; b) ao limite dos
juros remuneratórios; c) à configuração da mora – e, nesse ponto, parece-me
termos um problema de ordem técnica –; e d) à inscrição do nome do devedor no
cadastro de inadimplentes.
Manifesto-me, primeiramente, sobre a
capitalização de juros.
Entendo que a capitalização de juros
é matéria que não ultrapassa a fase de
conhecimento – e
peço vênia à Sra. Ministra Relatora para divergir no que tange aos fundamentos,
porquanto, embora o acórdão tenha enfrentado explicitamente a questão, fê-lo
sob a vertente constitucional. Confira-se:
"No que respeita à Medida
Provisória nº 2.070, não é aplicável, pelo fato de não atender aos requisitos
da relevância e urgência estabelecidas no art. 62 da Constituição Federal; por
isso, é inconstitucional, dependendo de processo legislativo ordinário para a
sua aplicação. Tanto é assim que a eficácia do art. 5º foi suspensa em 3 de
abril de 2002, por decisão do Ministro Sidney Sanches."
Observa-se, portanto, com uma
leitura mais atenta do acórdão recorrido, que há enfrentamento da questão,
mormente porque pressupõe contratada a capitalização de juros.
A minha divergência, contudo, está
em que o recurso não pode ser conhecido porque o enfrentamento da questão
deu-se com base em fundamento constitucional, ou seja, o acórdão está
respaldado em norma constitucional; tanto é que o recorrente também aviou
recurso extraordinário – inclusive causou-me perplexidade o fato de esse
recurso não ter sido admitido na origem, tendo em vista o prequestionamento
explícito da norma constitucional.
Portanto, a questão da capitalização
dos juros, no caso, ainda está em aberto, pendente de apreciação pelo Colendo
Supremo Tribunal Federal. Aqui, vejo algo mais grave, que, aliás, passou
desapercebido pelo recorrente e por todos que, no Tribunal de origem,
participaram do julgamento –. O Tribunal, na realidade, ao afastar a
constitucionalidade da norma, fê-lo em julgamento em sede de órgão fracionário,
violando, sem sombra de dúvida, o princípio da reserva de plenário, visto que
somente o Órgão Especial do Tribunal do Rio Grande do Sul poderia aferir a
inconstitucionalidade da norma, nos termos do art. 97 da Constituição Federal e
dos artigos 481 e 482, ambos do CPC.
Esta Corte teria condições de
conhecer da matéria se, no recurso especial, a questão da violação dos artigos
481 e 482 do CPC tivesse sido agitada no acórdão recorrido. Como não foi,
entendo que não temos como enfrentá-la, uma vez que matérias que não foram
prequestionadas não podem ser apreciadas por este Tribunal ante a incidência
das Sumulas ns. 282 e 356 do Colendo STF.
Entretanto, se a capitalização de
juros encontra-se pendente de apreciação – porque aviado recurso extraordinário
– surge outra questão: a mora está, então, descaracterizada? No caso em
julgamento, ainda não. Com efeito, é certo que a mora só poderá ser considerada
descaracterizada caso o Supremo Tribunal acolha a tese de inconstitucionalidade
da capitalização mensal dos juros ¾ ressalto, matéria ainda submetida à
apreciação da excelsa Corte em vista do ajuizamento pelo ora recorrente de
recurso extraordinário. Assim, entendo que, enquanto pender a apreciação da
tese no Supremo Tribunal, não temos como analisar a abusividade dos encargos contratados
de modo a descaracterizar a mora. Isso
porque o recurso extraordinário, no caso em espécie, é prejudicial ao
julgamento do recurso especial.
Essa questão a Sra. Ministra
Relatora não enfrentou, até porque S. Exa. diz, em seu
voto, quando trata da capitalização
de juros, à fl. 10, que:
"Os encargos abusivos que
possuem potencial para descaracterizar a mora são, portanto, aqueles relativos
ao chamado 'período de normalidade', ou seja, aqueles encargos que,
naturalmente, incidem, antes mesmo de configurada a mora."
Ainda que ultrapassada essa questão,
penso que temos um incidente de prejudicialidade, que importaria na suspensão
do próprio julgamento do recurso especial para apreciação primeiro do recurso
extraordinário. Só aqui na Seção, lendo o voto da Ministra Nancy Andrighi, é
que constatei esse fato. Aliás, tal questão nem sequer foi mencionada nos
memoriais que me foram entregues pelas partes ou pelos terceiros interessados.
Se suplantada a questão, enfrento os
demais argumentos.
Quanto à comissão de permanência,
também não conheço do recurso, visto que não foi demonstrada analiticamente a
divergência, bem como não foi apontado nenhum dispositivo de lei violado. A
mera citação de súmula e de paradigmas não dispensa a demonstração analítica da
divergência como, reiteradamente, entende a jurisprudência desta Corte.
Seguirei a ordem da eminente
Relatora.
No que tange aos juros de mora, a
eminente Relatora manteve a posição já consolidada deste Sodalício, no sentido
de ser permitido até o limite da taxa de 1% (um por cento) ao mês, com o que
estou de pleno acordo.
Quanto ao cadastro de inadimplência, também estou de pleno acordo com a Sra.
Ministra Relatora, inclusive no que tange ao pedido de antecipação de tutela,
porquanto o seu voto está em consonância com a reiterada jurisprudência da
Segunda Seção deste Tribunal.
Juros
remuneratórios:
nesse ponto, peço vênia para divergir.
É evidente que, em se tratando de
juros remuneratórios, há de ser apreciada a questão
da abusividade
das taxas; não tenho dúvida quanto a isso. Tal análise, contudo, há de ser
feita caso a caso. Data vênia, não
vejo como pode esta Corte tarifar ou tabelar tal encargo financeiro como forma
de estabelecer um paradigma para o diagnóstico da abusividade da taxa
contratada.
E por que me posiciono contra o
tarifamento ou tabelamento dos juros? A um, porque essa não é uma atribuição
que nos é dada pela Constituição Federal. A dois, porque entendo que decisão
dessa natureza acaba por penalizar ou prejudicar aquele que a lei quer
proteger, ou seja, o consumidor.
Os agentes econômicos têm
inteligência e instrumentos suficientes para contornarem um eventual (e
absurdo) tabelamento judicial dos juros. Em caso tal, a primeira consequência
seria um aumento radical das taxas cobradas como forma de elevar a “taxa média
de mercado”, o que encareceria sobremaneira o custo da moeda para os tomadores,
mormente para aqueles com menor potencial negocial, como os consumidores.
Por isso, hei de divergir da proposta
da eminente relatora de que esta Corte estabeleça um teto correspondente ao
dobro da taxa média como sendo os juros razoáveis. Vale dizer, haveria o
Judiciário de reconhecer como abusivos os encargos financeiros quando a taxa
pactuada ultrapassasse o dobro da média da taxa de juros praticada pelo mercado
financeiro. A meu sentir, melhor será aferir a abusividade diante do caso
concreto, tendo em conta a realidade econômica vigente em determinado local e
tempo. Confio que, nas instâncias ordinárias, os julgadores saberão, caso a
caso, diagnosticar se está ou não configurada a chamada abusividade dos
encargos cobrados para daí, então, descaracterizar ou não a mora.
Há outro detalhe: Sua excelência
Ministra Nancy Andrighi, embora estipule o dobro,
sustenta que é permitido à
instituição financeira provar que, com relação àquele cliente, os riscos
oferecidos são maiores. Tenho como correta tal afirmativa, pois, na estipulação
da taxa de juros, segundo a boa técnica bancária, o banco há de levar em conta
não apenas os riscos macroeconômico e setorial, mas também o risco do cliente.
Todavia, surge outro problema: admitida essa possibilidade, que me parece
extremamente razoável, inviabilizada encontra-se a tese que permite ao juiz, de
ofício, conhecer da abusividade dos encargos, visto que, ante a falta de
alegação do devedor, o que torna a questão incontroversa, nem sequer seria
possível oferecer à instituição financeira a oportunidade de desincumbir-se do
mister de demonstrar e provar que a elevação da taxa de juros, no caso
concreto, decorreria do elevado risco-cliente.
No caso em julgamento, pedindo
novamente vênia à ilustre Relatora, entendo que não
está configurada a abusividade dos
juros pactuados, porquanto a taxa estipulada é inferior à taxa média de mercado
vigente à época da celebração do contrato. Também, como afirmei, não há de ser
estipulada nenhuma tarifação, nenhum limite, visto que a abusividade dos
encargos há de ser aferida nas instâncias ordinárias, diante do caso concreto.
II
Não, Excelência. Mantenho a taxa
média de mercado, mas não estipulo o seu dobro
como teto ou mesmo estabeleço
qualquer outro limite. O parâmetro da razoabilidade dos encargos pactuados deve
ser aferido pelo Juiz diante do caso concreto, que poderá concluir pelo dobro,
pelo triplo ou por outro critério que seja inclusive inferior ao teto que V.
Exa. propõe.
Até digo que, quando
ficar estabelecido o dobro, a instituição financeira penderá por contratar
sempre por uma taxa que, embora inferior, seja mais próxima desse teto. Entendo
que, às vezes, considerando determinada situação da economia e do cliente, uma
vez e meia a taxa média poderá caracterizar preço excessivo da moeda. Reafirmo:
é melhor que o juiz, caso a caso, mediante demonstração cabal da situação,
tendo em conta a realidade econômica subjacente ao contrato e às provas dos
autos, decida, justificadamente, se há ou não onerosidade da taxa contratada.
Lamento que, no Brasil, discuta-se a
abusividade das cláusulas contratuais apenas com fundamento no Código de Defesa
do Consumidor. Na verdade, o instituto da onerosidade excessiva tem aptidão
para se configurar em qualquer tipo de relação contratual, pouco importando a
sede legislativa em que as partes estribam seus fundamentos. No Código Civil
atual, existe a figura da lesão, que anteriormente achava-se consagrada por
força doutrinária e jurisprudencial.
Na verdade, quando julgamos o
recurso especial pela técnica do procedimento repetitivo de que trata o art.
543-C do Código de Processo Civil, considerando a multiplicidade de recursos
com fundamento em idêntica questão de direito, primeiramente sufragamos o
entendimento da “tese jurídica” para depois aplicarmos o entendimento ao caso
em concreto. Mas no caso, não vejo como assim proceder, visto que o recurso em
questão não ultrapassa a fase do conhecimento ante a ausência do
prequestionamento da tese ora debatida.
III
Agora, manifesto meu posicionamento
a respeito da revisão de ofício das
cláusulas
contratuais nas instâncias ordinárias.
Aqui, novamente, peço vênia a Exma.
Ministra Nancy Andrighi, pois, neste ponto, temos como caracterizada entre nós
uma profunda divergência de cunho até ideológico, certamente em razão de nossas
origens. Sua Excelência desenvolveu toda a sua vida profissional, de forma
brilhante, na magistratura, enquanto eu finco minhas raízes no exercício por
mais de duas décadas na advocacia para só depois ingressar, como magistrado,
neste Colendo Tribunal, do que, aliás, muito me orgulho.
Sempre entendi que não cabe ao juiz
distanciar-se de sua neutralidade na condução do processo; não deve ele advogar
no sentido de defender interesse algum no processo. Se lhe é dado examinar
amplamente as provas e até tomar a iniciativa de inverter o seu ônus de
produção, isso não pode nos levar à conclusão de que o juiz protege o
hipossuficiente. Não, o juiz não protege ninguém, é a lei que, na forma por ela
taxativamente prevista, protege o hipossuficente nas relações de consumo, mas
nunca o juiz. A este cabe a tarefa de, diante do caso concreto, subsumir os
fatos a norma e, mediante um juízo de valor, formular a regra jurídica
aplicável ao caso.
Na atualidade, para a defesa dos
hipossuficientes, a Constituição Federal instituiu as defensorias públicas. Aliás,
a jurisprudência desta Sessão pacificou-se no sentido de não ser admissível a
revisão de ofício das cláusulas contratuais para taxá-las de onerosas.
Repiso a indagação: Como o juiz
poderá saber se há abusividade ou não diante do caso concreto se a própria
parte não a alegou?
E mais: até para ser coerente com o
que sustentei – acerca da impossibilidade de ser estabelecido um teto –, como
admitir possa o juiz, de ofício, promover o decote dos encargos financeiros
pactuados sem que seja oferecida à outra parte – o banco – a oportunidade de provar que, no caso
concreto, a taxa pactuada fora fixada tendo em conta as condições imperantes no
mercado e segundo a boa técnica bancária, não caracterizando portanto
abusividade?
Ademais, é bom que se diga que nem
sempre será do agente financeiro o ônus da prova da não-caracterização da
abusividade, porquanto existem hipóteses em que a inversão do ônus da prova não
deve ser deferida, como, por exemplo, quando a parte litigante for pessoa
jurídica que não se enquadra na relação de consumo ou quando não caracterizada
a hipossuficiência daquele que litiga com a instituição financeira.
Reitero minhas vênias para discordar
também de um dos fundamentos invocados pela eminente Relatora, qual seja, o da
alteração legislativa, que, a meu ver, diz respeito apenas às regras de
competência, não se referindo à possibilidade de conhecimento e decote de
ofício das cláusulas contratuais relativas aos encargos financeiros. Oportuno
lembrar que, na espécie, estamos tratando de direitos disponíveis e não se pode
olvidar que a parte, de regra, sabe o que pode e o que não pode contratar e
honrar.
Considero estranha à discussão
estabelecida no presente caso a questão relativa ao dever de informação da
instituição financeira, ora ventilada pela eminente Relatora.
Assim, peço vênia a Exma. Ministra
Relatora, mas não vejo razão que justifique que esta Corte altere o
entendimento jurisprudencial cristalizado ao longo de vários anos de
julgamento.
Rejeito também porque, durante esses
seis anos de Tribunal, constatei que o consumidor tem sido muito bem defendido
no Judiciário. A meu ver, o micro sistema legislativo que regula as relações de
consumo – segundo diz a eminente Dra. Cláudia Lima Marques – vem atingindo alto
grau de eficácia, conforme se infere do exame dos acórdãos deste Tribunal.
Aliás, a jurisprudência edificada nesta Corte a respeito do tema não se
consolidou por obra do acaso. Ao contrário, é fruto direto do hercúleo trabalho
desenvolvido pelos advogados contratados por diversos organismos de proteção do
consumidor, como por exemplo, o Idec. Assim, afigura-se inegável que a
estrutura protetiva das relações de consumo não está exigindo que o juiz perca
sua neutralidade no processo; por isso, entendo não deva ele atuar substituindo
ou dispensando a manifestação da parte indigitada como hipossuficiente na
defesa de seus interesses.
Assim, com as ressalvas aqui
colocadas quanto: a) ao conhecimento de
ofício; b) ao fundamento da questão acerca da
capitalização mensal dos juros; e c) ao estabelecimento de um teto – que
a Sra. Ministra Relatora indicou como sendo o dobro da taxa média de mercado –
para aferição da abusividade da taxa de juros contratada, acompanho, no mais, o
brilhante, didático e claro voto da Sra. Ministra Fátima Nancy Andrighi.
Conheço parcialmente do recurso
especial e dou-lhe provimento em maior extensão do que aquele dado pela
Relatora.
Fica pendente a questão da prejudicialidade
relativa à questão da capitalização de juros, tese que tem relação com a
descaracterização da mora.
c) Correção
do resultado após esclarecimentos
Sr. Presidente, dou provimento ao
recurso especial neste ponto; dou provimento ao recurso especial quanto aos
juros remuneratórios, porque a Sra. Ministra Relatora também o proveu; entendo
que, quanto à configuração da mora, temos uma questão de prejudicialidade para
ser resolvida. Penso que deveríamos primeiro apreciar essa questão. Quanto à
inscrição no cadastro de inadimplemento, estou acompanhando o voto da Sra.
Ministra Relatora.
Conheço parcialmente do recurso
especial, porque dele não conheço com relação à comissão de permanência, e
dou-lhe provimento em maior extensão que a Sra. Ministra Relatora.
d)
Esclarecimentos do Ministro João
Otávio para a Ministra Nancy Andrighi, no sentido de divergir dos fundamentos
de seu voto quanto à estipulação de um teto para aferir sobre a abusividade da
taxa de juros.
I
Quanto aos percentuais, acompanho o
voto de V. Exa., Sra. Ministra Nancy Andrighi. Não há abusividade. Mas, como V.
Exa. avança em seus fundamentos, e o acórdão deste julgamento certamente será
considerado como paradigma nas instâncias ordinárias, reafirmo que não concordo
com o estabelecimento de um teto ou limite como forma de balizar a aferição da
abusividade dos encargos financeiros. Reafirmo: esta aferição deverá ser feita
pelo juiz caso a caso.
II
Acredito até que essa questão não é
objeto de discussão, mas V. Exa. sobre ela tece considerações em seu voto. Entendo que, mesmo que inserido no seu voto
como obter dictum, algum operador do
direito, menos atento, poderá pleitear a aplicação do limite proposto por V.
Exa. Daí o cuidado que devemos ter para que questão não efetivamente apreciada
por esta Corte possa ser tomada como se decidida o fosse por ela.
III
Minha preocupação reside – Exma.
Ministra Nancy Andrighi – no cuidado que
devemos ter com o efetivo
entendimento do que aqui restou decidido. Suponhamos que V. Exa. seja autora do
voto vencedor e, por isso, lavre o acórdão. Se do seu voto constar esse fundamento
– com o qual não concordamos –, esse entendimento poderá pautar a conduta dos
julgamentos nas instâncias originárias, quando, na realidade, a Corte sobre
essa questão jurídica definitivamente ainda não se manifestou. Ademais, não há
sequer um precedente desta Seção que fixe qualquer limite ou parâmetro para
caracterização da abusividade da taxa de juros.
IV
Estou apenas mostrando a consequência.
De modo algum ataquei o posicionamento de V. Exa.; pelo contrário, o debate
está no mais alto nível e nossa intenção aqui é estabelecer regras claras que
possam orientar os juízes deste país
quando do julgamento de causas fundamentadas em tese idêntica a esta que
estamos apreciando.
e)
Esclarecimentos do Ministro João Otávio após o voto do Ministro Sidnei Beneti
I
Com relação à prejudicialidade,
chamei a atenção para o fato de o Tribunal ter
reconhecido a inconstitucionalidade
de norma federal por órgão fracionário, isto é,
sem observância do princípio da reserva de plenário.
A parte interpôs recurso
extraordinário, que se encontra pendente de apreciação pelo STF. Esse recurso
não foi suspenso pelo Excelso Pretório, em que pese o processamento da ADIn que
tem por objeto a mesma matéria.
II
Não, Sr. Ministro Sidnei Beneti, o
art. 481, parágrafo único, do Código de
Processo Civil dispensa o órgão
fracionário de submeter ao órgão pleno a argüição de inconstitucionalidade
quando esta já o fora declarada pelo
próprio órgão pleno ou pelo plenário do Supremo Tribunal Federal. No caso, nenhuma das hipóteses ocorreu .
f) Esclarecimentos do Ministro João Otávio à Ministra Nancy
Andrighi
Afirmei o seguinte: divirjo de V.
Exa. na aplicação da Súmula n. 7, já que o Tribunal
enfrentou expressamente a questão da
capitalização, dizendo que a afastava porque a Medida Provisória n. 2.170 é
inconstitucional. Vale dizer, afastou a eficácia da norma por
inconstitucionalidade sem suscitar o incidente de que tratam os artigos ns. 480
a 482 do Código de Processo Civil – incidente de inconstitucionalidade.
Por isso, não incide a Súmula n. 5
nem a Súmula n. 7. O Tribunal claramente enfrentou
a tese da inconstitucionalidade. A
matéria encontra-se explicitamente prequestionada. O proceder do Tribunal de
Justiça é que me parece, data venia,
equivocado. Concluindo pela inconstitucionalidade, caberia a ele suscitar o
incidente de inconstitucionalidade na forma preconizada pela Constituição e
pelo CPC. Todavia, não o fez. Nada obstante, a parte não ventilou a nulidade do
julgamento no recurso especial nem no recurso extraordinário. A questão, assim,
restou preclusa. Destarte, a questão relativa à reserva de plenário, no
presente caso, encontra-se sepultada.
Avanço: se se quer descaracterizar a
mora por causa da capitalização, porque vingou,
no Tribunal a quo, a tese de que a capitalização é inconstitucional, e se a questão
da capitalização continua aberta porque não transitada em julgado na medida em
que tal fundamento do acórdão recorrido restou impugnado por meio do recurso
extraordinário, apesar de o TJ ter-lhe
negado seguimento (fato que me parece absurdo, pois é a típica hipótese de prequestionamento
explícito), a parte teve o cuidado de interpor recurso de agravo de instrumento,
cujo julgamento encontra-se pendente. Portanto, não está transitada em julgado
a questão da capitalização. É esse o fundamento.
g) Esclarecimentos do Ministro João
Otávio após elucidação da Ministra Nancy Andrighi de que não considerou a mora
caracterizada.
I
Ora, se a mora não restou descaracterizada, então não
ocorrerá a prejudicialidade, uma
vez que, na hipótese de provimento
do recurso extraordinário interposto, o STF decidirá de modo definitivo a
questão da constitucionalidade ou não da capitalização dos juros.
II
Sra. Ministra Nancy Andrighi, V.
Exa. disse, com todas as letras, que a mora, no caso,
não está descaracterizada. O erro
foi meu. Assim, estou apenas dissentindo no que tange ao fundamento relativo à
estipulação do teto dos juros remuneratórios e à disposição de ofício.
RETOMADA
DO JULGAMENTO
a) Sobre o pedido de
suspensão formulado pelo Ministério Público em razão da ADIN n. 2.316-DF
Sr.
Presidente, entendo que esteja prejudicado o pedido, mas voto de acordo com a
Sra.
Ministra
Relatora.
b) Comissão de
permanência/ manutenção de posse/ cláusula-mandato/ protesto do título/
repetição de indébito, que não fazem parte das teses de uniformização, pois
referem-se ao caso concreto.
I
Não conhecemos do recurso quanto à
comissão de permanência, porque não havia demonstração analítica no que tange à
alínea c. Então, V. Exa. está
mudando o voto?
II
Estou afirmando que V. Exa. está
mudando o voto e pedirei vista para examinar.
O que é comissão de permanência? São
os encargos moratórios, isto é, cobrados após o
vencimento da obrigação. O que
tínhamos de fazer seria fixá-los. A jurisprudência evoluiu para entender que a
comissão de permanência é composta das seguintes parcelas: a) juros segundo a
taxa média de mercado; b) multa moratória de até 2% na forma do CDC: e c) juros de mora fixado em até 1% ao mês.
Cabe-nos a missão de deixar claro
aos juridicionados qual o entendimento deste Tribunal
sobre o conteúdo da denominada
cláusula “comissão de permanência”.
Aliás, esta Seção já o fez. Aqui estamos apenas precisando e reiterando
o seu conceito.
Comissão de permanência é, portanto,
o somatório dos encargos que incidem no período do inadimplento da obrigação,
ou seja, após o vencimento da dívida. Destarte, o devedor que honra
pontualmente com suas obrigações a esse encargo não estará submetido.
Com base nisso, não há como
prosperar, data vênia, o entendimento de que eventual
abusividade na estipulação dos encargos que integram a cláusula “comissão de
permanência” teria o condão de descaracterizar a mora. Ora, não se pode olvidar
que a cláusula “comissão de permanência” só adquire eficácia quando a mora já
estiver caracterizada.
Reportando-me ao princípio da boa-fé
objetiva – que deve ser aplicado à relação
contratual de forma a incidir em
ambos os lados da relação negocial – na hipótese, especificamente com relação
ao deferimento da busca e apreensão do
bem em face do inadimplemento contratual, entendo que não se deve permitir que o devedor que contratou e
adquiriu o bem com o produto do financiamento permaneça na posse do referido
bem quando apenas honrou uma única ou poucas prestações, só pelo fato de ter
ele ajuizado ação revisional. Não é esse
o comportamento que se espera de um homem probo.
Registro que tenho, no meu gabinete,
inúmeros processos nos quais se verifica a seguinte situação: paga-se uma ou
duas parcelas do financiamento e ajuíza-se a ação revisional sob alegação de
que cláusula de comissão de permanência é abusiva. Não se paga mais nada, e,
ainda assim, há decisões judiciais determinando que o bem (normalmente um
carro) deve ficar na posse do devedor inadimplente. É lógico que tais decisões, longe de
aplicarem o princípio da boa-fé objetiva, acabam por violá-lo.
Sr. Presidente, eventual excesso dos
encargos financeiros integrantes da cláusula “comissão de permanência” deve
levar o juiz simplesmente a decotá-los, ajustando o seu conteúdo àquele
admitido pela jurisprudência consolidada deste Sodalício.
Destarte, temos que nos pautar por
aquele entendimento que respeite e privilegie a conduta dos contratantes em
conformidade com o princípio da boa-fé objetiva, não tolerando abusividade na
cobrança dos encargos de mora e não permitindo a proliferação de condutas
abusivas do devedor, evitando-se ao mesmo tempo o crescente inadimplemento no
tráfico comercial, situação que prejudica a todos, mormente os adimplentes, que
sofrem as consequências na medida em que a elevação do risco importa no aumento
dos encargos financeiros. Cabe-nos zelar pelo prestígio do princípio da
segurança jurídica a bem de todos.
III
Sra. Ministra Nancy Andrighi, um
aparte, por favor. É importante.
A mora não foi descaracterizada por
V. Exa. na semana passada. Entendi que estava sendo descaracterizada e errei ao
propor o incidente de prejudicialidade. Mas, hoje, V. Exa. está voltando a
descaracterizar a mora pela cláusula de comissão de permanência ou não entendi
nada do voto de V. Exa.
c)
Manifestação do Ministro João Otávio de Noronha após os esclarecimentos da
Ministra Nancy Andrighi de que não estava decidindo acerca da mora, mas apenas
retirando a eficácia da cláusula que prevê a comissão de permanência
I
Entendo que essa posição de V. Exa.
prejudica o consumidor, porque a jurisprudência
evoluiu em benefício dele ao
estabelecer que a taxa de juros integrante da comissão de permanência –
refiro-me aos juros remuneratórios – será calculada segundo a taxa média de mercado.
Qual a grande vantagem para o
consumidor?
II
Sra. Ministra Nancy Andrighi, V.
Exa. também não está entendendo o que estou afirmando.
A comissão de permanência, ou seja,
os encargos que incidem após a mora ¾ segundo o entendimento de
nossa jurisprudência ¾
, na verdade, beneficia o consumidor quando a taxa de juros que a integra oscila segundo a taxa média de juros de
mercado apurada pelo Banco Central do Brasil. Isso é evidente, pois, na hipótese
de queda dessa taxa, o consumidor sai beneficiado sem que isso altere o
equilíbrio financeiro do contrato.
d) Após a proposta de se votar a
preliminar de conhecimento sobre a questão da comissão de permanência
I
Sr. Presidente, li o voto novamente
e verifico que o dissídio efetivamente não restou demonstrado.
Tenho que a matéria é relevante,
mas, ainda assim, no caso concreto, não vejo como ultrapassar o conhecimento do
recurso.
Bom seria que o critério reitor do
juízo de admissibilidade fosse o da relevância da tese jurídica, o que faria
preponderar sempre o interesse geral sobre o particular. Aliás, é a posição que
defendo minoritariamente nesta Corte. Mas, infelizmente não é o entendimento da
maioria dos Ministros que integram este Tribunal.
No caso vertente, como já dito, não
tendo o recorrente se desincumbido de demonstrar o dissídio jurisprudencial,
não vejo como conhecer do recurso nesse ponto.
II
Sr. Presidente, não conheço do
recurso especial pelas alíneas a e c.
e) Esclarecimentos sobre o teto –
parâmetro para aferir abusividade da taxa de juros
I
Sr. Presidente entendo que a fixação
de um teto referencial igual a duas vezes a taxa média de juros do mercado para
caracterização da abusividade, data vênia, não se mostra conveniente para o próprio
consumidor. É sabido que o custo do dinheiro varia segundo o tempo, o espaço
geográfico, as condições da macroeconomia e outras variáveis. Melhor deixar que
tal aferição, ou seja, a da abusividade,
fique entregue ao juiz que, diante do caso concreto, tendo em conta a
realidade do mercado no momento da contratação, saberá decidir se o consumidor
estará ou não sendo prejudicado. Aliás, é bom que se diga, que, em determinadas
situações, o estabelecimento do dobro da taxa média poderá ser inclusive
oneroso para o devedor. Tudo dependerá da realidade econômico-financeira
reinante.
II
Faço um complemento para melhor
informar meus Pares, com relação à fixação da taxa de juros. Cito aqui um exemplo: no Banco do Brasil, a
taxa de juros do cheque especial é fixada diferentemente para cada cliente
tendo em conta sempre o retorno financeiro oferecido, o grau de risco que ele
apresenta, a pontualidade e ainda o seu histórico econômico-financeiro. A isso
somam-se o risco setorial e o risco legal do produto. Inegável, portanto, que, para fixar a taxa de
juros, o banco leva em consideração uma série de variáveis ou fatores. Se assim o é, como poderá ser estabelecido
por decisão judicial um critério geral, desprezando consequentemente as
peculiaridades de cada contratação?
Se optarmos por estabelecer um teto,
toda essa realidade fática e econômica será desconsiderada e em detrimento de
quem? Do consumidor, é evidente.
O consumidor que quita seus
financiamentos no vencimento, que, com seus negócios, oferta uma razoável
retribuição ao banco pode obter uma taxa muito inferior àquela equivalente à
média do mercado. Para este consumidor, a fixação de uma taxa de juros igual ou
um pouco inferior, inclusive, ao dobro da taxa média de juros vigente poderá
caracterizar abusividade.
É por isso, Senhores Ministros, que
prefiro confiar na prudência do juiz da causa, que, diante da realidade do caso
concreto, saberá adotar a decisão que melhor atenda o equilíbrio contratual e,
por conseguinte, beneficie, nos exatos termos da lei, o consumidor probo e
honesto.
f) Esclarecimentos do Ministro João
Otávio ao Ministro Sidnei Benetti sobre a fixação de parâmetro para aferir a
abusividade da taxa de juros
Sr. Ministro Sidnei Beneti,
começarei pelo último ponto, a competição.
Penso que, por mais de dez anos, não
teremos uma efetiva concorrência no sistema financeiro: os bancos cresceram,
grandes instituições incorporaram outras menores, diminuindo, consequentemente,
a disputa pelo mercado. O que se tem observado no mundo, nestes últimos tempos,
é uma redução do número de instituições
financeiras. Bancos maiores incorporando menores ou, quando não, dois grandes
conglomerados fundindo-se, resultando numa instituição ainda maior e mais
forte, facilitando inclusive a formação de cartéis no sistema.
Então, competitividade no sistema
financeiro, nesta crise, por um prazo que estimo em dez anos, não haverá.
Assim, não acredito, pelo que tenho lido, que o sistema financeiro não se
reabilitará nos níveis de competitividade observados nos últimos anos, tamanho
o estrago feito no sistema americano, que refletiu diretamente no sistema
europeu. De outro lado, o sistema brasileiro está protegido porque os nossos
fundos de pensão não puderam comprar títulos emitidos pelas instituições estrangeiras.
É sabido que a taxa média de juros
de mercado é calculada segundo as taxas praticadas pelas instituições
financeiras, das quais algumas conseguem captar a custos baixos e outras não.
Consequentemente, as taxas por elas
praticadas variam segundo o custo de captação.
Assim, a cobrança de encargos pelas grandes instituições, que
normalmente captam recursos a custos menores, tendo como parâmetro a média da
taxa, poderá ser-lhes extremamente vantajosa. Já para os bancos pequenos, a
taxa média poderá ser inclusive inferior ao custo de captação.
Destarte, tenho que a estipulação de
um teto para aferição de abusividade poderá
sugerir aos agentes financeiros
procederem, preventivamente, ao aumento das taxas praticadas como forma de
elevar o cálculo da própria média, procedimento que seria altamente prejudicial
aos tomadores. Daí a importância de não
ser adotado um critério geral, mas ter sempre em conta a realidade econômica-financeira
que subjaz à causa posta à apreciação do judiciário.
É certo que o aumento da oferta de recursos certamente
reduziria o preço do dinheiro e
consequentemente influenciaria na
diminuição das taxas cobradas pelas instituições financeiras. Isso seria o
desejável neste momento. Entretanto, é sabido que a demanda por crédito, nesses últimos tempos,
cresceu em dimensão maior do que a oferta, fato que provocou a interrupção da
tão desejada queda das taxas que estava ocorrendo no mercado. Ou seja, a demanda por crédito voltou,
neste momento da economia brasileira, a ser bem maior do que a oferta –, basta
ver que os pequenos bancos estão passando por dificuldades para manter o giro
de suas carteiras, fato observado inclusive no crédito consignado que, pela
maior segurança que oferece ao financiador, permite seja cobrada, no financiamento,
uma taxa menor que a cobrada nos outros empréstimos em geral.
Está aí a razão de o Governo
brasileiro instituir, por meio da edição de medida
provisória, a exemplo do que está
acontecendo na Europa e nos Estados Unidos, um mini PROER para permitir que os
bancos maiores, inclusive o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, possam
adquirir carteiras de crédito de outros bancos menores que enfrentam problema
de liquidez em razão do descasamento entre os prazos de captação e o de
empréstimo dos recursos.
São essas as razões – Exmo. Ministro
– que me levam a me posicionar contrariamente
à Exma. Sra. Minstra Nancy Andrighi
no que tange à estipulação de um parâmetro (judicial) para aferição da
abusividade da cláusula dos encargos financeiros.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA SEÇÃO
Número Registro:
2008/0119992-4 Números
Origem: 10700002465 70021397559
70023207079 |
REsp 1061530 / RS |
PAUTA:
08/10/2008 |
JULGADO:
08/10/2008 |
Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY
ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. AURÉLIO VIRGÍLIO VEIGA
RIOS
Secretária
Bela. HELENA MARIA ANTUNES DE
OLIVEIRA E SILVA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE |
:
UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A |
ADVOGADOS |
: MARIANE CARDOSO MACAREVICH E
OUTRO(S) LUCIANO CORRÊA GOMES |
RECORRIDO |
:
ROSEMARI DOS SANTOS SANCHES |
ADVOGADO |
: MAURO
TRÁPAGA TEIXEIRA |
ASSUNTO:
Civil - Contrato - Revisão
SUSTENTAÇÃO
ORAL
Sustentaram oralmente, pela
Recorrente, o Dr. Luciano Corrêa Gomes, pela Recorrida, a Dra. Cláudia Lima
Marques, pela Federação Brasileira de Bancos - FEBRABAN, o Dr. Marcos
Cavalcante de Oliveira, pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor -
IDEC, o Dr. Walter Moura e o Subprocurador-Geral da República, Dr. Aurélio
Virgílio Veiga Rios, pelo Ministério Público Federal.
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA
SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
Em Questão de Ordem preliminar, a
Seção, por maioria, admitiu a sustentação oral da Febraban e do IDEC. Vencidos
os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e João Otávio de
Noronha.
Após o voto da Sra. Ministra
Relatora conhecendo parcialmente do Recurso Especial e, nesta parte, dando-lhe
provimento, e dos votos dos Srs. Ministros João Otávio de Noronha e Sidnei
Beneti conhecendo parcialmente do Recurso Especial, dando provimento em maior
extensão, pediu VISTA o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.
Aguardam os Srs. Ministros Carlos
Fernando Mathias (Juiz Federal convocado do TRF 1ª Região), Fernando Gonçalves
e Aldir Passarinho Junior.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro
Massami Uyeda.
Brasília, 08 de outubro
de 2008.
HELENA MARIA ANTUNES DE
OLIVEIRA E SILVA
Secretária
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO-PRELIMINAR
EXMO.
SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR:
Sr.
Presidente,
na verdade, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão tem razão, a Sra. Ministra
Relatora não conheceu. Então, estou com a Relatora por duas razões: uma, porque
não conheceu da matéria, então, está prejudicada e, segundo, porque também não
seria o caso de se aguardar, mas, de qualquer forma, a Relatora não está
conhecendo.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO
JUNIOR: Sr.
Presidente, rogo vênia a Sra.
Ministra Relatora para também não conhecer do recurso especial em função da
especificidade da matéria. Apenas pela mera nulidade da cláusula pelo nome que
se dá à comissão de permanência, eu não teria como enfrentar pela letra c.
Examinei a petição recursal e, de
fato, pela letra c fica muito
difícil o enfrentamento dessa questão, até porque a própria tese de mérito diz
respeito a se se poderia considerar nula ou não a comissão de permanência,
considerando que a nossa própria jurisprudência, em relação ao tema, considera
válida a cláusula, apenas limitando-a a uma taxa média de mercado, ou seja,
independentemente do que se ponha na comissão, sempre limitamos à taxa média de
mercado sem agregação de outros encargos, mas sempre validando-a.
Portanto, entendo que pela letra c ficaria difícil enfrentar a cláusula
específica, muito embora eu entenda a preocupação da eminente Relatora no
sentido de se procurar solucionar essa questão, agilizando o julgamento.
Devemos ter uma largueza maior nessa interpretação, mas, no caso específico, eu
teria essa dificuldade em função de como está sendo colocada a tese.
Feita essa ressalva, acompanho a
divergência inaugurada pelo Sr. Ministro João Otávio de Noronha, não conhecendo
do recurso especial.
Sr. Presidente, não conheço da
matéria alusiva à capitalização dos juros e também em relação à comissão de
permanência, pelos motivos já declinados – inclusive em um deles já antecipamos
esse não-conhecimento.
Em
relação aos juros remuneratórios, acompanho em parte a eminente Ministra
Relatora no sentido de entender que não há a limitação de juros.
Constitucionalmente, isso foi abolido, e o que se entende é que se considera
abusivo aquilo que for demonstrado como ultrapassando, em muito, a taxa média
de mercado. Essa consideração, realmente, fica a juízo das instâncias
ordinárias e me parece até que, nesse ponto, depois que assim se firmou, vêm os
Tribunais estaduais aplicando, de forma razoável, a orientação do STJ.
Entendo a posição da Sra.
Ministra Nancy Andrighi quando quis estabelecer um teto objetivo para aferição
da abusividade poder, pelo menos, aliviar as instâncias superiores. Muito
embora vendo a praticidade da proposta, penso que as instâncias ordinárias é
que devem avaliar, mesmo porque – o Sr. Ministro João Otávio de Noronha
destacou, e é fato – isso depende de uma série de fatores, inclusive do risco
jurídico de cada região e suas peculiaridades.
Em relação à mora, estou com
a Sra. Ministra Relatora porque, como no caso deu-se uma interpretação de que
não havia sido pactuada capitalização, e essa matéria ficou vencida porque não
conhecemos do especial nessa parte, não houve a mora, consequentemente.
Quanto à inscrição do devedor no
Cadastro de Proteção ao Crédito,
acompanho a Sra. Ministra Nancy
Andrighi, que fez um pormenorizado levantamento da nossa jurisprudência. Faço a
ressalva quanto às disposições de ofício porque, efetivamente, entendo que não
é uma questão de formalismo: a ação segue conforme a prestação jurisdicional
que é solicitada; dizer que o contrato é abusivo, data venia, não dá direito a que o juiz saia lendo o contrato e
fazendo uma interpretação subjetiva do que ele pensa ser ou não abusivo. E o
grau de subjetivismo, hoje, é extraordinário. Esse é um grande problema. Por
mais boa-vontade que se possa ter na tese, muitos advogados, conscientes de que
aquela pretensão não tem amparo legal, nem a põe na inicial porque sabem que
aquilo não irá longe, mas o Tribunal ou, às vezes, o juiz, vão além, em defesa
de teses já ultrapassadas no STF e STJ, e aí cria-se um contencioso que nem foi
pretensão da parte autora.
Então, realmente, penso que a estrita observância ao pedido inicial,
nesse
ponto, há de preponderar.
Em relação às questões do
processo repetitivo, da afetação, estou, em suma, acompanhando a eminente
Relatora, salvo na sugestão de se considerar como abusivo apenas a partir do
dobro da taxa média de mercado e em relação ao conhecimento, de ofício, de
cláusula contratual, que entendo não ser possível.
Em relação ao restante, estou de
acordo com a eminente Relatora.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO
O
EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:
Sr. Presidente, não conheço do
recurso especial.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
RELATORA |
: MINISTRA NANCY ANDRIGHI |
RECORRENTE |
: UNIBANCO UNIÃO DE
BANCOS BRASILEIROS S/A |
ADVOGADOS |
: MARIANE CARDOSO
MACAREVICH E OUTRO(S) LUCIANO CORRÊA GOMES |
RECORRIDO |
: ROSEMARI DOS
SANTOS SANCHES |
ADVOGADO |
: MAURO TRÁPAGA
TEIXEIRA |
VOTO-VISTA
O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO:
1. Relatório
A autora propôs ação revisional em face de
Unibanco – União Brasileira de Bancos S/A, pedindo: a) antecipação da tutela, a
fim de evitar que seu nome seja inscrito em cadastro de inadimplentes, bem como
para ficar em posse do bem objeto do financiamento até o encerramento da
discussão judicial; b) depósito em juízo do valor incontroverso; c)
apresentação do contrato pela empresa ré; d) fixação de juros em 12%; e)
exclusão da capitalização; f) aplicação do Código de Defesa do Consumidor; e g)
declaração de nulidade de encargos contratuais considerados abusivos. Cuida-se
de contrato bancário, garantido por alienação fiduciária, no qual a autora,
Rosemari dos Santos Sanches, obteve financiamento para a aquisição de motocicleta
Honda CG 150, com pagamento de uma entrada e parcelamento do saldo remanescente
(R$ 4.980,00) em 36 (trinta e seis) prestações no valor, cada uma, de R$ 249,48
(duzentos e quarenta e nove reais e quarenta e oito centavos).
A antecipação de tutela foi deferida à fl. 17,
no sentido de manter a posse do veículo, uma vez depositados os valores
incontroversos, assim como para impedir a negativação de seu nome nos cadastros
de proteção ao crédito.
A sentença (fls. 61-63) julgou procedente o
pedido, reduzindo os juros remuneratórios para 1% ao mês, substituindo a
comissão de permanência pelo IGPM e determinando a capitalização anual de
juros. Estabeleceu que os demais encargos do contrato devem ser mantidos,
inexistindo abusividade. Condenou o réu ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios, arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais).
Por sua vez, o acórdão recorrido negou
provimento ao apelo da instituição financeira, afastando, de ofício,
disposições contratuais, nos seguintes termos (fls. 114-133):
AÇÃO REVISIONAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. APLICAÇÃO DO CDC. JUROS REMUNERATÓRIOS.
CAPITALIZAÇÃO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. ENCARGOS MORATÓRIOS. COMPENSAÇÃO E / OU
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CLÁUSULA DE EMISSÃO DE TÍTULO DE CRÉDITO. TARIFA DE
ABERTURA DE CRÉDITO. EMISSÃO DE BOLETO BANCÁRIO. CADASTRO DE RESTRIÇÃO AO
CRÉDITO. PROTESTO DE TÍTULO. MANUTENÇÃO NA POSSE DO BEM. AUTORIZAÇÃO PARA
DEPÓSITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. APLICAÇÃO DO CDC. O Código de Defesa do
Consumidor implementou uma nova ordem jurídica, viabilizando a revisão
contratual e a declaração de nulidade absoluta das cláusulas abusivas, o que
pode ser feito inclusive de ofício pelo Poder Judiciário.
2. JUROS REMUNERATÓRIOS. É nula a taxa de juros
remuneratórios em percentual superior a 12% ao ano porque acarreta excessiva
onerosidade ao devedor em desproporção à vantagem obtida pela instituição
credora, por aplicação do art. 51, IV, do CDC.
3. CAPITALIZAÇÃO. A capitalização dos juros é vedada em contratos da espécie, por
ausência de permissão legal, ainda que expressamente convencionado.
4. ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. CABIMENTO.
Adoção do IGP-M para atualização do valor da moeda. Disposição de ofício.
5. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. É vedada a comissão de permanência por
cumulada com juros remuneratórios e correção monetária.
6. ENCARGOS MORATÓRIOS
6.1.
Juros moratórios.
Contemplados no contrato em 1% ao mês e mantidos, vedada a cumulação com juros
remuneratórios e multa.
6.2.
Multa Contratual.
Contemplada no contrato à taxa de 2% e mantida. Deve incidir sobre a parcela
efetivamente em atraso e não sobre a totalidade do débito.
6.3.
Mora do Devedor.
Por ter sido elidida a mora debendi, não
há exigir os encargos moratórios. Esses são exigíveis tão-só quando constituído
em mora o devedor. Disposição de ofício.
7. COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Após a
compensação, e na eventualidade de sobejar saldo em seu favor do devedor, é
admitida a repetição simples, afastada a previsão contida no parágrafo único do
art. 42 do CDC. Disposição de ofício.
8. CLÁUSULA DE EMISSÃO DE TÍTULO DE CRÉDITO. A
cláusula que prevê emissão de título de crédito configura nulidade pela
abusividade que ostenta ou pela excessiva outorga de poderes conferida ao credor
ou pelo excesso de garantia. Disposição de ofício.
9. TARIFA DE EMISSÃO DE BOLETO BANCÁRIO. A emissão
de qualquer carnê ou boleto para pagamento é obrigação do credor não devendo
ensejar ônus algum ao devedor, já que os arts. 319 do Código Civil/2002 e art.
939 do Código Civil/1916, não trazem no seu bojo a condição de pagamento em
dinheiro para ele receber o que lhe é de direito. Disposição de ofício.
10.
TAXA DE ABERTURA
DE CRÉDITO. Além de atender interesse exclusivo do mutuante, essa cláusula
contratual contraria o disposto no art. 46, parte final, do Código de Defesa do
Consumidor, pois não fornece ao mutuário todas as informações sobre sua
finalidade e alcance. Disposição de ofício.
11.
CADASTRO DE
CRÉDITO. INSCRIÇÃO NEGATIVA. Discussão da dívida que revela probabilidade,
ainda que mínima, de sucesso do devedor. Inveracidade de dados e
constrangimento desnecessário vedados no CDC. 12. PROTESTO DO TÍTULO. Na medida
em que o devedor possui argumentos que fragilizam o negócio subjacente, podendo
ser excluídos juros e taxas consideradas abusivas, o protesto revela-se ato
temerário e que somente virá em prejuízo do devedor, sem qualquer repercussão
jurídica de monta para o credor.
13.
MANUTENÇÃO DE
POSSE. É de ser mantido o devedor na posse do bem alienado fiduciariamente
enquanto pendente pleito revisional.
14.
AUTORIZAÇÃO DE
DEPÓSITOS. É possível a autorização para depósito de valores que o autor
entende devidos, enquanto pende de julgamento ação revisional de cláusulas
contratuais.
15.
HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. Redimensionados. Disposição de ofício.
APELO DESPROVIDO, COM DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO.
Sobreveio recurso especial da ré (fls. 137-151),
fundamentado nas alíneas "a" e "c" do permissivo
constitucional, reclamando, em síntese: a) caracterização da mora da devedora e
a conseqüente imposição de encargos moratórios; b) ofensa ao princípio da
boa-fé objetiva; c) impossibilidade do julgamento de ofício; d) não limitação
dos juros remuneratórios; e) possibilidade da capitalização mensal de juros; f)
validade da cobrança de comissão de permanência; g) descabimento da repetição
de indébito; h) seu direito à negativação do nome da devedora; i) equívoco na
manutenção da ré na posse do bem; j) validade da cambial emitida (“cláusula
mandato”).
A instituição financeira interpôs, igualmente,
recurso extraordinário, que teve
seu seguimento negado na origem ante a ausência
da preliminar de repercussão geral (fls. 201-203).
Admitido o recurso especial, os autos ascenderam
a esta Egrégia Corte Superior, sendo afetado a julgamento à Segunda Seção,
segundo a sistemática do art 543-C do CPC, por despacho do Relator Ministro Ari
Pargendler (fls. 224), que identificou, em processos repetidos, as seguintes
questões de direito: a) juros remuneratórios; b) capitalização de juros; c)
mora; d) comissão de permanência; e) inscrição do nome do devedor em cadastros
de proteção ao crédito; f) disposições de ofício.
O feito foi redistribuído à Relatoria da
Ministra Nancy Andrighi (fl. 565).
2. Voto da Min. Relatora:
Em extraordinário e denso trabalho, a culta
Ministra Relatora proferiu
bem-fundamentado voto, estabelecendo as
seguintes teses:
a)
Afastamento da
mora quando constatada a cobrança abusiva de qualquer
dos encargos da normalidade; mantida sua
caracterização quando verificada a simples propositura de ação revisional ou a
cobrança de encargos moratórios abusivos.
b)
Autorização da
cobrança de juros moratórios até o limite de 1% ao mês.
c)
Concessão de
liminar para impedir a inscrição do devedor em cadastro de
inadimplentes quando reunidos os seguintes
requisitos: “a) houver ação fundada na existência integral ou parcial do
débito; b) ficar efetivamente demonstrado que a alegação de cobrança indevida
se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF e
STJ; c ) for depositada a parcela incontroversa, ou prestada a caução fixada
conforme o prudente arbítrio do juiz”.
d)
Não
reconhecimento da abusividade das taxa de juros que não ultrapassem
o dobro da taxa média de mercado, conforme
apurada pelo Banco Central;
e) Possibilidade de as instâncias ordinárias
afastarem de ofício cláusulas
abusivas, nos termos do art. 51, do CDC.
Até o momento, além da Ministra Nancy Andrighi,
votaram os Ministros João Otávio de Noronha e Sidnei Beneti, aquele, divergindo
do entendimento da Relatora quanto ao estabelecimento de critérios fixos para a
aferição de abusividade da taxa de juros remuneratórios e quanto à
possibilidade de análise de ofício dos encargos contratados pelo consumidor;
este, apenas quanto ao segundo ponto.
Tendo pedido vista dos autos na sessão do dia
08.10.2008, profiro meu voto.
3. Aspectos
processuais – extensão horizontal e vertical do julgamento: 3.1. Por primeiro, cumpre bem delimitar a
extensão do julgamento que ora se procede, com a nova sistemática introduzida
pelo art. 543-C do CPC (Lei 11.672/08), seja em relação ao processo entre as
partes recorrente e recorrida, seja no tocante aos efeitos externos do acórdão,
atingindo os inúmeros outros recursos com “fundamento em idêntica questão de
direito”, de modo a ser afastada qualquer dúvida quanto aos efeitos do acórdão
que ora se constitui, resguardando a segurança jurídica e judicial.
É que a
inclusão do art. 543-C no Código de Processo Civil, cujo processamento foi
regulado pela Resolução n. 8/2008 do Superior Tribunal de Justiça, permitirá a
objetivação no julgamento dos recursos especiais, com a análise, em abstrato,
de questões reiteradamente conduzidas à apreciação desta Corte, assentando seu
entendimento e orientando a atuação das instâncias ordinárias.
Contudo, em decorrência do potencial impacto das
decisões proferidas em
recurso repetitivo a milhares de relações
jurídicas intersubjetivas, faz-se necessário delimitar com exatidão, em cada
caso, a extensão da controvérsia sujeita à disciplina do art. 543-C, CPC,
afastando as questões não conhecidas no especial e aquelas não afetadas ao
exame da Seção.
Esse problema foi habilmente suscitado pelo parecer
ministerial, que consignou (fls. 982-983):
“Dito de outro modo, a principal atividade a ser
desempenhada no julgamento de recursos que apresentem esses contornos
peculiares relaciona-se com o fato de que o Superior Tribunal de Justiça
delimite, de maneira estrita, o objeto da questão jurídica a ser debatida, até
mesmo para que se procure diferenciar situações fático-jurídicas para
ulteriores casos aparentemente semelhantes.
Com estas considerações, almeja-se destacar que,
para fins de aplicação do art. 543-C do CPC, é de grande importância
operacional a definição da estrita delimitação da controvérsia no âmbito do
julgamento de recurso especial, até mesmo para, após o julgamento da Corte, ser
possível identificar, exatamente, quais recursos especiais 'terão seguimento
denegado' ou 'serão novamente examinados pelo tribunal de origem'.”
Como se sabe, a Lei 11.672/08 não criou propriamente
um requisito específico de admissibilidade do recurso especial – e nesse ponto
se distancia do instituto da “repercussão geral” para o recurso extraordinário
(art. 102, § 3º, da CF e art. 543-A do CPC) -, mas tratou apenas do
processamento a ser observado quando interposto determinado recurso especial na
situação particular de ser um entre tantas causas repetitivas.
Em outras palavras, valendo-me de uma estrutura
pouco mais esquemática, ao examinar o recurso especial em que o relator
percebe: a) multiplicidade de recursos; b) com fundamento em idêntica questão
de direito, procederá:
1º) exame dos requisitos (pressupostos)
genéricos do recurso nobre;
2º) exame dos requisitos (pressupostos)
específicos;
3º) afetação à Seção das questões de direito que
serão julgadas, de modo a se
conferir ao acórdão os efeitos do art. 543-C, §
7º, CPC;
4º) expedirá ordem para suspensão de todos os
demais recursos repetidos;
5º) procederá, na seqüência, conforme dispõe o
art. 543-C, §§ 3º a 6º, CPC.
3.2. Parece interessante, nesse passo,
estabelecer corretamente a(s) questão(ões) de direito do caso concreto ora em
exame, na medida em que estas é que estão relacionadas à matéria de fundo do
recurso especial, ou seja, ao mérito de questão.
Esse é o elemento identificador da controvérsia,
que irá determinar a existência ou não de multiplicidade de recursos acerca do
tema.
A ausência de qualquer dos pressupostos de
admissibilidade do recurso
especial impõe óbice intransponível à apreciação
do mérito, de maneira que, em relação aos temas não conhecidos, não se há falar
nos efeitos “externos” do recurso (§ 7º do art. 543-C, CPC).
Ademais, a análise dos pressupostos de
admissibilidade do recurso especial não é realizada em abstrato, mas
singularmente, no caso concreto, contrariando a lógica de objetivação imposta
pelo art. 543-C.
Por oportuno, transcrevo lição de Teresa Arruda
Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina extraída da Revista de Processo n.
159:
“Assim, por exemplo, em relação ao sobrestamento
de recursos extraordinários, o § 2.º do art. 543-C estabelece que, decidindo o
STF no sentido da inexistência de repercussão geral, os recursos cuja
tramitação ficou suspensa, 'considerar-se-ão automaticamente não admitidos”.
Vê-se que a decisão do STF tem caráter
absolutamente vinculante, quanto à inadmissibilidade do recurso em razão da
ausência de repercussão geral. Deverá o órgão a quo, portanto, ater-se ao que tiver deliberado o STF, a respeito.
O mesmo, porém, não ocorre em relação aos recursos especiais: o não
conhecimento dos recursos especiais selecionados não importará,
necessariamente, na inadmissibilidade dos recursos especiais sobrestados.”
No mesmo ponto, extrai-se das notas de rodapé:
“4. A solução prevista no § 7.º do art. 543-C
refere-se, a nosso ver, apenas e tão-somente ao julgamento do mérito do recurso
especial, e não à sua inadmissibilidade.”
(Wambier, Teresa Arruda Alvim e Medina, José
Miguel Garcia. “Sobre o novo art. 543-C do CPC: sobrestamento de recurso
especiais 'com fundamento em idêntica questão de direito' in “Revista de Processo. ano 33. n. 159. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008. p. 216-217)
No caso em apreço, não se está conhecendo do
recurso especial nos seguintes pontos:
a)
capitalização de
juros, pois o acórdão está amparado somente em fundamento constitucional para
afastá-la, escapando da competência desta Corte;
b)
comissão de
permanência, uma vez que o recorrente não especifica qualquer dispositivo legal
tido por violado ou realiza o necessário cotejo analítico com o precedente
paradigma.
c)
manutenção de
posse do devedor em relação ao bem, pois os dispositivos tidos por violados não
foram apreciados pela Corte local. Aplica-se, portanto, a Súmula 282/STF.
d)
“análise da
cláusula mandato”, uma vez que a matéria suscitada não foi devidamente
prequestionada, esbarrando no óbice da Súmula 282/STF. Ademais, o recorrente
não empreendeu o necessário cotejo analítico dos precedentes transcritos, sendo
impossível a constatação da similitude fática perante os acórdãos paradigmas.
Dessa forma, essas matérias estão expressamente
excluídas dos efeitos determinados pelo § 7.º do art. 543-C.
Bem por isso, também prejudicadas as questões de
ordem suscitada pelo Ministério Público e a prejudicial alteada no voto do
eminente Ministro João Otávio Noronha, no que se refere aos aspectos relativos
à capitalização de juros.
3.3 Outro ponto que merece destaque diz respeito
à abrangência do acórdão proferido em recursos repetitivos, especificamente, no
caso vertente, no que se refere aos juros remuneratórios não pactuados.
No caso em análise, houve previsão expressa da
incidência de juros remuneratórios ao contrato bancário, por meio de cláusula
declarada nula pelo acórdão recorrido. Por sua vez, o recurso especial da
instituição bancária versa acerca da impossibilidade de limitação dos juros
legalmente pactuados.
Assim, para que não haja qualquer dúvida a
respeito do ponto, esclareça-se que a discussão não abrange os juros não
pactuados.
Se, por um lado, é necessário fixar, em
abstrato, a tese jurídica que orientará a atuação dos Tribunais locais quanto
aos recursos sobrestados; por outro, não se pode olvidar que estamos diante de
um caso concreto, que exige, nos termos da Súmula 456/STF e do art. 257 do
RISTJ, a aplicação do direito à espécie:
“Art. 257. No julgamento do recurso especial,
verificar-se-á, preliminarmente, se o recurso é cabível. Decidida a preliminar
pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a
causa, aplicando o direito à espécie.”
Dessa forma, qualquer manifestação desta Corte
acerca da taxa de juros aplicável quando inexiste pactuação expressa, conquanto
válida para fundamentar a decisão, não poderá integrar a tese jurídica a que se
pretende atribuir efeito extensivo, nos termos do § 7.º do art. 543-C.
3.4. De outra parte, deve-se tratar ainda das
demais matérias constantes do recurso especial de fls. 137-151 e que não foram
afetadas ao procedimento dos recursos repetitivo, no caso, a afirmada validade
da cláusula mandato e a impossibilidade da manutenção da devedora na posse da
motocicleta.
Em tese, é competência da Turma a apreciação de
pontos que não foram afetados pelo Ministro Relator, ou seja, sobre os quais
não repousa multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de
direito. Contudo, vislumbram-se as dificuldades práticas do julgamento
fragmentado do recurso, com parte sendo apreciado pela Seção e o restante pela
Turma originária.
Por todas, acredito que o recurso deva ser
julgado em sua totalidade pela Seção, nos termos do art. 34, XII, do RISTJ,
porquanto não haverá prejuízo ao recorrente em ver sua controvérsia apreciada
pelo colegiado maior.
“Art. 34. São atribuições do relator:
(...)
XII – Propor à Seção ou à Turma seja o processo
submetido à Corte Especial ou à Seção, conforme o caso.”
Entretanto, ainda que esta Segunda Seção decida
pelo conhecimento do recurso nesses pontos, tais matérias devem ser destacadas
dos efeitos do § 7.º do art. 543-C, visto que não foram afetadas a julgamento
conforme disciplina dos recursos repetitivos.
São as seguintes as matérias que não foram
conhecidas, nem afetadas e tampouco analisadas no voto da eminente Relatora: a)
manutenção do devedor na posse; b) “análise da cláusula mandato”.
4. Mérito
(teses consolidadas, com os efeitos do §7º do art. 543-C, do
CPC)
4.1. Caracterização
da mora do devedor e cadastros de inadimplência
Quanto à descaracterização da mora do devedor e
a possibilidade de sua
inscrição em cadastros de inadimplência
acompanho o voto da Ministra Relatora, o qual traduz o entendimento precedente
desta Segunda Seção (ERESP 163.884/RS, 2ª Seção, Rel. Min. Barros Monteiro,
Rel. p/ Acórdão Min. Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 23.05.2001; RESP
607.961/RJ, 2ª Seção, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado de 09.03.2005; RESP
527618/RS, 2ª Seção, Rel. Min. César Asfor Rocha, julgado em 22.11.2003).
4.2. Juros
moratórios
Em conformidade com a jurisprudência da Segunda
Seção, que já decidiu que
os juros moratórios podem ser pactuados até o
limite de 12% ao ano, conforme previsto na Lei de Usura (REsp 402.483/RS, 2ª
Seção, Rel. Min. Castro Filho, julgado em 26.03.2003), acompanho o voto da
Ministra Relatora.
4.3. Juros
remuneratórios
A jurisprudência desta Corte está pacificada no
sentido de que os juros
remuneratórios cobrados pelas instituições
financeiras não sofrem a limitação imposta pelo Decreto nº 22.626/33 (Lei de
Usura), conforme o disposto na Súmula 596/STF.
Contudo, uma vez demonstrado que a pactuação dos
juros remuneratórios é evidentemente abusiva, o Poder Judiciário tem o dever de
exercer o controle da taxa contratada, como explicitado no voto da eminente
Ministra Relatora.
Todavia, ouso divergir em relação aos critérios
para a aferição da abusividade da taxa de juros remuneratórios.
No julgamento dos Embargos Declaratórios na ADI
2.591-1/DF, os Ministros do Supremo Tribunal Federal deram provimento, por
unanimidade, aos embargos opostos pelo Procurador Geral da República para
reduzir a ementa referente ao julgamento da ADIN. O Relator, Ministro Eros
Grau, esclareceu o alcance da decisão prolatada em relação à taxa de juros
remuneratórios:
“A ementa efetivamente é explícita ao afirmar
que incumbe ao Conselho Monetário Nacional a definição do custo das operações
ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições
financeiras na exploração da intermediação do dinheiro na economia, providência
essencial à formulação das políticas monetária e de crédito do Estado, cuja
racional elaboração é essencial à efetividade da soberania nacional. Atribuir a
órgãos de defesa do consumidor e/ou mesmo ao Poder Judiciário essa definição seria
insensato, colocaria em risco a continuidade da atividade estatal.
Isso não significa, contudo, que o Poder
Judiciário não fiscalize, que o Poder
Judiciário não controle e opere a revisão, caso
a caso, de eventual abusividade,
onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual das taxas de juros. Isso diz a ementa.
Diz que o poder Judiciário operará o
controle e a revisão, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na
composição contratual da taxa de juros.
Estamos seguramente de acordo quanto a este ponto. Não há, nele, contradição nenhuma a ser superada, nem há omissão qualquer a
ser colmatada. De resto, é inadmissível o
rejulgamento da matéria nesta sede, que é isso o que se pretende mediante o
oferecimento dos presentes embargos.”
Portanto, em face da decisão do Supremo Tribunal
Federal, a qual estamos
estritamente vinculados, conforme o art. 102, §
2º, da CF, a abusividade dos juros remuneratórios pactuados deve ser analisada
caso a caso, não cabendo estabelecer critérios estritos de aferição.
Cumpre ressaltar que o efeito vinculativo
decorrente da improcedência da ADI 2.591-1/DF não se limita à parte
dispositiva, mas se estende aos fundamentos da decisão. Corrobora esse
entendimento lição do Ministro Gilmar Mendes:
(...) resta evidente que o efeito vinculante da
decisão não está restrito à parte dispositiva, mas abrange também os próprios
fundamentos determinantes.
Como se vê, com o efeito vinculante pretendeu-se
conferir eficácia adicional à decisão do STF, outorgando-lhe amplitude
transcendente ao caso concreto. Os órgão estatais abrangidos pelo efeito
vinculante devem observar, pois, não apenas o conteúdo da parte dispositiva da
decisão, mas a norma abstrata que dela se extrai, isto é, que determinado tipo
de situação, conduta ou regulação – e não apenas aquela objeto de
pronunciamento jurisdicional – é constitucional ou inconstitucional e deve, por
isso, ser preservada ou eliminada.
(MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso
de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 1222)
Logo, não cabe ao Superior Tribunal de Justiça
tarifar os juros remuneratórios
para demonstrar sua excessividade quando o
Supremo Tribunal Federal já afirmou que a questão deve ser analisada caso a
caso.
Acompanho o voto da Ministra Relatora quanto aos
demais pontos referentes
aos juros remuneratórios pactuados, quais sejam:
a)
não sujeição das
instituições financeiras à limitação dos juros remuneratórios conforme
estipulado no Decreto 22.626/33;
b)
inexistência de
abusividade pela simples estipulação de juros remuneratórios superiores à 12%
ao ano;
c)
impossibilidade
de utilização da SELIC como parâmetro de limitação de juros remuneratórios.
4.4. Disposições de ofício
Apesar de a relação jurídica existente entre o
contratante e a instituição
financeira ser disciplinada pelo Código de
Defesa do Consumidor, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça entende
que o julgamento realizado de ofício pelo Tribunal de origem ofende o princípio
tantum devolutum quantum appellatum,
previsto no artigo 515 do CPC, conforme manifestado pelo Min. Cesar Asfor
Rocha, em 08.06.2005, no julgamento do Resp 541.153/RS: "não se
tratando de questões relacionadas às condições da ação, as matérias que não
foram objeto da apelação não podem ser examinadas pelo tribunal".
A questão foi reapreciada por ocasião do EREsp
702.524/RS, julgado em 08.03.2006, sendo assentado o entendimento acima
referido por maioria de votos.
Diante da modificação substancial na composição
da Segunda Seção, a Ministra Relatora propõe a rediscussão da matéria para
admitir a revisão de ofício, tendo em vista o caráter de norma de ordem pública
do CDC e a disciplina do art. 51 do CDC c/c ao art. 168, parágrafo único, do
Código Civil.
Embora consciente do fundamental papel do
Superior Tribunal de Justiça de
guardião da unidade do Direito Federal, assim
também o de uniformizar a jurisprudência
infraconstitucional, com as inúmeras consequências daí decorrentes, mas força é
convir que decisões consolidadas da Corte não se constituem jurisprudência
imutável do Tribunal.
É bem verdade que o STJ, ao longo de sua
história, consolidou-se como o Tribunal da Cidadania, com uma jurisprudência
sólida que não pertence a um ou alguns Ministros, mas obra coletiva que orgulha
o povo brasileiro.
Contudo, malgrado a observação de que a
jurisprudência firmada deve ser
perene em resguardo à segurança jurídica, num ou
noutro ponto, com fundamentos diferentes, é possível avançar.
De modo a se tentar a evolução da jurisprudência
sem os inconvenientes das “guinadas bruscas”, com seguidos avanços e
retrocessos, parece que, no tema, a boa medida do equilíbrio apresenta-se, no
meu modo de ver, mais acertada. Refiro-me à possibilidade de reconhecimento das
disposições de ofício, quando presente a hipossuficiência do
consumidor/contratante.
É, na verdade, uma interpretação sistêmica e
convergente dos artigos 51 e art. 4°, I, 6°, IV, e 39, IV, CDC.
Anteriormente à consolidação do atual
entendimento desta Segunda Seção,
ambas as Turmas decidiam pela possibilidade da
análise de ofício de cláusulas abusivas em contratos de consumo, conforme
abaixo transcrito:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CAPITALIZAÇÃO
MENSAL DOS JUROS. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. MEDIDA PROVISÓRIA
2.170-36/2001. NÃO INCIDÊNCIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LIMITE MÁXIMO. TAXA DE
JUROS DO CONTRATO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. REVISÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE.
1. A Segunda Seção desta Corte entende cabível a
capitalização dos juros em periodicidade mensal, para os contratos celebrados a
partir de 31 de março de 2000 - data da primitiva publicação do art. 5º da MP
1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2001 -, desde que pactuada,
requisito in casu inexistente, obstando, pois, o seu deferimento.
2. A limitação máxima da comissão de permanência à
taxa de juros remuneratórios do próprio contrato não enseja nenhuma ilegalidade
ou irregularidade, estando, aliás, em consonância com o leading case sobre o
assunto (Resp 271.214/RS), em que foi pacificada pela Segunda Seção.
3. O STJ tem preconizado a possibilidade de rever,
de ofício, cláusulas contratuais consideradas abusivas, para anulá-las, com
base no art. 51, IV do CDC. Nesse sentido: RESP 248.155/SP, in DJ de 07.08.2000
e RESP 503.831/RS, in DJ de 05.06.2003.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 655.443/RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em
05/04/2005, DJ 02/05/2005 p. 372)
AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO.
EXAME DE OFÍCIO. ART. 51, IV, CDC. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LIMITAÇÃO AO PACTO.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO DO VALOR EM FASE DE LIQUIDAÇÃO. REFORMATIO IN
PEJUS. IMPOSSIBILIDADE.
- A jurisprudência permite afastar, de ofício, as
cláusulas abusivas com base no Art. 51, IV, do CDC, questão de ordem pública.
- É lícito a cobrança de comissão de permanência
no período da inadimplência, desde que não cumulada com a correção monetária
(Súmula 30), nem com juros remuneratórios, calculada pela taxa média de
mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato
(Súmulas 294 e 296).
- A redistribuição da verba honorária reserva-se à
liquidação da sentença, limitada a condenação ao quantum fixado pelo acórdão
recorrido, em atenção ao princípio da reformatio in pejus.
(AgRg no REsp 645.902/RS, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARR'OS, TERCEIRA TURMA,
julgado em 28/09/2004, DJ 17/12/2004 p. 542, REPDJ 01/02/2005 p. 556)
Embora não se possa generalizar, o fato é que o
reconhecimento da abusividade de ofício, em casos extremos, é indispensável, ou
seja, quando reconhecida a hipossuficiência do consumidor.
O Ministro Antônio Herman Benjamin, em seu
Manual de Direito do
Consumidor, explica o conceito de
hipossuficiência disposto no art. 39, IV do CDC:
“O consumidor é, reconhecidamente, um ser
vulnerável de consumo (art. 4°, I). Só que, entre todos os que são vulneráveis,
há outros cuja vulnerabilidade é superior a média. São os consumidores
ignorantes e de pouco conhecimento, de idade pequena ou avançada, de saúde
frágil, bem como aqueles cuja posição social não lhes permite avaliar com
adequação o produto ou serviço que estão adquirindo. Em resumo: são os
consumidores hipossuficientes. Protege-se, com esse dispositivo, por meio de
tratamento mais rígido que o padrão, o consentimento pleno e adequado do
consumidor hipossuficiente.
A vulnerabilidade é um traço universal de todos
os consumidores, ricos ou pobres, educados ou ignorantes, crédulos ou espertos.
Já a hipossuficiência é marca pessoal, limitada a alguns – até mesmo a uma
coletividade -, mas nunca a todos os consumidores.
A utilização, pelo fornecedor, de técnicas
mercadológicas que se aproveitam da hipossuficiência do consumidor caracteriza
a abusividade da prática.
A vulnerabilidade do consumidor justifica a
existência do Código. A hipossuficiência, por seu turno, legitima alguns
tratamentos diferenciados no interior do próprio Código, como, por exemplo, a
previsão de inversão do ônus da prova (art. 6°, VIII).
(BENJAMIN, Antônio Herman; MARQUES, Cláudia
Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 220)
Logo, em face da grande desigualdade existente
entre a instituição financeira e o consumidor hipossuficiente, ou seja, o
consumidor que possui uma vulnerabilidade técnica ou econômica ou jurídica,
agravada em razão de suas condições pessoais, deve-se protegê-lo de maneira
mais rígida e ativa.
Portanto, nos casos de existência de cláusulas
nulas de pleno direito, como as exemplificadas no art. 51 do CDC, e em virtude
da posição de vulnerabilidade extremada do consumidor (art. 4, I; art. 6°, IV e
art. 39, IV), entende-se como possível o reconhecimento das nulidades das
cláusulas abusivas.
Destarte, reconheço a possibilidade do juiz de
dispor de ofício, quando diante de cláusulas absolutamente nulas, conforme o
Código de Defesa do Consumidor, desde que o consumidor esteja comprovadamente
em situação de hipossuficiência. Acompanho o voto da Ministra Relatora para
manter o acórdão recorrido, embora por fundamentos diversos.
5.
Manutenção de posse do bem e cláusula mandato
(sem os efeitos do §7°, 543-C, CPC)
As questões referentes à manutenção da posse do
bem objeto da alienação fiduciária (fl. 147) e da cláusula mandato (fl. 148),
conforme anteriormente explicitado, carecem dos pressupostos de admissibilidade
do recurso especial, não devendo ser conhecidas.
6.
Parte Dispositiva
Ante o exposto, acompanho parcialmente o voto da
eminente Ministra Relatora, divergindo em relação aos seguintes pontos:
a) em preliminar, não conheço do recurso especial
em relação à capitalização de juros e à comissão de permanência, restando as
referidas matérias afastadas dos efeitos do § 7° do art. 543-C do CPC;
b) deixo de apreciar a questão relativa aos juros
remuneratórios não pactuados, tendo em vista que a matéria não integra os
limites da lide, estando excluída igualmente dos efeitos do § 7° do art. 543-C
do CPC;
c) não conheço, igualmente, dos pontos relativos à
manutenção da posse do devedor em relação ao bem e à alegada validade da
cláusula mandato, esclarecendo que, ainda que fossem apreciadas por esta Corte,
tais matérias restariam excluídas dos efeitos dos recursos repetitivos, uma vez
que não foram afetadas ao procedimento do art. 543-C do CPC.
d) reconheço a legalidade da fixação de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano, mas divirjo quanto aos critérios de
fixação da abusividade de tal encargo, que deve ser analisada caso a caso;
e) mantenho o acórdão no tocante às disposições de
ofício, desde que reconhecida expressamente a hipossuficiência do
consumidor/contratante.
É como voto.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS
(2008/0119992-4)
VOTO-PRELIMINAR
O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS FERNANDO
MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO):
Sr. Presidente, peço
as mais respeitosas vênias àquilo que
designarei de divergência, porque, na
realidade, estão surgindo questões novas, como é esse problema do conhecimento
pela alínea c.
Renovo as respeitosas vênias, desculpem-me a
redundância,
mas tenho a impressão de que o mais
importante é discutir a matéria de fundo.
Pelo que ouvi da eminente Ministra Relatora –
farei as
anotações –, S. Exa. não se retratou, mas trouxe uma nova
ótica, uma nova visão sobre o ponto e está conhecendo do recurso também pela
alínea c. Não vejo nenhum perigo em
avançarmos e discutirmos o que seria, pedindo empréstimo à expressão do Sr.
Ministro Luis Felipe Salomão, a matéria de fundo.
Conheço do recurso especial pela alínea c, reservando-me,
obviamente, quando em tempo oportuno, a
discutir o mérito.
RECURSO ESPECIAL Nº
1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO-MÉRITO
O EXMO. SR. MINISTRO CARLOS FERNANDO
MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO):
Sr. Presidente, como a Sra. Ministra
Relatora teve o cuidado de
mandar farto material, não só cópia dos
votos, como uma síntese didática de todo seu estudo neste processo, lembrei-me
do poeta Manuel Bandeira, que, diante do verso "Tu pisavas nos astros,
distraída", dizia que se ralava de inveja de não ser o autor daqueles
versos.
Que magistrado não gostaria de poder proferir
o voto que proferiu a eminente Ministra Fátima Nancy Andrighi, borbulhando a
magistratura brasileira? É um trabalho de escafandro em matéria com tanta
complexidade, em que S. Exa. teve o cuidado, inclusive, de fazer, quando diante
de tão claro relato, um resumo das soluções para o caso concreto e um resumo
das soluções para as teses repetitivas.
Evidentemente que os elogios não ficam só a
ela. Eu, particularmente, adoraria ter os conhecimentos de Direito Bancário,
entre outros, que tem o Sr. Ministro João Otávio de Noronha, com segurança, com
firmeza, com vivência, com saber teórico e com saber de experiência feita.
Quem não gostaria de proferir um voto-vista
como este que
acaba de proferir o eminente Ministro
Luís Felipe Salomão?
Mas todos nós fomos nos debruçar, porque
recebemos esse
farto material: memoriais, adendos, aditivos e cópias de
votos. Aqui, renovo os elogios desnecessários, que nada acrescentam aos méritos
da eminente Relatora, mas o cuidado que ela teve de nos mandar e de discutir
muitos pontos.
Permito-me pedir respeitosas vênias à eminente
Ministra Relatora em um ponto que tenho
dificuldade de transpor. S. Exa., com a objetividade de sempre, lembra, com
relação à revisão de ofício das chamadas cláusulas abusivas, que é a única
remanescente que participou do julgamento dos Embargos de Divergência no
Recurso Especial nº 702.524/RS.
O SR. MINISTRO CARLOS
FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO): Já na sessão anterior,
quando a matéria foi aventada, tive o cuidado de colher tudo o que havia a
respeito, e, agora, acrescento, inclusive, um outro EREsp da lavra do não menos
eminente Ministro Fernando Gonçalves.
Louvo, mais uma vez, S. Exa., porque, se o ser
humano não ousasse, não teria inventado a roda, domesticado o fogo e
conquistado o espaço. É da essência do ser humano estar em mutação. Aliás,
Toynbee dizia que só os desafios constroem a história. A história é feita por
desafios.
Aqui me permitirei, e o farei com todo o
cuidado, inclusive prestando modestíssima homenagem à Professora Cláudia Lima
Marques, que tanto admiro e no que não sou original, porque todos a admiramos,
e também ao grande Mestre que esteve nesta Seção por muito tempo, Ministro Ruy
Rosado de Aguiar, que escreveram, entre outros, sobre cláusulas abusivas. Eu
mesmo rabisquei algumas coisas sobre esse assunto, louvando-me em trabalhos de
S. Exas.
Confesso, no entanto, que tenho enorme
dificuldade em transpor esse fato, porque, mesmo sabendo que estamos vivendo
uma era de desconstrutivismo, portanto, derrubando cânones, vivendo a era dos
direitos de terceira geração, dos direitos de solidariedade, já não podemos
afirmar com tanta tranqüilidade, por exemplo, que o contrato faz lei entre as
partes.
Hoje, é preciso ter coragem de
justificar isso com tanta tranqüilidade. A revolução no Direito das Obrigações,
que foi a maior revolução desde o Código de Napoleão, que é o Direito do
Consumidor. Não gosto da expressão "Direito Consumerista", desses
neologismos, porém, não vamos brigar por
palavras, fazer moinhos de ventos particulares para, quixotescamente, brigar
mais.
Porém, tenho dificuldade. Como fica o problema
do pedido? Aquilo que está no Código de Processo Civil? Como fica o princípio
do tantum devolutum quantum apellatum? São também outros cânones. E o Direito
Pretoriano, que também faz Direito. O Direito Pretoriano, que tanto fascínio
imprimiu a Savigny – aliás, ele dizia que as duas grandes construções, todos
sabem, não legislativas, eram o Direito Pretoriano, Romano e a Common Law, que não são construções
legislativas.
O SR. MINISTRO CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF 1ª
REGIÃO): Então, confesso que não vejo por que
mudarmos uma posição que está sedimentada na Seção. E, agora, vejo que não só
S. Exa. participou, mas também o Sr. Ministro Fernando Gonçalves. Tenho cópia
das ementas dos acórdãos dos Embargos de Divergência no Recurso Especial nº
702.524/RS, que está expressamente citado no voto de S. Exa. Tenho aqui cópia
do acórdão do Recurso Especial nº 541.153/RS e um outro mais recente – estou
enfatizando isso porque o eminente Ministro Luis Felipe Salomão citou um
precedente que está aqui e o eminente Ministro Fernando Gonçalves teria votado
em outro sentido. Mas esse aqui é recentíssimo:
"Viola o
princípio do tantum devolutum quantum apellatum o eferimento de repetição de
indébito, em face do reconhecimento
de abusividade no contrato de financiamento bancário, sem que a parte
interessada tenha manejado o competente recurso de apelação."
O
SR. MINISTRO CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO): Agradeço a V. Exa. pelo esclarecimento
e me penitencio, mas isso em nada altera a minha postura; não por teimosia, mas
por convicção. Esse é o único ponto.
Eu me permitiria, em atenção ao voto do
eminente Ministro Luis Felipe Salomão, dizer que a questão da capitalização dos
juros com relação às soluções para o caso concreto, do resumo didático que S.
Exa., a eminente Ministra Relatora, teve a bondade de nos fazer chegar às mãos,
está no item III:
"Não conhecido; ausência de pactuação;
aplicação das Súmulas 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça."
S. Exa., com relação ao resumo das soluções
para as teses
repetitivas, também enfrenta, mantendo
a jurisprudência atual:
"Nas operações realizadas por
instituições integrantes do sistema financeiro nacional após 31 de março de
2000 admite-se a capitalização mensal de juros, desde que pactuados."
Com essas considerações – e meu voto é bem
aquém de todos tão brilhantes aqui, proferidos –, não vejo como deixar de
acompanhar a eminente Ministra Relatora, que conhece parcialmente do recurso
especial e, nessa parte, dá-lhe provimento, salvo no ponto da revisão, de
ofício, pelas instâncias ordinárias, das chamadas cláusulas abusivas, que são
essas novas conquistas desses novos bem-vindos direitos.
Sr. Presidente, V. Exa. não precisa de elogio
algum, mas quero, também, me permitir um registro da serenidade oriental, da
paciência quase monástica com que V. Exa. está presidindo – nada surpreendente
–, tão bem e de forma tão objetiva, separando um processo tão complexo, em que
temos questões de ordem geral e questões de ordem específicas.
Renovo, mais uma vez, as homenagens à minha
Mestra Cláudia
de Lima Marques. Enfatizo isso, porque
recorro aos seus ensinamentos. Dirá S. Exa. que concordo com ela nos artigos,
porém, no momento que seria mais preciso, mais pragmático, não voto com ela.
O SR. MINISTRO CARLOS
FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO): Sr. Presidente,
permita-me corrigir essa parte em que votei "a vôo de pássaro". Não
estou acompanhando quanto ao dobro das taxas.
O
SR. MINISTRO CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO): Tenho nota aqui que isso já estaria
resolvido, mas se não está –
e, vejo que não foi apenas eu que
pensei assim, o Sr. Ministro Beneti também –, salvo se a eminente Relatora vier a
alterar essa questão do dobro, não haveria divergência alguma. Mas, também com
relação ao dobro dos juros remuneratórios.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO
GONÇALVES:
Sr. Presidente, não tenho a verve, a
eloqüência, nem a criatividade
do Sr. Ministro Carlos Fernando
Mathias. Sou mais objetivo.
Gostaria de estabelecer o que se
está votando em termos de recurso repetitivo.
A meu ver, a mora do devedor e o
cadastro de inadimplência seriam os primeiros temas. No caso, estou
acompanhando o voto da Sra. Ministra Relatora no que diz respeito à
possibilidade de inscrição do devedor remisso no cadastro de inadimplência,
naquelas condições já estabelecidas no leading
case, que é o Recurso Especial nº 527.618/RS, do qual foi Relator o Sr.
Ministro Cesar Asfor Rocha.
A segunda tese diz respeito aos
juros moratórios, que podem ser
pactuados até o limite de 1% ao mês.
Se eu estiver enganado, corrijam-me,
por favor. A questão dos juros remuneratórios, a fixação é de acordo com a taxa
média de mercado estabelecida pelo Banco Central, tendo como limite o que foi
pactuado, quer dizer, o contrato.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.061.530 - RS (2008/0119992-4)
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO
GONÇALVES:
Acompanho.
E a última é a questão da revisão de
ofício das cláusulas chamadas
abusivas.
Efetivamente – e o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão cita um julgado meu, de
2005 –, na minha anterior investidura na Quarta Turma, em que acompanhei aquele
entendimento, mas, agora, recobrando a razão, retifico a posição anterior, não
permitindo a revisão de ofício, mesmo porque não entendo o conceito de
hipossuficiente; é um conceito fugidio, que, em qualquer figurino, se encaixa.
O Sr. Ministro Carlos Fernando
Mathias citou um voto que proferi
no ano de 2007, no qual afirmo que:
"Viola
o princípio do tantum devolutum quantum
apelatum o deferimento de repetição de indébito, em face do reconhecimento
de abusividade no contrato de financiamento bancário, sem que a parte
interessada tenha manejado o competente recurso de apelação."
Esse foi o
entendimento tirado da jurisprudência da Segunda Seção.
Portanto,
meu voto é nesse sentido.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA SEÇÃO
Número Registro: 2008/0119992-4 Números
Origem: 10700002465 70021397559
70023207079 |
REsp 1061530 / RS |
PAUTA: 08/10/2008 |
JULGADO: 22/10/2008 |
Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY
ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. AURÉLIO VIRGÍLIO VEIGA
RIOS
Secretária
Bela. HELENA MARIA ANTUNES DE
OLIVEIRA E SILVA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE |
:
UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S/A |
ADVOGADOS |
: MARIANE CARDOSO MACAREVICH E
OUTRO(S) LUCIANO CORRÊA GOMES |
RECORRIDO |
:
ROSEMARI DOS SANTOS SANCHES |
ADVOGADO |
: MAURO
TRÁPAGA TEIXEIRA |
ASSUNTO:
Civil - Contrato - Revisão
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA
SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
A Seção, por unanimidade, conheceu
em parte do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do
voto da Sra. Ministra Relatora, acompanhada pelos Srs. Ministros João Otávio de
Noronha, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão, Carlos Fernando Mathias, Fernando
Gonçalves e Aldir Passarinho Junior; salvo em relação às disposições de ofício,
vencidos a Ministra Relatora e o Ministro Luis Felipe Salomão, e quanto à
comissão de permanência, vencidos no conhecimento a Ministra Relatora e o
Ministro Carlos Fernando Mathias. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Massami
Uyeda.
Brasília, 22 de outubro de 2008.
HELENA
MARIA ANTUNES DE OLIVEIRA E SILVA
Secretária
2.3.1.) Da
Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao presente caso concreto.
A ação revisional de financiamento de veículo
tem aplicabilidade no direito do consumidor previsto no Código de Defesa do
Consumidor.
Como já dito, o autor é cliente ou usuário do
réu, se consubstanciando em verdadeira
relação de consumo entre as partes, ao utilizar o serviço prestado pela ré,
através de um contrato de adesão de prestação de serviços.
Em outras palavras, a ré enquadra-se no
conceito de fornecedora, pelo que deve ser aplicada à hipótese dos autos, as
regras inseridas no Código de Defesa do Consumidor, conforme estabelece o art.
3º, caput, e §2º, do CDC: Art. 3º: “Fornecedor é toda pessoa física ou
jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação,
construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou
comercialização de produtos ou prestação de serviços. §2º: “Serviço é qualquer
atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as
de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhistas. ”
Em suma, pelo fato da questão aqui discutida
tratar da prestação de um serviço ofertado, não restando dúvida que o Código de
Defesa do Consumidor é aplicável ao caso em discussão.
Diz ainda o art. 2º do CDC que: “Consumidor é
toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza o produto ou serviço como
destinatário final.
Dessa forma, o autor é consumidor e ao réu é
fornecedora do serviço prestado, se consubstanciando em uma relação de consumo,
aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor.
2.3.2.) Da Responsabilidade
Civil Objetiva do réu quanto ao objeto dessa ação.
Considerando que é aplicável o Código de Defesa
do Consumidor nesse caso dos autos, vigora-se a responsabilidade objetiva do
réu
A responsabilidade civil objetiva do fornecedor
de serviço é prevista nos artigos 14, e 20, 22, parágrafo único, 23 e 25, caput
e §1º, do CDC, que diz:
Art. 14, do CDC: “O fornecedor de serviços
responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos
causados aos seus consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços,
bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e
riscos. ”
Art. 20, do CDC: “O fornecedor de serviços
responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes
diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as
indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor
exigir, alternativamente e à sua escolha: I – a ré execução dos serviços, sem
custo adicional e quando cabível; II – a restituição imediata da quantia paga,
monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III – o
abatimento proporcional do preço.”
Art. 22, parágrafo único, do CDC: “Nos casos de
descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão
as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na
forma prevista neste Código. ”
Art. 23, do CDC: “A ignorância do fornecedor
sobre os vícios de qualidade por inadequação dos produtos e serviços não o
exime de responsabilidade. ”
Art. 25, caput e §1º, do CDC: “É vedada a
estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a
obrigação de indenizar prevista nesta e nas Seções anteriores. §1º: Havendo
mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente
pela reparação prevista nesta e nas Seções anteriores. ”
Esses artigos demonstram que tanto no defeito
do serviço como no vício do serviço haverá a imputação da responsabilidade
civil objetiva ao fornecedor de serviço, sendo nula as cláusulas contratuais
que exonerem as suas respectivas responsabilidades.
Além do mais adota-se tanto a teoria do risco
criado como a teoria do risco proveito no tocante a responsabilidade civil
objetiva das rés em questão.
A teoria do risco criado diz que é imputado a
responsabilidade civil objetiva aquele que criou o risco da atividade, e,
portanto, é objetivamente responsável pelos danos causados a terceiro
decorrente pelo risco criado.
A teoria do risco proveito diz que é imputado a
responsabilidade civil objetiva aquele que criou o risco e aufere proveito
econômico em sua atividade normal de trabalho, sendo, portanto, objetivamente
responsável pelos danos causados a terceiro decorrente desse risco criado que
detém proveito econômico nas atividades normais de quem causou o dano.
Essas teorias, decorrem da interpretação do
art. 927, caput, e parágrafo único, do Código Civil, cuja aplicação é
subsidiária ao Código de Defesa do Consumidor. Diz esse artigo:
Art. 927, caput, CC: “Aquele que, por ato
ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a indenizá-lo.
Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem. ”
O réu diariamente presta esse serviço de financiamento
de veículo.
Diante desses fatos, adota-se a
responsabilidade civil objetiva ao réu tanto com base no Código de Defesa do
Consumidor em decorrência do vício ou defeito do serviço, como com base no
Código Civil em decorrência da teoria do risco proveito ou do risco criado.
A responsabilidade civil objetiva a ser
imputada ao réu, decorre da comprovação necessária de três elementos: Conduta
lesiva do réu, dano ao autora e nexo de causalidade entre a conduta lesiva do
réu e o dano material do autor.
Exclui-se da apuração da responsabilidade civil
objetiva a necessidade de configuração de dolo ou culpa.
As únicas hipóteses de exclusão de
responsabilidade civil objetiva ao réu é a comprovação de o dano ter ocorrido
por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros ou força maior.
As provas arroladas aos autos demonstram que
nenhuma das hipóteses excludentes de responsabilidade se encontram, enquanto
que os três elementos da responsabilidade civil objetiva estão perfeitamente
configurados nos autos, quais sejam a conduta lesiva do réu, o dano ao autor e
o nexo de causalidade entre a conduta lesiva da ré e o dano do autor.
Diante disso, requer-se que seja aplicada a
responsabilidade civil objetiva ao réu.
O Dano é os juros extorsivos de mais de 600% ao
ano, quanto ao custo efetivo total. Não sendo um spread bancário razoável.
2.3.3)
Da Aplicação da Teoria da Base Objetiva do Negócio Jurídico nos Contratos de
Consumo e ao presente Contrato de Financiamento de Veículo. O
nosso Código de Defesa do Consumidor, ao revés, consignou de forma expressa
que, se as prestações se tornarem excessivamente onerosas em decorrência de
fatos supervenientes, o julgador deve rever o contrato. Com
efeito, o art. 6º do CDC elencou, exemplificativamente, os direitos básicos
do consumidor e, dentre eles, contemplou, no seu inciso V, o direito à “[...]
modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou
sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente
onerosas”. O
direito à revisão do contrato, foi uma decorrência natural da principiologia
do CDC, marcada pela ênfase na defesa do consumidor, na busca pelo equilíbrio
entre os sujeitos da relação obrigacional e na boa-fé objetiva – o seu
princípio orientador –, conceito aberto e permeável a valores do próprio
sistema e, também, a valores externos ao sistema, o que lhe conferiu
importante papel na concretização da justiça contratual. Chama
a atenção, no referido dispositivo, o fato de que o direito à revisão foi
assegurado pela lei apenas ao consumidor. E não é de se estranhar que seja
assim, já que o objetivo do 34. Sobre
a relevância que o método de estudo de casos teve na Alemanha e sua
contribuição para a interpretação das cláusulas gerais ensina Menke (2004, p.
27). “Outros institutos jurídicos nascidos a partir da criação
jurisprudencial por meio dos grupos de casos seriam o dos direitos e deveres
anexos ao contrato, do exercício abusivo do direito e o da quebra da base do
negócio jurídico. Alfim (sic), Beater reafirma que o trabalho das cláusulas
gerais por meio dos grupos de casos possibilitou uma cooperação entre os
juízes e o legislador, proporcionando uma efetiva divisão de funções que leva
à melhoria das leis. Isso porque, sobre determinadas matérias, não é
necessário que o legislador, de antemão, edite leis com regras exaustivas. Deve,
isso sim, restringir-se ao estabelecimento de padrões mínimos e aguardar pelo
desenvolvimento posterior a ser procedido pelos magistrados, que enfrentam e
percebem as variações valorativas do meio social no seu dia-a-dia”. O
legislador, como ressaltado anteriormente, foi, exatamente, o de promover a
defesa do consumidor. Com o intento de alcançar a igualdade sob o aspecto
material, procurou-se corrigir a desigualdade existente entre os sujeitos da
relação de consumo, mediante a adoção de normas protetivas do consumidor,
parte vulnerável ope legis. Peter
Zima, lembra que, na pós-modernidade, [...] aquele que era considerado o
centro, o “rei” do mercado, perdeu a centralidade, desconstruíram e
manipularam sua vontade (ou desejos), sua liberdade de consumo é mera ilusão,
este consumidor ideal tornou-se mero símbolo, a ser usado como metáfora da
linguagem, no imaginário e no jogo coletivo e paradoxal do mercado de consumo
e de marketing globalizado dos dias de hoje. Com
efeito, os fornecedores, mediante estratégias de produção e circulação e,
sobretudo, mediante agressivas técnicas de marketing, passaram a
controlar os hábitos de consumo dos consumidores, inculcando-lhes
necessidades e desejos artificiais de aquisição de bens e serviços. Vivencia-se,
na conjuntura pós-moderna, uma modificação da estrutura social da sociedade
de consumo. Inverteu-se a posição dos sujeitos no mercado: o consumidor,
antes considerado o rei do mercado, deixou de ditar as regras, que
passaram a ser determinadas e dominadas pelos fornecedores de produtos e
serviços. Em
um estudo sobre a responsabilidade civil das empresas fabricantes de
cigarros, Cruz (2003, p. 72) trata da falsa liberdade do consumidor quanto à
aquisição de alguns produtos, conforme se transcreve a seguir. Nesse
sentido, pontua Nunes Barbosa (2008, p. 66) “[...] o mercado da oferta
parece-nos comandar o da procura em certa medida, uma vez que, sendo detentor
dos meios de comunicação, das informações e de mecanismos cada vez mais modernos
de propaganda e publicidade, faz chegar ao público a idéia da necessidade e
da conveniência da aquisição de produtos e serviços postos à disposição no
mercado de consumo”. Essa questão é, se não a mais relevante no contexto
sociológico da defesa do consumidor, de grande importância, porquanto
acarreta o surgimento de uma massa de ‘consumidores-robôs’, isto é, criados
para consumir, e não propriamente para satisfazer necessidades pessoais, ou
de sua família ou grupo social. É também neste sentido que assume relevância
a informação, especialmente no seu sentido de prática comercial – publicidade
– como criadora de situações desfavoráveis ao consumidor. A importância da
repercussão das técnicas publicitárias no direito tem em vista o seu caráter
persuasivo, que busca entorpecer ou mesmo suprimir a vontade real do
consumidor, que é o elemento nuclear da autonomia privada”. O
Estado brasileiro tem entre seus objetivos o de assegurar que a sociedade
seja livre. Isso significa que, concretamente, no meio social, dentre as
várias ações possíveis, a da pessoa designada como consumidora seja livre. A
consequência disso é que o Estado deverá intervir quer na produção, quer na
distribuição de produtos e serviços, não só para garantir essa liberdade como
para regular aqueles bens que, essenciais às pessoas, elas não possam
adquirir por falta de capacidade de escolha. Explica-se. Primeiramente,
o sentido de liberdade da pessoa consumidora aqui é o de “ação livre”. Essa
ação é livre sempre que a pessoa consegue acionar duas virtudes: querer +
poder. Quando a pessoa quer e pode, diz-se, ela é livre; sua ação é livre. Assim,
a regra básica será a da escolha com possibilidade de aquisição: a pessoa
quer algo, tem dinheiro ou crédito para adquiri-lo, então é livre para
fazê-lo. Contudo,
haverá casos em que, justamente por não poder escolher, a ação da pessoa não
será livre. E nessa hipótese a solução tem que ser outra. Estamos
nos referindo a necessidade. O conceito é clássico: liberdade é o oposto da
necessidade. Nesta não se pode ser livre: ninguém tem ação livre para não
comer, não beber, para voar etc. Aplicado o conceito à realidade social, o
que se tem é o fato de que o objetivo constitucional da construção de uma
sociedade livre significa que sempre que a situação real for de necessidade o
Estado pode e deve intervir para garantir a dignidade humana. Essa
manipulação dos hábitos de consumo soma-se à desigualdade de informações
entre os consumidores, em regra leigos, e os fornecedores, conhecedores das
características, funcionalidades e riscos dos produtos e serviços oferecidos
no mercado. O
atual mercado de consumo, produto das transformações socioeconômicas, por sua
vez resultantes da globalização, da competição, do desenvolvimento do marketing
e da generalização de contratos massificados e dos contratos eletrônicos,
modificou as relações de produção integradas ao sistema industrial. Estejam
ou não capacitados para agir com discernimento no mercado, os consumidores
recebem uma multiplicidade de chamados ao consumo, fomentadores do desejo de
aquisição de bens e serviços, muitas vezes, dispensáveis e supérfluos. Sampaio
Júnior, no artigo A Defesa do Consumidor e o Paternalismo Jurídico,
relata
a conclusão de estudos apresentados nos Estados Unidos sobre o mercado de
consumo, que demonstram como as pessoas reagem frente à oferta de produtos e
serviços: As
pesquisas sobre o comportamento econômico apontam que frequentemente as
pessoas se comportam de uma maneira que os economistas assumem não ser a mais
racional. Portanto, tem-se defendido que as empresas alterem os seus
contratos, tornando-os claros, ou forneçam informações adicionais que
aparentemente seriam irrelevantes. Tais
exigências podem ajudar pessoas que agem de forma irrefletida a tomarem as
melhores decisões, enquanto não teriam nenhum efeito nas pessoas que já
agiriam de forma realmente racional. Em
um contexto como esse, caracterizado por uma marcante desigualdade entre os
sujeitos da relação de consumo, o equilíbrio entre fornecedor e consumidor – um
dos grandes objetivos do CDC – somente poderia ser alcançado mediante a
adoção de medidas destinadas a compensar essa desigualdade, visando a
alcançar a igualdade material. E
foi com esse objetivo – o de tratar desigualmente os desiguais na medida de sua
desigualdade – que a Lei n. 8.078/90 conferiu apenas ao consumidor, sujeito
vulnerável ope legis, o direito à revisão das prestações em razão de
alteração superveniente das circunstâncias que as torne excessivamente
onerosas. Esse é um ponto de grande relevo a ser observado na interpretação e
na aplicação do citado art. 6º, V, segunda parte, do Código de Defesa do
Consumidor. Registre-se,
ademais, que o legislador, no mencionado dispositivo, referiu-se
expressamente apenas à revisão das cláusulas contratuais – e não à extinção
do negócio jurídico –, disposição que se encontra em harmonia com o princípio
da conservação dos contratos, previsto no § 2º do art. 51 da Lei 8.078/90. Art.
51 §2º. A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato,
exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer
ônus excessivo a qualquer das partes. Ressalte-se,
contudo, que, à luz da principiologia do CDC, a conservação não subsistirá se
implicar ônus excessivo ao consumidor. A conservação será adotada se for
possível restabelecer a relação de equivalência entre prestação e
contraprestação. Afinal,
a análise sistemática e teleológica do Código de Defesa do Consumidor revela
que o objetivo da lei é, em suma, a busca do equilíbrio entre os sujeitos da
relação de consumo, como forma de concretização da justiça contratual. Não
é difícil concluir, portanto, que a manutenção do vínculo contratual somente
será levada a efeito se for possível o restabelecimento da equivalência entre
as prestações. A
busca da equivalência das prestações – que, na concepção aristotélica, se
identificava com a própria ideia de justiça – exsurge, portanto, como um
outro ponto relevante para a compreensão da regra do art. 6º, V, segunda
parte, do CDC. E,
nesse contexto, a Teoria da Base do Negócio Jurídico, de Karl Larenz,
mostra-se, em cotejo com as demais teorias revisionistas, a mais adequada
para a correta aplicação do citado dispositivo. Afinal,
sob o prisma da referida teoria, não se exige que a alteração das
circunstâncias seja imprevisível, nem que a excessiva onerosidade advinda
para um contratante acarrete, na mesma medida, uma vantagem excessiva para o
outro. Tal construção teórica se concentra, em suma, na destruição da base do
negócio e na necessidade de seu restabelecimento, o que atende à busca da
justiça contratual e se compatibiliza com o espírito do Código de Defesa do
Consumidor. Além
disso, tal teoria teve o mérito de estabelecer parâmetros mais objetivos e
seguros para a revisão dos contratos, o que representa uma significativa
vantagem sobre as demais teorias revisionistas analisadas ao longo deste
trabalho. Como
visto, com a Teoria da Pressuposição e a Teoria da Base Subjetiva de Paul
Oertmann preocupou-se demasiadamente com a vontade e com a representação
mental das partes, que sequer chegou a ser manifestada, ou, que deveria, em
tese, ser refutada. A adoção de alguma dessas duas teorias deixaria, na
prática, a solução da revisão ou não dos contratos ao arbítrio de apenas uma
das partes, o que causaria enormes transtornos aos negócios, pois não haveria
certeza quanto ao cumprimento dos contratos. Observe-se,
a propósito, que a parte final do art. 6º do CDC não exige a
extraordinariedade ou a imprevisibilidade para a revisão, mas tão-somente que
a alteração superveniente das circunstâncias torne as prestações
excessivamente onerosas. Criar exigências adicionais, como a
extraordinariedade do evento e a imprevisibilidade, condições que ultrapassam
aquelas previstas em lei, equivaleria a privar o consumidor do direito ao
restabelecimento da equivalência das prestações. A
Teoria da Base do Negócio, de Karl Larenz – que, como visto, não exige nem a
extraordinariedade nem a imprevisibilidade do evento superveniente –
amolda-se perfeitamente, também por essa razão, à disciplina legal do CDC. Resta
responder duas indagações: quando estará autorizada a revisão das prestações?
E em que a Teoria da Base do Negócio Jurídico, de Karl Larenz, pode
contribuir para a aplicação do art. 6º, V, segunda parte, do CDC? Responder
à primeira dessas perguntas é, em última análise, dizer quais parâmetros
devem guiar o intérprete no trabalho de ponderação entre dois valores
igualmente merecedores de tutela e que, com certa frequência, entram em
colisão: de um lado, a justiça contratual, fundada na preservação do
sinalagma e, de outro, a segurança jurídica. No
âmbito do Código de Defesa do Consumidor, a esses dois valores colidentes
acrescem-se outros, que passam a integrar o procedimento de ponderação e
levam a balança a se inclinar para o lado da preservação da justiça
contratual, sem que se despreze, contudo, a segurança jurídica. Afinal, em um
contexto caracterizado pela permeabilidade aos valores, pela ênfase na defesa
do consumidor e marcado por uma busca incessante pelo equilíbrio entre os
sujeitos da relação obrigacional, a segurança jurídica – simbolizada pelo
dogma do pacta sunt servanda – acaba por ceder muito espaço para a
justiça contratual, fundada na preservação do sinalagma. Não
foi por outra razão que o legislador optou por enunciar o direito do
consumidor à revisão das prestações, em razão de fatos supervenientes que as
tornem excessivamente onerosas, sem exigir que a alteração das circunstâncias
ocorra em razão de fatos extraordinários e imprevisíveis e sem exigir,
igualmente, que à onerosidade excessiva advinda para o consumidor
corresponda, em igual medida, uma excessiva vantagem para o fornecedor. Em suma, o próprio legislador deu início ao
labor de sopesamento dos valores, inclinando-se, notavelmente, para a busca
da preservação da equivalência das prestações. Nesse
contexto, torna-se fácil perceber que a resposta à primeira indagação
proposta acima se encontra na própria literalidade do dispositivo: a revisão
das prestações deve ocorrer quando, em razão da alteração superveniente das
circunstâncias, elas se tornarem excessivamente onerosas para o
consumidor. A
onerosidade, por si só, não conduz, como se percebe, à revisão das
prestações. Até certo limite, portanto, opta-se pela preservação da segurança
jurídica. Quando a onerosidade se torna excessiva, ou seja, ultrapassa a
fronteira do razoável, a restauração do sinalagma se impõe, e a segurança
jurídica cede espaço para a justiça contratual. A
chave para a compreensão do dispositivo está, por conseguinte, na expressão excessivamente
onerosas. E é aqui que a Teoria da Base do Negócio Jurídico, de Karl
Larenz, passa a contribuir para a aplicação do art. 6º, V, segunda parte, do
CDC, respondendo à segunda indagação que foi proposta. Essa teoria permite,
exatamente, compreender quando ocorrerá essa onerosidade excessiva para o
consumidor. A
onerosidade excessiva é um conceito relacional. Evidentemente, não há como
compreender que algo seja excessivamente oneroso sem que se tenha um
parâmetro para se proceder à comparação. A onerosidade excessiva não existe
em si mesma. Um objeto somente pode ser considerado excessivamente oneroso em
relação a outro. A
Teoria da Base do Negócio Jurídico irá fornecer o parâmetro para a apreciação
dessa excessiva onerosidade. Em outras palavras: ela indicará ao intérprete
as circunstâncias iniciais a serem consideradas como o parâmetro para a
análise das alterações supervenientes. Ela permitirá, portanto, a
identificação de um ponto de partida que, em cotejo com as circunstâncias
atuais, permitirá dizer se a onerosidade é ou não excessiva. Mas,
afinal, qual deve ser esse parâmetro? A essa indagação responderia Larenz
(2002) que se deve partir da análise das circunstâncias ou estado geral de
coisas cuja subsistência é objetivamente necessária para que o contrato
exista como regulação dotada de sentido. O parâmetro é, portanto, a base do
negócio jurídico, ou seja, as circunstâncias em que as partes fundaram a
decisão de contratar. A
justiça contratual exige que a base relevante considerada pelas partes seja
mantida. Se ocorrer a quebra da equivalência subjetiva ou se a finalidade
objetiva for inalcançável, ocasionando excessiva onerosidade para o
consumidor, o contrato deve ser revisto. É
relevante observar que o STJ deixou assentado o entendimento – que, se
entende, está em plena consonância com o CDC – de que a previsibilidade do
fato superveniente não obsta a revisão do contrato, o que evidencia a
rejeição da Teoria da Imprevisão como parâmetro para a aplicação do art. 6º,
V, segunda parte, do Código de Defesa do Consumidor. Em
decisão ainda mais recente, a referida Corte, além de rejeitar a tese de que
seria necessária a imprevisibilidade do evento, foi ainda mais além,
referindo-se expressamente à Teoria da Base do Negócio Jurídico, de Karl
Larenz. EMBARGOS
DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO Nº 679.815 – SP (2008/0270491-0). RELATOR: MINISTRO
HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP).
EMBARGANTE: TRANSPORTADORA WEISS LTDA. ADVOGADO: DIRCEU ROSA ABIB JUNIOR.
EMBARGADO: HSBC BAMERINDUS LEASING ARRENDAMENTO MERCANTIL S/A. ADVOGADO:
VALTER PIVA DE CARVALHO E OUTRO(S) DECISÃO [...] De
plano, verifica-se que a sentença originária julgou parcialmente procedentes
a ação cautelar e a ação principal de revisão de cláusula contratual
ajuizadas por Transportadora Weiss Ltda., para tornar definitiva a liminar e
determinar a substituição da variação cambial como critério de reajuste das
parcelas do leasing pela aplicação da variação do INPC. Na
instância a quo foi dado provimento à apelação da parte contrária, em
julgado majoritário que recebeu a seguinte ementa: "ARRENDAMENTO
MERCANTIL DE BENS MÓVEIS - CLÁUSULA DE REAJUSTE DE ACORDO COM A VARIAÇÃO DO
DÓLAR - TEORIA DA IMPREVISÃO - INAPLICABILIDADE - ARRENDANTE QUE CAPTOU
RECURSOS NO EXTERIOR - SÚBITA ELEVAÇÃO DA MOEDA QUE ATINGIU A TODOS - AÇÃO
JULGADA IMPROCEDENTE - SUCUMBÊNCIA - INVERSÃO - CABIMENTO. Apelação provida." O
voto divergente, naquela instância, foi assim fundamentado, no particular: "[...]
Em síntese, para o caso presente, basta a onerosidade excessiva, que é
evidente, e, no que concerne às prestações desproporcionais e exageradas,
atente-se para o que consta da inicial. Ademais, e no tocante à alegação de
que a variação cambial afeta a ambos os contratantes, e isso porque os
recursos financeiros para a operação foram captados no exterior, é preciso
não esquecer que, na aplicação da lei, o julgador deve estar atento aos fins
sociais a que ela se destina (cf. artigo 5o da Lei de Introdução ao Código
Civil). Esse princípio, na órbita consumerista, significa a ponderação de
forças entre o Fornecedor e o Consumidor, isto é, a avaliação concreta da
capacidade de cada uma das partes suportar ônus decorrentes das relações
entre elas estabelecidas, valendo ressaltar que as instituições financeiras,
como é sabido, cercam-se de cautelas que impedem ou minimizam prejuízos
decorrentes das flutuações verificadas. Em
suma, não se pode equiparar a situação do consumidor individual, homem médio,
com a de entidades com recursos muito superiores, e não só financeiros.[...]. No
caso do leasing em dólar, a resposta jurisprudencial foi exemplar quanto à
proteção do consumidor, mas dispare quanto aos fundamentos. Muitos Tribunais
optaram por permitir a rescisão contratual com base nas teorias da
imprevisão, visualizando-as no CDC, outros utilizaram-se do art. 6º, V,
modificando a cláusula de reajuste do preço, ora substituindo-a por outros
índices, ora reequilibrando a relação e o sinalagma funcional deste tipo de
contrato, intimamente ligado aos juros do financiamento. O
importante desta segunda linha de opiniões, a qual me filio, é ter
concretizado a cláusula geral do art. 6º, V, como introduzindo no ordenamento
jurídico brasileiro a teoria da quebra da base objetiva do negócio,
preconizada por Larenz. Neste sentido, não há necessidade de que o fato
superveniente do art. 6º, V, seja "imprevisível", "bastando a
demonstração objetiva da excessiva onerosidade advinda para o
consumidor" (REsp 268.661-RJ, Rei. Min. Nancy Andrighi, j . 16.08.2001). A
riqueza desta linha de decisão está também em ter destacado que os riscos
profissionais típicos inerentes à organização da cadeia de fornecimento deste
tipo de negócio (por exemplo: decisão da fonte – no reduzido mercado nacional
ou no exterior - de proveniência dos recursos usados para o financiamento do
leasing) devem ser suportados pelos fornecedores e não podem ser transferidos
para os consumidores (mesmo se lei ordinária assim autoriza), sendo abusiva a
cláusula contratual que assim autorize. Estas decisões ainda destacam a importância
do direito de informação dos consumidores e do dever de aconselhamento dos
fornecedores - especialistas em leasing e em captação profissional de
recursos para o negócio financeiro - diante dos consumidores leigos: "E
ilegal a transferência de risco da atividade financeira, no mercado de
capitais, próprio das instituições de crédito, ao consumidor, ainda mais que
não observado o seu direito de informação (art. 6o, III, e 10, caput, 31 e 52
do CDC)" (REsp 268.661-RJ. Rei. Min. Nancy Andrighi, j . 16.08.2001). Por
fim, merece destaque o fato desta linha jurisprudencial ter bem evidenciado
que a técnica do CDC, de assegurar direitos materiais ao consumidor, de
modificação das cláusulas excessivamente onerosas, por exemplo, e de impor
deveres de informação e de abstenção do abuso ao fornecedores, per se,
influencia o direito processual de defesa do consumidor, ao impor ex vi lege
determinadas provas ao fornecedor: "A exigência de que a arrendadora
prove a origem do dinheiro utilizado no contrato, para efeito de vinculação
das contraprestações à variação do dólar americano, não representa inversão
quanto ao ônus da prova" (STJ, AGREsp 275.391/MG, 3a Turma, Rei. Min.
Carlos Alberto Menezes Direito, j. 19.06.2001)" (cf. "Contratos no
Código de Defesa do Consumidor", 4ª edição, São Paulo, Editora Revista
dos Tribunais, 2002, pp. 472/483). [...] Assim,
e como se tem reiteradamente julgado, no reajuste das prestações do contrato,
que é de leasing e atrelado à variação cambial, o ônus decorrente da brusca
variação da taxa cambial, ocorrido em razão da mudança da política
governamental a partir de janeiro de 1999, deve ser repartido igualmente
entre as partes. Em
consequência da procedência parcial, a sucumbência é recíproca, repartindo-se
entre as partes as custas e despesas processuais, ficando cada qual
responsável pelo pagamento dos honorários advocatícios dos respectivos
patronos. Isto
posto e, considerando tudo o quanto mais consta dos autos, dou provimento parcial à
apelação." (grifou-se). Verifica-se
do exposto que: a sentença de primeiro grau deu provimento ao pedido do
autor, para afastar a variação cambial; a decisão majoritária reconheceu ser
ela cabível in totum e o voto vencido acolheu parcialmente o apelo, mantendo
a variação cambial, contudo minimizando seus efeitos, pela partilha dos ônus
dela entre as partes. [...] EAg
679815, Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro, 04/08/2009, Marques (2006,
p. 920) também sustenta que a alteração superveniente, para ensejar a revisão
dos contratos de consumo, não exige a ocorrência de eventos extraordinários e
imprevisíveis, o que afasta, portanto, a Teoria da Imprevisão. Nesse
sentido continuo convencida de que a expressão onerosidade excessiva do art. 6º,
V, do CDC não encontra sua fonte no Código Civil italiano de 1942, que, em
seu art. 1.647, exige a ocorrência de evento extraordinário e imprevisível,
nem no novo Código Civil brasileiro de 2002, art. 478, que, além da
onerosidade excessiva, exige a “extrema vantagem para a outra”, mas sim nas
teorias mais modernas e objetivas, especialmente a teoria da base do negócio
jurídico, conhecidas pela doutrina, mas até então não positivadas no
ordenamento pátrio. Os
argumentos decisivos que me moveram a evoluir em relação à opinião defendida
na primeira edição desta obra é que mencionar simplesmente que a teoria da
imprevisão teria sido aceita pelo CDC pode ser uma interpretação do art. 6º,
inciso V, prejudicial ao próprio consumidor, pois dele pode ser exigida a
referida imprevisão e extraordinariedade do ocorrido, fatos não mencionados
no referido artigo. As mudanças – eqüitativas – da interpretação do STJ no
caso do leasing em dólar parecem ter como fundamento, em minha opinião, mais
uma idéia de tratamento justo pela boa-fé, a evitar a ruína de ambos os
contraentes, do que seguir uma nova teoria sobre a imprevisão, ainda mais se
pensarmos que tais decisões não diferenciavam normalmente quanto à
profissionalidade do “consumidor” e seu diferente porte econômico. De outro
lado, como gênero, as teorias sobre a imprevisão sempre visaram
prioritariamente a liberação do contratante supervenientemente debilitado,
sua desobrigação, retirando assim do consumidor – ou, pelo menos, diminuindo
em intensidade – seu novo direito de manter o vínculo e ver recriado o
equilíbrio contratual original por atuação modificadora do juiz. Essa
possibilidade de revisão contratual por fatores objetivos e supervenientes
parece-me efetivamente a maior contribuição do art. 6º, V, do CDC e sua
exceção ao sistema de nulidades absolutas”. A
doutrina majoritária tem seguido o entendimento do STJ e de Marques (2006),
no sentido de que o Código de Defesa do Consumidor recepcionou a Teoria da
Base do Negócio Jurídico de Karl Larenz. A
teoria desenvolvida por Karl Larenz – que dispensa a extraordinariedade e a
imprevisibilidade do acontecimento superveniente – mostra-se, de fato, a mais
adequada para a interpretação e a aplicação do art. 6º, V, segunda parte do
CDC. E as razões para isso são várias, conforme se procurou demonstrar ao
longo da presente petição. Assim
se manifestou Costa (2007, p. 72). “O Código Civil de 2002 não adotou a
teoria da base objetiva do negócio em nenhum de seus artigos, tal como fez o
Código de Defesa do Consumidor no art. 6º, V ao autorizar a revisão do
contrato como direito básico do consumidor em virtude de prestações que em
razão de fatos supervenientes se tornem excessivamente onerosas”. Transcreve-se,
também, o posicionamento de Garcia (2009, p. 60). “No que tange à segunda
parte do inciso V, que contempla a revisão das cláusulas contratuais em razão
de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas, ocorrendo uma
quebra do sinalagma funcional do contrato, no qual o desequilíbrio surge no
decorrer da execução contratual, cabe ressaltar que muitos doutrinadores e
juízes entendem que o dispositivo se refere à teoria da imprevisão. No
entanto, não concordamos com tal entendimento, filiando à corrente majoritária,
que entende tratar-se da teoria da base objetiva do negócio jurídico”. Ainda,
segundo Martins-Costa (2008, p. 256), na obra Comentários ao Novo Código
Civil, fora de dúvida que, nas relações de consumo, prevalece a Teoria da
Base Objetiva, acolhida no CDC, mas mesmo nas relações de direito privado
comum a exigência da imprevisibilidade deverá, a meu juízo, ser relativizada,
para considerar-se a expressão em seu significado normativo, de
correspondência à legítima expectativa das partes no momento da conclusão do
ajuste, tendo-se em conta, como fato primordial, o objetivo desequilíbrio não
imputável à parte prejudicada. Diante de tais argumentos, pede-se que se
aplica a teoria da base objetiva do negócio jurídico para revisar a taxa de
juros mensal de 2,18% ao mês para a taxa média de juros dos bancos na época
de 03/12/2014 para 1,6945%, ou subsidiariamente que aplique-se a taxa de
juros mensal de 1,94% ao mês ao presente contrato de financiamento de
veículos. 2.4.)
Do Pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada em Caráter Liminar
(Pedido de Consignação em Pagamento ou Depósito Judicial das Parcelas
Vencidas e Vincendas). As informações da taxa de juros média do
mercado para financiamento de veículo estão disponíveis na página e segue em
anexo a essa petição inicial: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores. Considerando a primeira hipótese, ou seja, que
seja aplicado a taxa média de juros do mercado conforme o site do Banco
Central do Brasil de https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores
, que define a taxa média anual de juros do
mercado é No
caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e subsidiariamente de 497,6%
no caso de juros rotativos do cartão de crédito. O autor não reclama o método de cálculo de
juros compostos a ser aplicado ao contrato de financiamento, mas sim da
abusividade da taxa de juros uma vez que se aplicando a taxa média do
mercado. Inicialmente, insta salientar que inexiste
incerteza fática ou jurídica a ser elidida, uma vez que se trata de questão
de meramente de direito e pelo fato das provas documentais já estarem nos
autos, motivos pelo qual o contraditório pode ser diferido. Para o deferimento da tutela antecipada,
inclusive de caráter liminar, deve-se preencher os requisitos do art. 300, do
CPC que diz que deve preencher a fumaça do bom direito e o perigo da demora. A fumaça do bom direito está devidamente
preenchido, na medida em que a conduta da ré mostra-se nas plenamente
evidenciada na presença da ilegal e abusiva cobrança feita pela ré por estar
cobrando um juro extorsivo de 2,18% ao mês ou de 30,73% ao ano. Prova essa de
natureza documental que está instruindo essa petição inicial. A verossimilhança da alegação está cabalmente
demonstrada por todos os fatos aqui demonstrados e pela flagrante violação as
regras e princípios de proteção ao consumidor. O dano irreparável ou de difícil reparação
refere-se ao fato das inúmeras consequências danosas em que inevitavelmente
incorrerá com o diferimento da tutela pretendida em virtude do trâmite
processual. Assim, independente das condutas do réu virem
se alongando por tempo considerável, é de se ponderar que mesmo em tais casos
faz-se perfeitamente possível o uso da tutela antecipada. Ademais, dificilmente repara-se o sentimento
de impotência e frustação diante da cobrança impositiva do réu. Inequivocamente, está configurada a real
necessidade da antecipação da tutela, estendo preenchidos os requisitos
legais. Caso seja necessário o autor requer que seja
deferido a tutela antecipada para que consigne em pagamento ou deposite
judicialmente os valores incontroversos supramencionados vencidos e
vincendos. Pede-se ainda que em se de tutela antecipada
em caráter liminar seja expedido um mandado de intimação em face da ré
proibindo a ré de colocar o nome do autor em cadastro restritivo de
inadimplentes do SPC e SERASA bem como impedindo a ré de ajuizar busca e
apreensão do veículo, através de expedição de mandado de manutenção de posse,
sob pena de multa diária de R$10.000,00. 2.5.)
Do Pedido de Antecipação de Tutela Provisória de Urgência em Caráter Liminar
para a Expedição de Mandado de Manutenção de Posse em face da Ré. Pede-se ainda em tutela antecipada em caráter
liminar para que seja expedido um mandado de manutenção de posse do carro do
autor em face da ré impedindo que ela ajuíze uma ação de busca e apreensão em
face do autor até o trânsito em julgado da presente demanda. A medida é necessária tendo em vista evitar o
ajuizamento de eventual ação de busca e apreensão pela ré. 2.6.)
Da Eventual Repetição de Indébito da Revisional de Juros. Caso não seja deferida a
tutela antecipada, pede-se ao final desse processo a repetição de indébito,
se pagas pelo autor ou da diferença em que o autor pagou e o que ele deveria
realmente pagar com a revisão do contrato de financiamento de veículo, na
fase de liquidação de sentença. 2.7.) Do
Prequestionamento. Pede-se que para fins de
prequestionamento sejam analisados os artigos legais: Art. 6º, 51, §2º, do
CDC e artigos 14, e 20, 22, parágrafo único, 23 e 25, caput e §1º, do CDC,
artigos 2º da Lei 9.784/99 e art. 5º, XXXV, CF dos princípios da
razoabilidade e proporcionalidade. 3)
Do Pedido: Ante o exposto, pede-se: - Que seja deferida a tutela de urgência
antecipada em caráter liminar, revisando o contrato de financiamento de
veículo no caso concreto para que seja aplicada a taxa de juros revisada, considerando a primeira
hipótese, ou seja, que seja aplicado a taxa média de juros do mercado
conforme o site do Banco Central Brasil:https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores, que define a taxa média anual de juros do
mercado é de No
caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e subsidiariamente de 497,6%
no caso de juros rotativos do cartão de crédito, impondo a ré a aceitar como
quitada, proibindo o réu de colocar o nome do autor em cadastro restritivo de
inadimplentes do SPC e SERASA, através de expedição de mandado de manutenção
de posse, sob pena de multa diária de R$10.000,00; - Que na tutela de urgência de antecipação de
tutela, em caráter liminar, seja também deferida da seguinte forma: - Quanto a parcela vencida o autor pede que
seja deferida a tutela antecipada no sentido de consignação em pagamento ou
pela forma de depositar judicialmente o valor incontroverso, desde que
revisada nas formas supramencionadas. - Quanto as parcelar a vencer, ou seja, de 26/10/2017
em diante, o autor pede a tutela provisória de urgência antecipada para que
Vossa Excelência, pede-se que seja deferida a tutela antecipada para que o
autor possa fazer a consignação em pagamento ou o depósito judicial da
parcela a vencer em meses após o deferimento da tutela antecipada da
consignação em pagamento ou depósito judicial e as parcelas a vencerem nos
meses subsequentes e autorizar o pagamento das parcelas vincendas a contar do
deferimento da tutela antecipada de consignação em pagamento ou depósito
judicial a vencer no dia 15 de cada mês subsequente ao primeiro mês da
concessão da tutela antecipada, uma vez que estará quitada todas parcelas
vencidas. - Que haja a citação da ré (banco ou
financeira), por carta de aviso-recebimento, nos termos do art. 222, do CPC,
no endereço mencionado no preâmbulo dessa petição inicial, para, se quiserem,
contestarem a presentem ação ou levantar o depósito a ser efetuado no
decorrer da ação, no prazo legal, sob pena de arcarem com os efeitos
decorrentes da revelia, nos termos do art. 319, do CPC; - No mérito, que seja julgado inteiramente
procedente o pedido, com a confirmação dos efeitos da tutela provisória de
urgência antecipada, para condenar a ré a: - Confirmar a tutela de urgência antecipada
no sentido de anular as cláusulas contratuais abusivas e revisar o contrato
de financiamento de veículo no caso concreto para que seja aplicada a taxa de
juros revisada de No caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e
subsidiariamente de 497,6% no caso de juros rotativos do cartão de crédito que define a taxa média anual
de juros do mercado é de No caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e
subsidiariamente de 497,6% no caso de juros rotativos do cartão de crédito,
impondo a ré a aceitar como quitada, proibindo o réu de colocar o nome do
autor em cadastro restritivo de inadimplentes do SPC e SERASA, através de
expedição de mandado de manutenção de posse, sob pena de multa diária de R$10.000,00; - Que na antecipação de tutela, em caráter
liminar, seja também deferida da seguinte forma: - Quanto a parcela vencida o autor pede que
seja deferida a tutela antecipada no sentido de consignação em pagamento ou
pela forma de depositar judicialmente o valor incontroverso, desde que
revisada nas formas supramencionadas. - Quanto as parcelar a vencer, ou seja, de 26/10/2017
em diante, o autor pede a tutela provisória de urgência antecipada para que
Vossa Excelência, pede-se que seja deferida a tutela antecipada para que o
autor possa fazer a consignação em pagamento ou o depósito judicial da
parcela a vencer em cinco meses após o deferimento da tutela antecipada da
consignação em pagamento ou depósito judicial e as parcelas a vencerem nos
meses subsequentes e autorizar o pagamento das parcelas vincendas a contar do
deferimento da tutela antecipada de consignação em pagamento ou depósito
judicial a vencer no dia 15 de cada mês subsequente ao primeiro mês da
concessão da tutela antecipada, uma vez que estará quitada todas parcelas
vencidas. - Que a dívida total revisada seja feita
através de um perito judicial. - Dessa forma, pede-se a concessão em tutela
antecipada para compelir a ré a não ajuizar ação de busca e apreensão do
carro em face do autor tendo em vista que adimpliu substancialmente o
contrato de financiamento do veículo citado, expedindo o respectivo mandado
de manutenção de posse em face da ré. - As informações da taxa de juros média do
mercado para financiamento de veículo estão disponíveis na página e segue em
anexo a essa petição inicial: - Considerando a primeira hipótese, ou seja, que
seja aplicado a taxa média de juros do mercado conforme o site do Banco
Central do Brasil de https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores, juros parcelados de que 161,92% ao ano e subsidiariamente
de 497,6% no caso de juros rotativos do cartão de crédito que define a taxa média anual
de juros do mercado é de No caso de juros parcelados de que 161,92% ao ano e
subsidiariamente de 497,6% no caso de juros rotativos do cartão de crédito,
impondo a ré a aceitar como quitada, proibindo o réu de colocar o nome do
autor em cadastro restritivo de inadimplentes do SPC e SERASA, através de
expedição de mandado de manutenção de posse, sob pena de multa diária de R$10.000,00; - O autor não reclama do método de cálculo de
juros compostos a ser aplicado ao contrato de financiamento, mas sim da
abusividade da taxa de juros uma vez que se aplicando a taxa média do mercado
é menor que o agora aplicado. - Caso não seja deferida a tutela antecipada,
pede-se ao final desse processo a repetição de indébito, se pagas pelo autor,
a ser apurado na fase de liquidação de sentença, ou da diferença em que o
autor pagou e o que ele deveria realmente pagar com a revisão do contrato de
financiamento de veículo. - Que caso seja deferida a tutela antecipada
de consignação em pagamento ou depósito judicial das parcelas vencidas e
vincendas, que a consignação ou depósito judicial do autor seja convertido em
renda a favor do réu, nos valores a serem fixados como justos por Vossa
Excelência, declarando a quitação do autor referente as parcelas vencidas e
vincendas da obrigação contratual de financiamento de veículo. - Que seja deferido a inversão do ônus da
prova nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, valendo ressaltar que o autor como
consumidor é vulnerável e hipossuficiente nessa relação de consumo. - Pede-se que para fins de prequestionamento
sejam analisados os artigos legais: Art. 6º, 51, §2º, do CDC e artigos 14, e
20, 22, parágrafo único, 23 e 25, caput e §1º, do CDC, artigos 2º da Lei
9.784/99 e art. 5º, XXXV, CF dos princípios da razoabilidade e
proporcionalidade. - A condenação da ré Credicard aos honorários
sucumbenciais, inclusive constantes das custas e despesas processuais. - Requer-se pela produção de prova
documental, e por último caso seja necessário o depoimento pessoal do autor,
prova testemunhal, exibição de documento e pericial. - Requer a realização de audiência de
conciliação nos termos do CPC. Dá-se o valor da causa de R$(). Nesses termos, Pede e espera deferimento. Local e data. _____________________________________ Nome do Advogado OAB e número da OAB |
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